No dia 01 de agosto do corrente ano,
a Secretária Municipal de Saúde da cidade de Crato/CE, Sra. SAYONARA MOURA DE
OLIVEIRA CIDADE, expediu o Memorando Circular nº 010800/2012, proibindo,
terminantemente, todos os servidores daquela Secretaria Municipal, assim como
todos os demais vinculados às Unidades de Saúde e aos órgãos subordinados a
suso mencionada Secretaria, de “concederem entrevistas aos meios de comunicação
sem autorização prévia deste gabinete”.
De acordo com a vedação prevista no
art. 73, parágrafo VI, alínea “c” da Lei 9.504/97, é proibido ao agente público
fazer pronunciamento em cadeia de rádio e televisão, fora do horário eleitoral
gratuito, desde que o conteúdo das declarações tenha cunho de publicidade
institucional ou caracterize abuso do poder político, afetando a igualdade de
oportunidades entre candidatos no pleito eleitoral. Caso o pronunciamento tenha
outro objetivo, nada impede que o servidor conceda entrevista, sob pena de ser
mitigado o exercício regular de liberdade de expressão e pensamento.
Vale
salientar que a manifestação do pensamento deve ser plena, protegida toda e
qualquer expressão de pensamento não se compadecendo com a exigência de licença prévia ou outros mecanismos de
censura. Por esse motivo, torna-se incompatível com a ordem jurídica brasileira
a limitação da liberdade de crítica, configurada em manifestações desassociadas
de fins eleitoreiros.
Na
realidade da forma e conteúdo expressado pela Secretária Municipal de Saúde do
Crato através do assaz mencionado Memorando Circular, fica configurado uma
clara intenção de não
permitir a qualquer servidor público o pleno exercício do direito à democracia
e a livre manifestação do pensamento, destarte, fomentando uma nauseabunda
cultura do segredo.
Em matéria de direito fundamental, o
direito de opinar e de se expressar é básico quando se trata de liberdade
pessoal.
Disse Ruy Barbosa que “de todas as liberdades a do pensamento é a maior, a mais alta. Dela decorrem todas as outras.”
Disse Ruy Barbosa que “de todas as liberdades a do pensamento é a maior, a mais alta. Dela decorrem todas as outras.”
A livre manifestação do pensamento é
o pilar principal no qual se sustenta a democracia, já que esta se pauta no
debate livre à procura da melhor tomada de decisão para o bem comum da
sociedade. Não há democracia nem Estado Democrático de Direito sem a livre manifestação
do pensamento, motivo pelo qual o seu cerceamento leva ao autoritarismo e ao descontrole da atividade governamental.
A
liberdade de expressão é definida como direito natural decorrente da própria
natureza humana, sendo, portanto, um direito fundamental, intransferível e
inerente ao direito da personalidade e à dignidade da pessoa humana. É um
direito individual com repercussão nos direitos coletivos e difusos, visto que
o Estado Democrático de Direito depende de cidadãos informados, conscientes e politizados
aptos a tomar decisões para a melhoria da coletividade.
Nesse
sentido, o Ministro do Supremo Tribunal de Federal, Marco Aurélio, sintetiza
que a Liberdade de Expressão é um direito fundamental do cidadão, envolvendo o
pensamento, a exposição de fatos atuais ou históricos e a crítica.
A
Declaração de Direitos humanos e do Cidadão, de 1789, em seu artigo 11 dispõe
que a livre a manifestação do
pensamento e das opiniões é um dos direitos mais preciosos do homem.
Pontes
de Miranda pondera que liberdade psíquica é a base para toda e qualquer
liberdade, abrangendo tudo que serve para enunciar e dar sentido, incluindo a
liberdade de manifestar para com as demais pessoas ou enquanto ao homem consigo
mesmo.
Nesta
seara, no Estado Democrático, defende-se a livre manifestação do pensamento
vedando-se qualquer tipo de censura, impedindo que a liberdade de expressão
sofra algum tipo de limitação prévia concernentes à censura de natureza
política, ideológica ou artística.
Destarte,
atos como o praticado pela Secretária de Saúde do município do Crato,
cerceadores da liberdade de expressão, devem ser imediatamente expurgos da
sociedade, pois somente à Constituição cabe a regulação da liberdade de
expressão nos termos do artigo 220, o qual se transcreve com destaques:
“Art.
220. A manifestação do pensamento, a
criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo
não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.”
Com
efeito, a Constituição Federal estabelece que é livre a manifestação do
pensamento, a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura ou licença e, ainda, garante que a
manifestação do pensamento não sofrerá qualquer restrição. Destaca-se os
incisos IV e IX do artigo 5º e o artigo 220 os quais transcrevo:
“Art. 5º (...)
IV
- é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
IX
- é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura ou licença;
Art. 220.
A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob
qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado
o disposto nesta Constituição.
§
1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena
liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social,
observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.
§
2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e
artística.”
A
livre manifestação do pensamento, também, é tutelada pelos Tratados
Internacionais celebrados pelo governo brasileiro, os quais garantem a todos o
direito amplo de se comunicar, sobre quaisquer assuntos nos limites impostos
pela própria Constituição.
Nesta
seara, pode-se destacar o preâmbulo e o artigo XIX da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, celebrado e ratificado pelo Brasil, que dispõe:
“Considerando
que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos
bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de
liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da
necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum,”
(...)
"Todo o
homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a
liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e
transmitir informações e ideias por quaisquer meios, independentemente de
fronteiras". (grifo
nosso)
O
Brasil e outros países latino-americanos assinaram em 1996 e posteriormente em
29 de maio de 2006 a Declaração Internacional de Chapultepec no intuito
de consagrar a liberdade de expressão e de imprensa. A declaração estabelece
que:
“I-
Não há pessoas nem sociedades livres sem
liberdade de expressão e de imprensa. O
exercício dessa não é uma concessão das autoridades, é um direito inalienável
do povo.
II - Toda pessoa tem o direito de buscar e
receber informação, expressar opiniões e divulgá-las livremente. Ninguém pode restringir ou negar esses direitos.
Ainda
há o Pacto de São José da Costa Rica, a Declaração Americana Sobre Direitos
Humanos, aprovada pelo Congresso Nacional e ratificada pelo presidente da
República por meio do Decreto 678/92, de 6-11-92 que dispõe que em seu artigo
XIII:
"Toda
pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito
compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de
toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou
em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.
Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais
como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de
frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de
informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e
a circulação de idéias e opiniões".
Ademais, olvidou-se a nobre
Secretária de Saúde alhures citada que a Lei 12.527/2011, intitulada Lei da
Informação estabelece que “O servidor público que se recusar a fornecer informação requerida, a
fornecê-la intencionalmente de forma incorreta, incompleta ou imprecisa e impor
sigilo à informação para obter proveito pessoal ou de terceiro poderá ser responsabilizado
civil, penal ou administrativamente”. Registre-se que “A informação está dentro do Estado,
mas é da sociedade”.
Enfim,
a Constituição Federal e os Tratados Internacionais mencionados, garantem de
forma ampla, geral e irrestrita, a liberdade de expressão, proibindo qualquer
forma de registro, licença ou censura.
In casu,
a Secretária de Saúde do município de Crato/CE, ao expedir o retromencionado
Memorando Circular, determinando a proibição absoluta de entrevistas por parte dos servidores daquela
Secretaria, feriu gravemente o direito de expressão dos mesmos.
Milena de Caldas Machado Francisco Leopoldo Martins Filho
Advogada
- OAB/CE 19.517
Advogado - OAB/CE 10.129
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