PEDRO CARDOSO E ONDE SE ENCONTRAM O ARTISTA E A TELEVISÃO BRASILEIRA.
Podemos apontar alguma característica específica nas
famílias? Com a urbanização, a globalização parece uma pergunta sem referência.
Mas a verdade é que certas lideranças familiares projetam, numa sequência de
descendentes, valores que se transmitem entre as gerações. Lembro da família
Cardoso (de FHC) que tem papel na história desde o fim da Monarquia.
O pai do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, militar,
era uma das lideranças destacadas do nacionalismo e foi deputado federal pelo
PTB do Distrito Federal na legislatura de 1955. Aliás, FHC, embebedado pela USP,
ufanou-se em superar a era Vargas.
Mas eu queria falar era do Pedro Cardoso, ator, figura de
destaque no teatro e televisão, até bem pouco tempo fez o Agostinho na série da
Globo chamada de Grande Família. Olhem só alguns trechos do que diz Pedro
Cardoso numa entrevista para o UOL:
“O mundo ainda é moldado para atender ao interesse sexual
masculino. Principalmente no mundo artístico. Acho que não há nada mais
subserviente aos interesses econômicos, hoje em dia, que o mundo artístico. Acho
que nós artistas esquecemos de muito tempo que nós somos do contra. Que nós
temos que estar um pouco na contramão do interesse econômico”.
“Hollywood colocou os artistas perto dos ricos e essa
atração por uma vida mais rica, com mais dinheiro, ela é muito complicada, no
meu entender, para o artista. A pessoa que te paga nunca de paga para você
dizer o que você quer. Paga para você dizer o que ela quer que você diga”.
“Mas chega um momento, às vezes, que é poderosa a divergência,
nessa hora o artista é demitido. Ou ele vende a alma ao diabo e diz o que não
está no coração dele... Eu acredito que a arte é simbólica. Que o gesto
artístico não é uma reprodução da realidade. Até porque eu acho que a realidade
não é reproduzida. Ela só é possível viver. Quando eu te conto algo que me aconteceu,
já é uma narrativa. Já é uma coisa que tem uma linguagem ali. É inevitavelmente
simbólica”.
“A atual administração da TV Globo, tanto a parte burocrática
quanto a artística, está empenhada em projetos de autores e não de atores. O petróleo
da comunicação social, em teledramaturgia, é o ator. É o ator que dá cara ao
trabalho de todos. Isso confere ao ator um poder incomensurável. Eu penso que a
empresa, e não só a Globo, inconscientemente nega o poder ao ator. Na
organização de poder da empresa quem tem poder não são os atores. Os atores
ficam esperando serem convidados. A Globo não é sensível a nenhum movimento
feito pelo ator”.
“Eles não querem atores autores. E ele não precisa
necessariamente escrever. O Antonio Fagundes e o Lima Duarte quando
representam, a autoria da representação deles é tão poderosa que aquilo é uma
autoria que o público reconhece. No momento atores assim não são bem vistos.
Porque atores assim cobram caros. O mercado, no momento, não quer pagar
autores. Ele prefere atores que já entraram no mercado tendo abdicado de
antemão de sua autoria. Já entraram subservientes ao autor”.
“Os atores fazem qualquer coisa que lhes mandam. Têm pouca
voz. Eu sou tido e havido como um sujeito que briga. Eu brigo pela minha
autoria. Quando eu encontro um diretor que compreende que o que há entre mim e
ele é apenas uma relação de função e não de hierarquia”.
“Eu acho que o saldo da Grande Família se deve em grande
parte ao relaxamento das relações hierárquicas entre o Guel, o Claudio Paiva e
o elenco. Porque a autoridade é inimiga da criação. O ambiente da criação é a
liberdade”.
“Televisão no Brasil se dedicou a construir uma espécie de
pais que não é verdadeiro. Eu acho que isso atrasa o amadurecimento político,
emocional, do Brasil. Então eles negam o Brasil verdadeiro. Eu vou dar um
exemplo: houve um tema sobre liberdade. A nossa máquina inconsciente
rapidamente colocou uma questão de escravidão. Porque o problema da liberdade
no Brasil está indissociavelmente ligado à escravidão. Este tema tratado com
verdade é difícil para o Fantástico. Porque o Fantástico trata dos assuntos com
uma falsa verdade. Até quando diz que uma coisa é verdade parece um
entretimento, parece uma coisa bobinha, uma coisa engraçadinha. E eu faço uma
coisa que é engraçada mesmo. Não uma coisa engraçadinha. ”
“Eu defendo a regionalização da programação. Eu acho um crime
que o nordeste brasileiro não tenha uma teledramaturgia própria. Se for ruim
para o negócio mudamos então o negócio. É ruim para esse negócio como está
organizado hoje. Mas os artistas do Rio de Janeiro não vão poder ganhar tanto. Não
vão ganhar tanto aqui, mas eu vou poder trabalhar lá. Vou ter mais liberdade. O
mercado ficaria infinitamente maior, câmeras, contrarregra, todo mundo ia ter
mais emprego. O dinheiro ia circular mais nas regiões. O Brasil ia perder este
centralismo São Paulo e Rio de Janeiro”.
“O Brasil mudou muito mais do que a televisão brasileira
mudou. A televisão brasileira ainda está igual à televisão do FH. Nós estamos já
aqui no Brasil pós-Dilma, embora ela ainda esteja. E a gente tem que retratar
este Brasil que mudou. Se a gente ficar fazendo a televisão que era da época do
Fernando Henrique o público vai fazer outra coisa. ”
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