Das estratégias
Provavelmente recolhido do repertório
De Zé da Bigorna, antigo e falastrão
Cantador de feira
As nuvens escapuliram do céu,
Dobraram em becos,
Correram em avenidas,
Subiram ladeiras,
Vasculharam telhas,
Supervisionaram a visão
E o horizonte líquido.
Foram três dias de função,
De água pura, amniótica:
Para cada princípio do céu
Uma matéria transbordada,
Uma teoria submersa, à deriva,
Ou simplesmente afogada.
Foi quando nasceram
Os achadores de cacimba.
Das preces
Dizem que foi encontrada nos bolsos
Do poeta e canalha François Villon
Berenice!
Invoco-te os dentes!
Berenice!
Todos por toda parte.
Brancos.
Sisos, incisivos,
Cravados graves
Na parte podre
Da minha estrada
Florada e deflorada.
Berenice!
Invoco-te os dentes!
Berenice!
O teu mudo
Mudado mundo,
Multiplicado
Em dilacerantes
Dentes por toda parte.
Vence-me, faze-me
Feze indefectível.
Das correspondências
Alguns teorizam que o fragmento
Foi extraído diretamente do diário
Secreto da beata Maria de Araújo,
Mas nada foi comprovado ainda
Os catadores de papelão
Estão bem próximos do chão.
Proclo e Plutarco estão
Bem próximos das cortinas
Das linhas versículas.
Os ciclos dos reciclados
Estão bem próximos
Dos catadores de papelão,
Que buscam um lugar no céu.
As crianças brincam,
Se divertem com embalagens.
O pai apanha, amarra,
Amarrota e acumula,
Subjuga as fibras pardas
Aos fios do compacto.
Como é o teu nome? - É João.
E o teu? - É Tico. E tem out’o
Que é Ciço, de Pad’e Ciço.
Das ruas
Lido em uma lápide de um
Cemitério clandestino descoberto
Em fortuitas escavações
Na violência da cidade veloz
Um carro bateu em outro carro,
Deu-se um escarro,
Diferente do escargô,
Que carrega o seu fardo lentamente.
Diferente do que Deus
Fez carcomer e expelir
O pulmão de Cruz e Sousa.
Simplesmente ex-carros,
Símbolos da mesa posta,
Postais da voraz cidade.
Dos opostos
Fragmento encontrado entre os pertences
De um beduíno conservado em êxtase até hoje,
Enquanto aparelhos vasculham o espaço
Em busca de vida inteligente
Os caçadores de palavras,
Amparados por seus aparatos,
Entraram em rota de colisão
Com a essência dos Essênios.
Dissecaram signos e
Neutralizaram o ar dos beócios
Com a minúcia do escafandro,
Anunciando a nova convenção.
Quando as suas botas atingiram
A nebulosa de Magellan,
Lá as provas evaporaram,
O intelecto tornou-se deserto.
Lá, eles encontraram
Uma chuva de almas sutis
Que invadiram os seus corações
Com o silêncio absoluto.
Os poemas pertencem ao livro Manual de Sobrevivência Para Astronautas, ainda inédito.
3 comentários:
Como diria Lupeu:
PUTA QUE PARIU, MAN!
Arrasouuuuuuuuuuuu !!!
Valeu, sempre renovo minhas forças com essas interações. Não sofro daquela síndrome do parto na criação literária, mas duvido sempre da aceitação dos meus versos.
Rafa, você acertou, com o poema Sexo das Máquinas, estou iniciando um novo trabalho, ainda sem título, mas aberto para novos contatos imediatos.
Socorro, recebi o seu recado sobre o livro de José do Vale, já estou ansioso, seu poema acima é, como sempre, uma distribuição generosa de sensibilidade, a alma de um poeta.
abraços
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