TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Algemaram a República

Os nossos fotógrafos cratenses sabem bem disso. Uma foto pode valer mais do que muitos parágrafos. A foto da reunião do Presidente Lula com o Presidente do Supremo, o Ministro da Defesa e o Ministro da Justiça diz da pior natureza do espírito republicano. Neste dia o cidadão tem a sensação de que estas pessoas do mais alto relevo da vida política nacional estão completamente despreparadas para o enorme patrimônio de um país continental e com 200 milhões de habitantes.

A primeira impropriedade é a presença do Ministro da Defesa. Se você estranhou esta impropriedade, agora reflita. No centro de uma crise entre dois poderes, os representantes máximos deveriam ser fotografados os dois juntos. O que o ministro Jobim estaria fazendo naquela reunião? Reforçando a idéia que não existem os poderes da república? Que estaria ali por uma mera questão de ter sido, no passado presidente do Supremo, mas hoje é nomeado pelo presidente da república?

A segunda é ter se incluído na foto o ministro da Justiça, pois ficou marcado que ele é insuficiente para uma reunião com jurisconsultos, assim o presidente teria o sábio ministro Jobim. O mais humilhante para os poderes da república é que neste dia se tratava de uma questão específica de um banqueiro sendo acusado pela polícia e a justiça federal. Não se tratava de uma questão republicana, de um fator coletivo de toda sociedade.

A terceira impropriedade é política. O presidente Lula foi pego numa arapuca. A mídia tinha avisado, desde o princípio, que Daniel Dantas tinha relações no palácio e que o caso incomodaria a presidência e a casa civil. No mesmo dia, mesmo que na reunião não se tenha declarado nada, a matéria da imprensa colou na foto o afastamento do delegado Protógenes das investigações contra o banqueiro.

Conclusão da foto: caiu a república e implantou-se a monarquia. O ministro do Supremo Federal, Gilmar Mendes, com o riso escancarado enquadrando os poderes da república.

Conseqüência 1: o PT e o governo do Presidente Lula saem do episódio com mais problemas do que os partidos que realmente forjaram o banqueiro Daniel Dantas.

Conseqüência 2: o respeito à justiça fica maculado, pois justiça que existe para rico e o castigo para o pobre é o caminho para revolta, rebeldia ou revolução. Ainda hoje, 16 de julho, é impossível deixar de se olhar para o livre e solto banqueiro e preso e bem preso punguista que tentou roubar na beira mar em Fortaleza o cordão de ouro do Ministro Mendes.

3 comentários:

Armando Rafael disse...

Atentem para esta frase escrita pelo nosso amigo José do Vale no seu artigo:
“(...) a reunião do Presidente Lula com o Presidente do Supremo, o Ministro da Defesa e o Ministro da Justiça diz da pior natureza do espírito republicano”

Ora meu caro José do Vale esta história de “espírito republicano” nunca existiu no Brasil. Onde está a independência dos Poderes da República? Outro dia, em discurso inflamado ao povo nordestino, o nosso Presidente falou pelos cotovelos, como sempre faz. Referindo-se ao Presidente do Supremo Tribunal Federal Eleitoral, que havia feito comentários sábios de advertências sobre as atitudes eleitoreiras do Lula, nosso presidente disse que seria melhor se cada poder não se intrometesse nas coisas do outro e que ele (o Presidente do Supremo Tribunal Federal Eleitoral) deveria se candidatar e virar político, para poder falar . Lula não gosta de ser contrariado...

Que bom que o nosso Presidente entendesse que democracia permite opiniões contrárias. Que ele não se intrometesse também tanto no poder legislativo que só faz apreciar as medidas provisórias do Executivo, editadas as enxurradas.
Aliás, por questão de justiça, devemos admitir que isso não é feito só pelo atual presidente. A coisa vem de longe...

Qualquer brasileiro que não seja um fanático republicano sabe que o golpe militar que instaurou a República a 15 de novembro de 1889, no Rio de Janeiro, não foi um ato dos mais brilhantes da nossa História. Foi, na verdade, um golpe mal organizado que teve tudo para dar errado, inclusive falta de apoio do povo que assistiu bestializado aos acontecimentos, sem entender o que se passava, segundo o testemunho isento de um republicano da época e ministro do governo provisório, Aristides Lobo.
Deu no que deu... É por isso – e por outras – que, para o povão ( antigamente chamavam “povinho” lembra-se?), República no Brasil é sinônimo de coisa desorganizada. Basta lembrar as famosas “repúblicas dos estudantes”. Tudo que é bom e que se destaca ficou no imaginário popular como sendo dos “tempos da Monarquia”. Temos o Rei Pelé, o Rei Roberto Carlos, a Rainha dos Baixinhos, o Rei do Baião. Lembra-se do Restaurante do Alfredo, o “Rei da Peixada”?. Nas escolas fazem concursos para escolher a “Princesa do Colégio”. No comércio: “O Rei dos Enfeites”, “O Rei da Feijoada”, o “Império das tintas” e por aí vai...
Aqui no Crato temos a Rádio Princesa, o Colégio Pequeno Príncipe... E em Fortaleza, a Rua Marechal Deodoro só é conhecida pelo povão como “Rua da Cachorra Magra”...Nunca vi coisa boa ser comparada com “O Presidente”...

