TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

domingo, 14 de dezembro de 2008



Liberto-me. Minhas palavras são leves. Levam-me silentes em suas asas. Mais uma vez minha paisagem se veste de azul e te busco na madrugada. Não consigo mais alforriar a saudade, nem fingir que te esqueço... Padeço. Mas sou livre. Livre para ponderar, livre para amar-te sem nenhuma desculpa, sem subterfúgio.

Um dia vens e me acendes. Vens e me foges. Então clamo pela porta aberta. Esqueço-me de que és só palavras. Que és verbo e poesia. Que és sal em meu poema. Desperta, eu calo as marcas que deixaste. Disperso o sonho, a cortesia das lágrimas. Quero estrelas e luz quando na noite eu me esconder pra abafar meu soluço. Sou livre, posso também chorar...

Um dia vens e me encantas. Amiúdo os momentos. A hora da canção.A estrada do tempo. E escapas com a noite em minha pele. Meus sentidos. Minha dor. Ainda ouço tua fala. Mansa. Teus sussurros noturnos. Teu hálito ainda perfuma minha lembrança. Versejo. Brigo com a solidão. Nada sobra. A não ser o que nunca foi. O silêncio tem medo, eu não sei mais.

Voas. Não te leio mais. Tuas palavras calaram teus senões. És silêncio. Mas sou livre. E guardo tudo assim meio ao viés de mim. Meus passos se consomem. Meus sonhos não te esquecem. Assim te guardo em meu secreto espelho, na clareza das perdas.

Só te peço: não me esqueças. E na última instância, busca-me na passagem da noite. Pois se me espantas, me deixas sem a realidade última. O tempo devora a vida. O tempo apaga os conflitos.

Então ouve-me! Sou o consolo da memória. Sou a argamassa do amor. Sou o beijo, sou a boca. Beijo molhado de silêncio...
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Texto por Claude Bloc

2 comentários:

José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

No blog do crato fiz um comentário a respeito deste texto da Claude. Nem revendo ou acrescentando. Apenas continuando no cântico poético desta mulher. Que abre seus versos com a palavra que a liberta. E assim seu cântico se completaria. Mas ela abre um diálogo com um terceiro. Como estamos cá deste lado, ela canta o "outro". Ela quer nos fazer mais compreensivos. O outro que um dia vem e a acende. Poderia ser o silêncio, mas em se tratando de uma mulher, parece o outro em gênero. Mas desde o princípio já avisou: "ivre para ponderar, livre para amar-te sem nenhuma desculpa, sem subterfúgio". Um amor em si, o ser como em metafísica. Mas uma dúvida surge pois ao dizer que nada sobra, explica: "A não ser o que nunca foi". E agora? Não se trata do ser? Engano mais uma vez, quem ouve uma mulher não espere a linearidade dos fatos e dos eventos. Novamente, não é o que se pensou. Era: "Assim te guardo em meu secreto espelho, na clareza das perdas". Pois aceita o outro plenamente como guardados "do viés de mim". Quando tudo parecia um clamor contra o esquecimento (esta é uma das frases mais amorosas que existe: não se esqueça de mim), vem uma mulher inteira. Uma mulher que ainda não se basta, mas certamente tem a inteireza dos seus atos frente ao mundo: "Então ouve-me! Sou o consolo da memória. Sou a argamassa do amor. Sou o beijo, sou a boca. Beijo molhado de silêncio..."

Claude Bloc disse...

José do Vale,

Nunca fui tão bem entendida em meus propósitos, nos meus escritos. Assim como Socorro em seu poema, conseguiste vislumbrar o sentido mais intrínseco do sentimento que domina este texto e a mim no momento em que o fiz. E para seguir tua linha de pensamento, digo: pensas como homem, mas pressentes minha alma feminina. Dito isto, falei tudo.

Abraço e a emoção de ler tudo de lindo que disseste.

Grata.

Claude