Por incrível que pareça não tem muito mais de ano e meio que
pelo menos dois blogs do Crato publicaram o documento de um militar brasileiro,
em momento de reforma do serviço ativo, dizendo que O Golpe de 64 foi um ato heroico
dos golpistas para livrar o país da anarquia e do comunismo. Os dois blogs
bebiam na fonte da atual administração da cidade e publicavam o panfleto por
afinidade ideológica com a extrema direita brasileira e muito provavelmente
para provocar seus desafetos no campo político.
Ainda hoje anciões do Clube Militar
guardam um ódio visceral contra políticas progressistas e sustentam esta
energia a partir do borralho ideológico ainda dos anos de ditadura e dos
embates das Reformas de Base intensamente mobilizadas pelo povo brasileiro no
Governo João Goulart. As Reformas de Base reuniam um conjunto de medidas que
abrangiam a reforma bancária, fiscal, urbana, administrativa, agrária e
universitária. Incluía-se entre as medidas o direito de voto aos analfabetos e
às patentes subalternas das forças armadas. O carro chefe era a Reforma Agrária
onde se reuniu um dos focos de maior conflito na política interna do país. No
entanto foi no campo externo, especialmente em relação aos Estados Unidos da
América e outras nações capitalistas dominantes onde a luta foi maior: eram
medidas nacionalistas com maior intervenção do Estado na vida econômica,
controle do investimento estrangeiro especialmente sobre a remessa de lucros
para o exterior, além da nacionalização de empresas estratégicas como dos
setores de energia e comunicações.
O que liga personagens relativamente nascidos após o golpe
de 64 que pontuavam na política do Crato até agora a essa herança conservadora
e extremista? Penso que vestem uma capa envelhecida para esconderem o
verdadeiro sentido dos seus corpos ideológicos. Uma capa costurada com retalhos
da luta anticomunista, de segmentos reacionários da igreja católica, de uma noção
de família e patrimônio há muito ultrapassada pelo próprio desenvolvimento
capitalista. Mas o sentido de ser na vida é um esdrúxulo senso de superioridade
de classe subalterna ao modelo superior de outros povos, no caso os EUA. Esses
personagens do outro lado da margem dos comunistas, repetem a mesma inação ou
ação sob comando de outros povos, igual aos comunistas com a União Soviética.
Tomei por exemplo este chorume da história para nos lembrar
que o Golpe Militar de 64 era uma fachada ideológica a serviço dos interesses
dos Estados Unidos da América. Claro que refletiam o conflito interno, a forte
reação de latifundiários e os próprios erros do Governo Goulart, mas jamais
teriam a desenvoltura finalista que tiveram se não fosse o financiamento americano
do IPES (Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais) e do IBAD (Instituto
Brasileiro de Ação Democrática) que financiavam armas, textos, campanhas
eleitorais e deputados no parlamento. Sem os mecanismos de sabotagem do
abastecimento, além de programas de invasão da CIA e outros setores de
inteligência americana dentro do Programa Aliança para o Progresso e com o que
chamava Voluntários da Paz. Nos idos dos anos 63 a 67 só no bairro da Batateira
moravam dois americanos sem papel religioso, vivendo numa casa precária e colhendo
informações.
Porém o mais importante foi o deslocamento de uma frota de
navios para dividir o país em cinco partes e assim promover o fatiamento da
unidade nacional. Com armas, armadas, infiltração social, financiamento de
setores militares, políticos, da mídia, religiosos e intelectuais, os EUA foram o
móvel essencial do golpe. Até mesmo a violência com a tortura e humilhação
sofrida por militantes adversários fez parte da política americana que além de
ampliar a capacidade de torturar apoiava todas as práticas já em curso nos
porões da polícia brasileira, sem contar os horrores já praticados durante a
ditadura do Estado Novo.
Os EUA não apenas foram o móvel do Golpe, como auferiram
logo em seguida todas as vantagens econômicas advindas dele: remessas de
lucros, fim da estabilidade do emprego, arrocho econômico, perseguição dos
trabalhadores e a criação de multinacionais que dirigem até hoje a economia
nacional. Foi efetivamente um Projeto Imperial que levou o povo brasileiro a um
atraso imenso em seu progresso e desenvolvimento, atingindo todos os campos: a
posse da terra, a urbanização justa, a educação, a saúde pública, a
infraestrutura produtiva e, principalmente, a autonomia para um projeto de
desenvolvimento nacional.
Isso tudo não pode ser mais objeto das dúvidas daquele
militar de pijama do início do texto: isso é um farto material pesquisado e
para ser ainda mais aprofundado do papel dos EUA no Golpe Militar de 64. Não é
questão de crença ideológica, é a luz dos documentos e registros da época.
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