CONCLUSÃO
A morte é grande.
Nós, sua presa,
vamos sem receio.
Quando rimos, indo, em meio à correnteza,
chora de surpresa
em nosso meio.
Do Livro de Imagens, 1902
A PANTERA
(No Jardin des Plantes, Paris.)
De tanto olhar as grades seu olhar
esmoreceu e nada mais aferra.
Como se houvesse só grades na terra:
grades, apenas grades para olhar.
A onda andante e flexível do seu vulto
em círculos concêntricos decresce,
dança de força em torno a um ponto oculto
no qual um grande impulso se arrefece.
De vez em quando o fecho da pupila
se abre em silêncio. Uma imagem, então,
na tensa paz dos músculo se instila
para morrer no coração.
A MORTE DO POETA
Jazia. A sua face, antes intensa,
pálida negação no leito frio,
desde que o mundo, e tudo o que é presença,
dos seus sentidos já vazios,
se recolheu à Era da Indiferença.
Ninguém jamais podia ter suposto
que ele e tudo estivessem conjugados
e que tudo, essas sombras, esses prados,
essa água mesma eram seu rosto.
Sim, seu rosto era tudo o que quisesse
e que ainda agora o cerca e o procura;
a máscara da vida que perece
é mole e aberta como a carnadura
de um fruto que no ar, lento, apodrece
O POETA
Já te despedes de mim, Hora.
Teu golpe de asa é o meu açoite.
Só: que fazer da boca, agora?
Que fazer do dia, da noite?
Sem paz, sem amor, sem teto,
caminho pela vida afora.
Tudo aquilo em que ponho afeto
fica mais rico e me devora.
A QUE VAI FICAR CEGA
Ela sentou-se como as outras para o chá.
Me pareceu então que segurava a taça
de um jeito diferente das que estavam lá.
Pouco depois sorriu. Um sorriso sem graça.
Quando se levantaram, enfim, conversando,
e juntas percorreram numerosas salas,
devagar, ao acaso (entre risos e falas)
de súbito, eu a vi. Ela seguia o bando
das outras, concentrada, como que alguém que deve
cantar diante de um grande público em instantes.
Sobre seus olhos claros e rejubilantes,
como a incidir num lago, a luz caía, leve.
Precisava de espaço. Andava lentamente.
Andava quase como se não fosse andar.
Como se houvesse algum degrau à sua frente.
Como se, de repente, ela fosse voar.
Dos Novos Poemas, 1907.
Um comentário:
Poemas do livro Rilke: Poesia-Coisa. Editora Imago, 1994. Os poemas, segundo AC, revelam uma postura diferente do Rilke inspirado, metafísico. Esse é um Rilke mais voltado para a concretude, escultor de poemas, influência de Rodin, de quem fora secretário. Rilke dá um salto "dos estados da alma, sentimentos e impressões para "o mundo das coisas".
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