Estou repetindo o que li: quando Henry Kissinger visitou a
China, perguntou ao chefe de Estado o que achava da Revolução Francesa e aquele
respondeu que fazia muito pouco tempo que havia ocorrido para se fazer uma
avaliação mais correta. A China é uma organização de governo milenar e o tempo
de sua cultura mais largo e aprofundando em termos de história humana.
Durante as escaramuças iniciais da Revolução Francesa no que
seria o Parlamento, ou Terceiro Estado, em suas reuniões quem se sentava à
esquerda se unia em torno de mudanças no Governo, no Estado e na Sociedade e
quem se sentava à direita, membros do clero e da nobreza, se uniam em conservação
dos mesmos. Daí surgida a dicotomia esquerda e direita, progressistas e
conservadores.
No início dos anos noventa, embalados com a queda da União
Soviética e com a possibilidade de uma política mundial unipolar centrada nos EUA,
a direita, ou conservadores, ou neoliberais, teve base para expandir o discurso
do fim da história. Cessada toda a assimetria ideológica, agora seria uma
estrada traçada pelas forças vivas do mercado. Historicamente isso significa a
vigência de uma lei e de uma ordem única bem ao gosto daqueles que se reuniam à
direita.
Mesmo com a crise do modelo neoliberal, que em economia
significa essencialmente financeirização e desregulamentação, os conservadores
continuam com horror à possibilidade de que exista quem pense de outro modo. Quem,
aliás, pense porque vive a necessidade de viver e viver é um misto de bem-estar
espiritual e suprimento de suas necessidades materiais essenciais (o que seja
isso uma vez que muda tanto).
Os efeitos da Revolução Francesa, como disse o líder Chinês,
continuam, historicamente duzentos ou trezentos anos é muito pouco para a história.
Direita e Esquerda estão na pauta do debate não apenas em palavras. Não é
possível apertar a descarga da divergência e jogar tudo na rede sanitária.
Refugiar-se num tempo inexistente é a existência no vácuo, logo preenchido pelo
mais recôndito que lhe existe na alma.
Quando não se pensa igual a mim isso revela o quanto de
diferença há na visão de mundo. Mas precisamos qualificar onde permanecem as
diferenças e, no meu entender, só existe um elo comum: a Constituição Federal. Assegurando
o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o
bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de
uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. E onde se encontram as
diferenças ao chocar os ovos da serpente?
Na solução que funda todo aquele exercício constitucional. “Na
harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica de controvérsias...” E tomemos por base um fio de fronteira entre ser
e não ser: constituímos um “Estado de Direito Democrático” fundamentado na “soberania,
na cidadania, na dignidade humana, nos valores sociais do trabalho e da livre
iniciativa e no pluralismo político.” E, claro, “todo poder emana do povo, que
o exerce por meio do seus representantes
eleitos direta ou indiretamente nos termos desta Constituição.”
Com todo este “conservadorismo” a me tomar o penúltimo dia
do ano me reporto à chocadeira dos ovos da serpente. Mesmo sabendo que nos
extremos a gema do ovo gerará a serpente do braço vingador, que envenenará todo
o exercício constitucional pretendido.
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