TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quarta-feira, 14 de julho de 2010


“Pobre não é um
Pobre é mais de cem
Muito mais de mil
Mais que um milhão
E vejam só...
E só de vez em quando
Pobre é feliz”
(Cicatrizes, Zé Kéti)

ZÉ KÉTI

Por Zé Nilton

Em dezembro de 1964 o parafuso da ditadura militar implantada no Brasil em 31 de março daquele ano ainda não havia iniciado o aperto ao madeiral das artes e dos artistas no país.

Estamos no momento do grande movimento no teatro brasileiro com repercussão significativa para a Música Popular Brasileira. Dois renomados compositores compunham o elenco do Show Opinião – João do Vale e Zé Kéti. Duas trajetórias de vida com origens de classe e de cor parecidas. Igualmente donos de uma musicalidade a serviço da transformação do homem e do mundo.

O inspirado compositor e poeta José Flores de Jesus – na carteira de identidade do Brasil de baixo - confirmam a tese do eminente crítico Tinhorão. Os compositores cariocas são oriundos das classes subalternas da sociedade, sobrevivendo de pequenos ofícios ou de empregos de baixo status no funcionalismo público. Zé Kéti chegou a largar a vida de artista para trabalhar como soldado de Polícia no Rio nos começos da década de 1940. Assim como Lupicínio Rodrigues e tantos outros, a corporação não segurou a inquietude rolando na cabeça do soldado Flores.

Cantou o mundo em que viveu e por via de conseqüência produziu uma vasta obra de inegável valor para a identidade de nossa musicalidade. O morro, a periferia, os botequins, os lugares dos pobres são espaços marcantes na poética denunciadora deste excelente compositor brasileiro.

Naqueles idos dos anos de chumbo e até recentemente a nossa classe média acalentava o sonho (o discreto charme da burguesia?) de transformação social de realidade teimando buscar nas raízes culturais brasileiras seu suporte teórico para a ação revolucionária. Foi nesta que o Teatro de Arena – lá estão Augusto Boal, Oduvaldo Viana, Armando Costa, Paulo Pontes, Tereza Goulart, CPC da Une – elevou o experiente compositor Zé Kéti à condição de artista cênico.

A peça Opinião foi baseada na sua música. A opinião de um caboclo que reinventa o cotidiano “apesar de você” e dos dissabores da vida de pobreza:

“Daqui do morro eu não saio não
Se não tem água eu furo um poço
Se não tem carne eu compro um osso
E ponho na sopa
E deixa andar”...(
Opinião).

Igualmente, suas músicas são transformadas em trilhas sonoras nas películas de Nelson Ferreira dos Santos, Roberto Santos, Leon Hirszman, Cacá Diegues...

Nossa homenagem ao renovador da Música Popular Brasileira, no programa Compositores do Brasil desta quinta.

De conversa em conversa, apresentaremos um pouco de sua história enquanto ouviremos:

ABERTURA, com Zé Kéti, Nara leão, João do Vale etc.
CICATRIZ, Zé Kéti e Hermínio Belo de Carvalho com Zé
Kéti
PEÇO LICENÇA, de Zé Kéti com Zé Kéti
A VOZ DO MORRO, de Zé Kéti com Os Demônios da Garoa
O FAVELADO, de Zé Kéti com João do Vale, Zé Kéti e Nara Leão
MALVADEZA DURÃO, de Zé Kéti com Elizeth Cardoso
PRAÇA 11, BERÇO DO SAMBA, de Zé Kéti com Zé Kéti
VOCÊ NÃO FOI LEGAL, de Zé Kéti e Celso Castro, com Wilson Miranda
DIZ QUE FUI POR AI, de Zé Kéti Hortêncio Rocha, com Zé Kéti
OPINIÃO, de Zé Kéti com Zé Kéti
NEGA DINA, de Zé Kéti com Zé Renato & Alcione
MASCARADA, de Zé Kéti e Elton Medeiros, com Zé Kéti
MÁSCARA NEGRA, de Zé Kéti com Zé Kéti


Quem ouvir verá!


Informações:
Programa Compositores do Brasil
Sempre às quintas-feiras, de 14 horas as 15 h.
Rádio Educadora do Cariri – 1020 kz
Pesquisa,produção e apresentação de Zé Nilton
Retransmitido pela www:cratinho.blogspot.com

2 comentários:

José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

Zé Nilton cada vez mais analítico em suas resenhas dos compositores que apresenta no seu programa de rádio. Esta resenha do Zé Keti, localizou muito bem aquele momento que marcou a história do compositor no Teatro Opinião. Como igualmente o Opinião fez com João do Vale, só que este tinha um público popular na esfera nordestina. O nosso querido samba, mesmo sendo popular, se confundiu com a classe média de modo tal que aquela frase do Vinícius de Moraes no samba da benção é bem reveladora: embora seja branco na poesia é negro demais no coração. Aliás esta questão poucos abordam quando tratam da polêmica entre Noel e Wilson Baptista. Uma vez numa conversa com Paulinho da Viola, ele destacava Wilson em relação a Noel e foi ali que compreendi a tensão ainda reinante entre as classes populares e a classe média carioca. A guerra dos morros continua sendo o mesmo embate entre o asfalto e o morro das velhas canções, como aquela do Herivelto Martins falando que o malandro não ia no asfalto e a polícia não subia no morro. Mas sempre subiu, era apenas licença poética do compositor para expressar a tensão.

Zé NIlton disse...

Excelente, Zé do Vale. Você me chamou a atenção para a polêmica entre Noel e Wilson Batista. Está na agenda, agora com outra perspectiva. Obrigado, amigo.