TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

A palavra de LOURENÇO FILHO (transcrição ipsis litteris)

“Os diferentes períodos da vida do Padre Cícero Romão parecem demonstrar o desenvolvimento de uma psicose, revelada desde a adolescência. É assim que, quando aluno do Seminário em Fortaleza, já demonstrava sinais tão evidentes de “mitomania” (tendência para mentir), que o reitor do estabelecimento, padre Pedro Chevalier, opôs dúvidas à sua ordenação. Mas o bispo D. Luis dos Santos não achou que o exagerado misticismo do “formigão” apresentasse perigo à ação do futuro missionário. Achou que devia ser ordenado, e assim se fez”.

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 “Se o chefe de Juazeiro tivesse podido acumular e manter, naquele meio, um sólido e brilhante cultivo do espírito, este, sim, seria o seu maior e mais legítimo milagre. Vivendo, há mais de meio século, em contato apenas com o sertanejo bruto, e ademais, num ambiente de delírio; não dispondo sequer de tempo para ler e meditar, pois que suas horas não bastam para atender a peregrinos e beatos; sem recursos de renovação de idéias, por livros e jornais, que até sua casa só raramente chegam; sem necessidade alguma que o leve a exercitar o espírito, para sadio objetivo cultural – é óbvio que só se possa encontrar nele, no termo de oitenta anos de vida, uma inteligência medíocre e fatigada, adstrita aos mesmos abusões, preconceitos e desvios mentais do sertanejo...

À vista de tudo isso, já seria inadmissível uma elevada cultura em qualquer indivíduo sujeito à sua vida especialíssima. E os fatos o comprovam, com toda a crueza. Em toda sua longa vida sacerdotal e política, jamais pronunciou um discurso memorável, uma conferencia ou série de pregações que tivesse produzido eco; jamais escreveu um artigo de propaganda ou defesa; uma obra modesta que fosse de doutrina ou combate.

Por que, por exemplo, não explicou, num livro, que seria fácil compor, se tivesse cultura, a sombria questão religiosa em que se envolveu ? Por que não consagrou  sua vida à propaganda dos meios científicos de combate à seca, não fez o estudo da história ou das necessidade atuais da região ? Por que não impulsionou, por meios eficazes, a evolução social do burgo que sempre dominou ? Por que não tem permitido que se desenvolva a instrução pública de Juazeiro ? Por que se deixou dominar, de modo absoluto, sem um reclamo ou desabafo, por meia dúzia de indivíduos que o têm manejado, e que o manejam, no próprio proveito deles ?


Necessariamente, porque, sobre a hipótese de uma psicose que o desadapta a elevada função social, falece-lhe, por inteiro, a cultura do espírito. A maneira pela qual o Padre Cícero se dirige aos romeiros e ouve lamentações e queixas, recebe dinheiro e outras dádivas, aconselha e receita, não é só a de uma pessoa que tivesse escapado à normalidade: é a de um homem manifestamente inculto”

(Lourenço Filho - que conviveu e foi recebido pelo próprio). 

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