Daí porque, no Brasil, “espírito republicano” é "neologismo" do atual governo do PT...

PS - Os golpistas de 15 de novembro de 1889 fizeram do novo regime republicano brasileiro uma cópia servil do modelo norte-americano. A diferença entre a república nos EUA e a república no Brasil é que nos EUA, existe uma coisa chamada “espírito republicano”, ou seja, para o “bem público”. Lá os líderes políticos podem divergir em número, gênero e grau, mas se o projeto for de interesse dos EUA eles apoiam o Presidente. O espírito público está em primeiro lugar. Um caso clássico foi a votação da guerra do Iraque quando a esmagadora maioria de democratas e republicanos apoiou a solicitação de George W.Bush.
Quando o Brasil chegará a esse estágio????

Marcos Vinícius Leonel disse...

Lendo a sua análise crítica, José do Vale, em que concordo em tudo, saliento ainda que a o vírus da monarquia está mais presente do que nunca, basta reconhecer o fenômeno das oligarquias políticas brasileiras, em que eleições são resumidas a tomada de poder e conseqüentemente a posse da canetada, para poder nomear quem bem queira para o que se queira fazer. Você tem poderes que não se respeitam e trocam de funções com a maior facilidade do mundo. Vez por outro toma posse no Supremo Tribunal, literalmente, um imbecil doutorado, arrotando falácias e exibindo as suas armas, é por isso que eu defendo uma revolta armada, fuzila esses filhos da puta todos.

Desculpe, Armando, mas acredito que se a monarquia estivesse instituída de fato, o cabaré seria o mesmo, só que mais escrachado ainda. Isso não quer dizer que eu seja franco defensor do modelo(?) de república que está aí.

Abraços

Armando Rafael disse...

Marcos Leonel,
embora discorde de resolver males por meio da violência, tenho de concordar com esta sua afirmação:

“Isso não quer dizer que eu seja franco defensor do modelo(?) de república que está aí”.

Você tem toda a razão. Na verdade, o modelo republicano não deu certo no Brasil. A Constituição do Império vigorou ininterruptamente durante 65 anos (de 1824 a 1889). Na República (em 118 anos) já tivemos 6 constituições diferentes e dos 40 presidentes, apenas 13 foram eleitos pelo sufrágio popular e conseguiram cumprir regularmente o mandato, aí incluídos os dois últimos: FHC e Lula.
Nos tempos de Dom Pedro II, o Brasil tinha uma moeda estável e forte (cotada a par do dólar e da libra esterlina), possuía a segunda Marinha de Guerra do mundo, teve os primeiros correios e telégrafos da América, foi um dos primeiros países a instalar telefone e adotar o selo postal. A diplomacia brasileira era das mais prestigiadas, tendo sido nosso Imperador Pedro II convidado a arbitrar pendências entre grandes nações, como França, Inglaterra, Alemanha, Itália e EUA. Dizem que só tinha mais prestígio do que o imperador brasileiro o Papa!
A inflação média anual, durante o Império, foi de apenas 1,58%! Nos primeiros 45 dias de República, a desvalorização da moeda já pulou para 10%; em 1890 foi de 41%; em 1891, de 50%, e assim por diante. Ultimamente, ela recrudesceu depois de 13 anos sob controle, devido ao governo federal que só sabe gastar.
O grande historiador Pedro Calmon escreveu:
“A República deu a impressão de que envelhecera no segundo mês de existência (...) Os republicanos foram os primeiros decepcionados. Correu a frase, de que “não era a República dos nossos sonhos”
(“História do Brasil”, José Olympio Editora, Rio, 2ª ed.1961, vol.VI, páginas 1.894-1.895)

Salvador de Mendonça. Republicano histórico, em livro publicado no início do século passado, classificou os 20 primeiros anos da República brasileira como:
“um verdadeiro conto do vigário para os republicanos sinceros que a queriam melhor do que o regime decaído”
(“Obras Seletas”, Carlos de Laet. Agir, Rio, 1983, vol. I, página 221)
Para finalizar o político Raul Pila, que durante décadas lutou para implantar o parlamentarismo republicano no Brasil, escreveu:
“Da Monarquia recebeu a República um país politicamente educado, que com algumas modificações do sistema eleitoral chegaria à plenitude democrática e, de queda em queda, deixou que viesse nivelar-se com as republiquetas latino-americanas, de tão má fama. Haverá quem, nestes dias, de boa-fé, o possa negar?”.
Raul Pila escreveu isto em 1958. Imagine, se vivo fosse, o que ele escreveria agora sobre esses tristes dias dos cartões-corporativos, das CPIs que terminam em pizza, do “mensalão”, dos “sanguessugas”, dos “vampiros” instalados no Ministério da Saúde, do “Renangate”, do esquema das ONGS e de tantos e tantos outros escândalos...