TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Patrícia Rehder Galvão - segunda parte - por José do Vale Pinheiro Feitosa

Hoje, 9 de julho de 2010, escolhi para postar a segunda e última parte da postagem sobre Patrícia Galvão - Pagu - pois hoje, se fosse viva, completaria cem anos.


Patrícia Galvão, já famosa com o apelido Pagu, casada com Oswald de Andrade entra para o Partido Comunista, Oswald também e ambos mudam de comportamento social. Da vida folgazã da alta sociedade paulistana para a militância política e as incertezas da prática revolucionária. Fundam um jornal tablóide com o nome de “O Homem do Povo”, que era uma plataforma para apoiar “a esquerda revolucionária em prol da realização das reformas necessárias”. Ela escrevia, desenhava charges e vinhetas e mantinha uma coluna chamada a “A Mulher do Povo”, dedicada à crítica das “feministas de elite”. No oitavo número foi fechado por pela Secretaria de Segurança do Estado.

Eles participam nos movimentos operários, nas manifestações de rua, panfletando, mobilizando e discursando. Em 23 de agosto de 1931 é presa com agitadora durante a greve dos estivadores. Oswald tenta se passar por seu advogado e é preso também. Em 1932 o casal se separa e Pagu vai morar numa vila operária no Rio, trabalhando como lanterninha num cinema da Cinelândia. Fora por orientação do PC, mas um quadro importante do partido, como era Leoncio Basbaum, vi Pagu e Oswald apenas como “boêmios” se divertindo no meio da revolução operária. Neste mesmo período, com financiamento de Oswald, ela lança, em 1933, o romance Parque Industrial que uma denúncia da condição do operariado urbano.

Neste mesmo ano Pagu vai para a Europa, procurando examinar em loco a revolução comunista. Oswald financia a aventura dela e fica tomando conta do filho. Ela trabalha como correspondente para vários jornais brasileiros. Viaja pelos EUA, Japão e China e depois, pela transiberiana, vai a Moscou. Decepciona-se com a condição material das pessoas na Rússia e daí segue para a França, onde estudará na Université Populaire e se filia ao Partido Comunista Francês. Participa de grandes manifestações populares, sendo detida três vezes como militante estrangeira. É salva pelo embaixador brasileiro, Souza Dantas de ser submetida ao Conselho de Guerra ou deportada para Alemanha ou Itália. Com isso é remetida ao Brasil.

Chega ao país, concretiza a separação de Oswald e começa a colaborar no jornal A Platéia. Em 1935 é presa junto com todos os comunistas, torturada, foge do presídio, termina sendo presa e cumpre a pena na Casa de Detenção. Em 1940 por se recusar a homenagear Adhemar de Barros que era o interventor no estado, fica mais seis meses presa. Quando sai do presídio está muito magra e tenta suicídio. Neste período ela rompe com o partido comunista e se casa com Geraldo Ferraz e passa a colaborar com diversas publicações como crítica e redatora. Participa da revista Detetive de Nelson Rodrigues e publica um romance A Famosa Revista com críticas ao partido comunista.

Mesmo revelando o que Leoncio Basbaum já suspeitava, Pagu não se torna uma figura de direita, rancorosa e profundamente anticomunista. Ela nos anos 50 entra para o Partido Socialista Brasileiro e tenta uma candidatura sem sucesso. Neste período a sua prática se volta para a arte definitivamente, mas ainda uma prática engajada. Dedica-se ao teatro, sua personalidade já sofrida com os embates da vida, menos ousada, mas não menos combativa. Estudando e freqüentando a Escola de Arte Dramática, Pagu leva a peça A Descoberta do Mundo Novo para Santos e monta um programa de espetáculos da escola na cidade.

Em Santos ela é ativa na mobilização e na instalação de instrumentos culturais. Lidera a campanha pelo Teatro Municipal, funda a Associação dos Jornalistas Profissionais, cria e preside a União do Teatro Amador de Santos, que formou uma geração muito especial de “agitadores” do teatro brasileiro como José Celso Martinez Correa e Plínio Marcos, além de talentos como Aracy Balabanian e Sérgio Mamberti. Participa com artigos sobre a cultura, revelando escritores relevantes nas lutas culturais como Ionesco, Brecht, Fernando Pessoa, Dostoiévsky, Rilke e Pirandello.

Patrícia Galvão tinha aquele espírito que vamos encontrar em Darcy Ribeiro e até mesmo num Oscar Niemeyer, apesar das diferenças de vida entre eles. São pessoas muito atentas à roda viva do mundo, gostam muito de ajudar aos outros, permanentemente preocupadas com o futuro, com a liberdade e a justiça social. Por isso ela não era um Carlos Lacerda de vestido, do mesmo modo como Darcy que não era do PC, mas igual ao Oscar Niemeyer que até hoje repensa o marxismo apesar das crises do socialismo real. Morre doando a biblioteca dela para a Escola de Arte Moderna e com um poema final que revelam a sua dimensão pessoal: “Nada, nada, nada /Nada mais do que nada / (...) Trouxeram-me camélias brancas e vermelhas / Uma linda criança sorriu-me quando eu a abraçava / Um cão rosnava na minha estrada (...) /Abri meu abraço aos amigos de sempre / Poetas compareceram / Alguns escritores / Gente de teatro / Birutas no aeroporto / E nada.

Nenhum comentário: