TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

domingo, 26 de setembro de 2010

Peregrino

Ultimamente acordo
antes das galinhas
e toco um blues
antes que os galos
façam gargarejos
com vinagre,
gengibre
e sal.

O sol me espera esfacelado:
pedaços nos galhos
das árvores;

outros pedaços
nas calçadas,
batentes,
pneus,
portões.

mas ele
(inteiro e altivo)

não muda o ar esnobe
rindo da minha cara
engomada às avessas.

Sei que o dia será infernal:
dragões,
leões,
serpentes

no fundo
da mesma cova

esperando apenas
um vacilo do trovador
ou do escravo romano.

Nem um nem outro.
Nem ai nem ui.
Nem salvação
nem morte.

Pego minha pazinha
(dessas de praia)

e saio pelos canteiros
das praças
(perdido)

a plantar e destruir
jardins alheios.

Somente assim
satisfaço-me

admirando as lágrimas
dos velhinhos

que esquecem
de lançar farelos
aos pombos

e relembram
os amores
de outrora.

Sem ver
nem pra que,

cada um se levanta do banco
amassa o saco de ração
chuta as perninhas
dos pombos

e forma-se (cada qual
com sua pazinha
de praia)

uma pequena multidão
atrás do poeta.

Todos perdidos
(alguns felizes)

plantando
e destruindo
jardins alheios.

2 comentários:

lupin disse...

lindo poema, domingos.
grande abraço.

Marta F. disse...

Querido, que bonito isso, quantas imagens, viagem gostosa de ler...