TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

terça-feira, 15 de janeiro de 2019


AS CIDADES VIVIDAS – MISSÃO VELHA

Cidades imaginadas ou “cidades invisíveis” como relevou Italo Calvino se transformam noutra ficção quando são vividas. A vida não é uma ampulheta, tão somente a contagem do tempo. Ela a invenção do tempo no espaço das cidades sonhadas que, cobertas por este sonho, se transformam em vividas.

E por isso Missão Velha é uma cidade de passagem, sem que nela desabitem as pessoas e seus modos inerentes de ser. Por lá, nas luzes do espectro do dia, o transeunte sempre compreenderá tudo que nela há.

Por Missão mais antiga se compreenda que a nova ao surgir já ela havia passado na medida da memória. Por ser uma cidade de passagem, assim inventaram uma grande rua que subia um alto após uma depressão e seguia até o final da passagem por altos e vales da encosta da chapada.

Ser de passagem não é apenas um trânsito. Missão Velha tem o dom inerente de revelar, independente da velocidade do transporte ou até mesmo das passadas, todo o conteúdo do seu dia-a-dia. Até mesmo dos fatos esquecidos do passado.

Mesmo sem ser vista na passagem, compreende-se a praça central, a igreja centenária, o comércio, o velho cinema com seu palco no qual de poderia encenar um drama épico dos Cariris. Ali um amor em estágio de maturação, mais adiante uma paixão com todo fervor da descoberta. Um comerciante falido e seus devedores ameaçando.

Na velha igreja o monsenhor que surpreendia por ter uma inteligência rara, mesmo profundo no mundo clássico greco-romano, era um revelador da física contemporânea com uma rara compreensão dos elementos, das combinações e sínteses químicas.

No entanto fosse uma mulher sem mangas ou sem véu à igreja, seria interditada pelo monsenhor de modo grosseiro, houvesse a interdição na entrada ou uma retardatária durante o desenvolvimento da missa. Ele pararia a solenidade e a expulsaria no mesmo ato.

Em Missão Velha a família Linard surpreende com uma fábrica de engenhos a vapor. Ali se encontra toda a força dos séculos da modernidade industrial com suas máquinas de multiplicar forças e trabalho. Ser de passagem é um estado de espírito em evolução.

E antes que a passagem termine, indo de leste a oeste ou ao contrário, corre paralelo à nossa vida, o trem com sua estação de reencontros e despedidas. De passagens para o socavão da chapada, na cidade do Crato ou para a infinita planície marinha de Fortaleza. 

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