A priori, um esclarecimento:
em sendo agnóstico, não acreditamos em ocorrências de milagres ou
coisas tais. Assim, permitimo-nos refutar a teoria disseminada por
alguns de que em Curitiba, nas masmorras do juiz federal Sérgio
Moro, verdadeiros “milagres de conversão” estariam a ocorrer com
seus “hóspedes”, já que repentinamente renegam o que fora
explicitado antes e assumem o que lhes é determinado pelo juiz.
Paradoxalmente, entretanto, acreditamos que o apregoado e difundido
“milagre da conversão” pelo menos tem o condão de nos levar a
uma reflexão séria e pra lá de assustadora: afinal, na busca de
informações consideradas pelo representante do Estado (o juiz) como
necessárias, qual a metodologia mais eficiente e eficaz de se
torturar um ser humano: a física ou a psíquica ???
Como sabemos, na tortura
física vige a brutalidade e morbidez em toda a sua crueza e
iniquidade, quando “animais” travestidos de carrascos insensíveis
e orientados por superiores psicopatas (vide Luiz Antônio Fleury, do
Doi-Codi paulista, no tempo dos milicos), submetem o ser humano ao
auge da degradação física, em diferentes gradações do modus
operandi, tais quais: despir e pendurar a pessoa no famoso
“pau-de-arara” e em seguida arrancar-lhe os dentes à base da
porrada, até que se disponha a “abrir o bico”; extrair-lhes as
unhas (dos pés e mãos) lentamente e sem anestesia, com alicate;
submergi-los em afogamentos forçados, que se estendem ao limite do
suportável pelo ser humano; aplicar-lhes choques elétricos nas
partes íntimas (mamilos, vagina, ânus, língua, ouvidos e por aí
vai, em intervalos diminutos, fazendo-as urinar e defecar
involuntariamente; praticar sexo à força, com mulher ou homem,
pouco importa, no intuito de desmoralizá-los; fazer uso de um tal
telefone, quando a vítima recebe, de surpresa e por trás, violentos
safanões nos ouvidos, capaz de fazê-la perder a consciência
momentaneamente; e, alfim, interrogatórios que duram dias e dias,
sem intervalo, com o revezamento dos inquisidores (mas não da
pauta), de forma a que o preso não tenha direito a dormir e finde
por assinar qualquer papel que lhe seja posto à frente ou falar o
que queiram os juízes. A tais “métodos de convencimento”, foram
submetidos alguns brasileiros no tempo de vigência da ditadura
militar. Se uns poucos resistiram e NÃO “deduraram” (entre eles
a ex-presidenta Dilma Rousseff), boa parte não suportou e “entregou”
companheiros de luta. Em tais situações, pois, tínhamos as
“delações NÃO premiadas”, onde o corpo certamente ficou
marcado indelevelmente ao servir como mero e banal “instrumento de
convencimento”.
Já no tocante à tortura
psíquica, o método requer um pouco mais de “requinte e
sofisticação”, porquanto o padecimento se dá através da
deletéria “perturbação mental” do indivíduo. Assim, num primeiro momento
e objetivando ofertar ao indigitado a “vantagem” de uma “delação
premiada”, mesmo sem nenhuma prova material do suposto crime
cometido (mas só por convicção da autoridade competente),
conduz-se coercitivamente o suspeito para a cadeia, joga-se no fundo
de uma cela, onde permanece incomunicável por dias, até que se
disponha a “colaborar espontaneamente”. Não sendo a narrativa
“espontânea” do agrado do todo poderoso senhor juiz, temos o
imediato retorno do preso à cela, onde terá tempo de sobra para
refletir se aceita ou não confirmar a versão da autoridade
competente. Como prêmio pela colaboração, mais à frente terá
redução substancial de uma suposta pena.
As reflexões são só para
lembrar dois casos recentes e emblemáticos: ao ser preso, o
empresário-bandido Marcelo Odebrecht, indagado sobre se estaria
disposto a colaborar, via “delação premiada”, indignou-se e
peremptoriamente afirmou ante as câmaras televisivas não ser
“dedo-duro”, que tinha caráter, formação moral e religiosa,
que inclusive em casa houvera ensinado os filhos menores a jamais
praticar tal ato, e por aí vai. Com o tempo, mofando no fundo de uma
cela nada confortável para os seus padrões, deglutindo as
“quentinhas” da vida e já condenado a dezoito anos de prisão,
eis que esqueceu as convicções de outrora, o ter ou não caráter,
moral, religião e o escambau, e não só “botou a boca no
trombone”, como autorizou seus homens de confiança a também
fazê-lo. E a tal “delação do fim do mundo” está apavorando os
políticos corruptos que fazem da bela Brasília uma espécie de
refúgio de marginais (agora, se o Marcelo Odebrecht apresentará
provas contra todos, de tudo o que disse, aí é uma outra história).
Um outro portento da
construção civil, o empresário dono da OAS, Leo Pinheiro, que se
dizia “amigo” do ex-presidente Lula da Silva, num primeiro
depoimento cometeu a “ousadia” não só de NÃO acusá-lo em
momento algum, como até inocentá-lo, já que não praticara
qualquer crime; foi o suficiente para que as autoridades competentes
desconsiderassem tal documento, ao tempo em que “magnanimamente”
resolveram dar-lhe tempo para uma reflexão mais apurada, de modo
que, numa próxima oportunidade contemplasse, obrigatoriamente e por
cima de pau e pedra, Lula da Silva; para tanto, reverteram a prisão
domiciliar que lhe fora concedida, lhe acrescentaram dez anos à pena
original e o recambiaram de volta às masmorras de Curitiba. Foi o
suficiente e bastante para que Leo Pinheiro contrariando seus
advogados, desdissesse tudo o que afirmara no depoimento anterior,
agora acusando frontalmente Lula da Silva de tudo o que as
autoridades lhe atribuíam (embora ressalvando a não existência de
provas). Por não concordarem com o novo posicionamento do cliente,
seus advogados resolveram abdicar da causa. Só que este era o álibi para
que o juiz de Curitiba, Sérgio Moro, consiga seu “objeto de
desejo”: condenar o ex-presidente Lula da Silva e impedir-lhe de
candidatar-se em 2018.
Ante situações tão
díspares, e adstringindo-se ao tema-título do presente artigo, o
questionamento seria: para você, que está aí do outro lado da
telinha, qual o tipo de “tortura” mais eficaz e eficiente a fim
de que se consiga o tal "milagre da conversão", e que no
fundo privilegiam bandidos de alta periculosidade: a física ou a
psíquica ???
Enquanto você reflete,
lembre-se que Alberto Youssef, Paulo Roberto Costa, Sérgio Machado e
Pedro Barusco dentre outros, estão por aí, livres, leves e soltos,
farreando e gastando a fortuna obtida através de roubo (devolveram
uma ínfima parte) após delatarem antigos companheiros. Ou você
acredita que por usarem tornozeleira eletrônica permanecem reclusos
e silentes em suas mansões ???
Eugenio Aragão, ex-ministro
da Justiça, sintetiza magistralmente o que expomos acima, quando
afirma... “o mal da tortura é que não oferece provas sólidas da
verdade, mas apenas provas sólidas da (in)capacidade de resistência
do torturado”, ao tempo em que lembra que a tortura não é apenas
física, do pau de arara, do choque elétrico, mas também
psicológica.