TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

segunda-feira, 16 de março de 2009

O DEBATE SE ENCONTRA NO TEMA ABORTO

Este texto é minha homenagem ao debate. Áqueles que não aceitam passivamente por verdades azeitadas ou grosseiras. Especialmente a dois conterrâneos dos quais tenho muito orgulho de igualmente ser-lhes contemporâneo: José Flávio e Armando Rafael.

A discussão, quer queiramos ou não, envolve a prática do aborto. É nesta perspectiva que evolui, com a contaminação emocional adotada pelo "destemparado" arcebispo. Um retorno: a palavra destemperado que foi grafada entre aspas é para chamar atenção para o seu real valor, aquela que nega a temperança. Num momento errado e com um assunto errado(uma criança estuprada com gravidez gemelar). Mais aprofundou o cisma entre os católicos do que entre ateus, agnósticos ou quem não é religioso e aquele que é. Para estes a atitude do bispo não atinge, mas para ex-católicos, que ainda guardam a raiz de sua cultura, para católicos que estiveram junto à reformas desde Vaticano II, isso foi uma paulada e é o que ocorre.

Por isso, para que não fiquemos num eterno embate dos prós e contras, de "outras visões", vou apresentar frases de um texto de Cândido Mendes, um dos grandes pensadores brasileiros, católico de alta profundidade filosófica e religiosa, irmão de um dos grandes bispos da igreja. Vamos às frases (quem tiver interesse o artigo foi publicado no O Globo no dia de hoje):

a) O título do artigo é Exílio e este se refere à própria instituição Igreja, leiamos a frase no final do artigo: "De toda forma, não é o autoritarismo das repetições que nos leva à frente, mas a densidade da consciência que vai à aposta da fé, e a discernir, como nos assinalou Alceu Amoroso Lima, na maturidade do laicato do país mais católico do globo. Continuaremos a sê-lo, tanto a igreja resista a seu exílio no seio do povo de Deus."

b) Vale ressaltar que Cândido Mendes faz um diálogo entre o código canônico e o que chamou "sinais do tempo a que lhe urgiu o Vaticano II". Pois foi aí que se verificou que "a inoportunidade da palavra pesa, tanto reflita a assintonia com o laicato à sua escuta, e ávido à leitura da esperança no contexto de nossos dias". Neste sentido já não tem peso o acompanhamento das palavras do Dom José pela CNBB e pelo Vaticano pois "o que importa sempre é o nervo da mensagem para um aqui e agora, em que a fé avança com a esperança e, mais que o dogma, vai à consciência, e faz do cristianismo uma religião da liberdade."

c) Vale dizer que este diálogo de Cândido Mendes com os "sinais do tempo" realça a reação negativa da Europa à postura do bispo e lembrou ao autor o mesmo fenômeno da encíclica "Humanae Vitae" de Paulo VI que condenava os anticoncepcionais e que foi desobedecida "por 60% dos católicos do velho mundo".

d)Deste modo Cândido Mendes contextualiza o tema do Exílio desta forma: "A palavra de Dom José via ao extremo oposto de toda reflexão sobre um "aqui e agora" e de toda nova problemática teológica e filosófica dos limites - e das transformações da vida - em que entramos na complexidade inédita de nosso tempo. Ela é nossa como a encarnação".

e) Esta é a contribuição ao debate de um materialista dialético em processo dialógico com as contradições de seu tempo.

3 comentários:

Armando Rafael disse...

Meu caro José do Vale,

(só não digo "Caro Dedé" porque os abortistas estão aplicando o "dom Dedé" ao arcebispo usando o "Dedé" de forma depreciativa e não como carinhosamente sempre tratamos os Josés por quem temos estima)

Louvo a sua transparência e sinceridade.
Você se autodefine como um “materialista dialético em processo dialógico com as contradições do seu tempo”.
Penso que a dialética não é só pensamento: é pensamento e realidade a um só tempo. E entendo que o “dialógico” pressupõe a propositura de um debate, um diálogo, nestes tempos confusos. Aqui entra a realidade. Concisamente.
Todos sabemos que a Igreja Católica não vai abdicar de um de seus princípios internos, oriundo do século I, consolidado numa norma contrária ao aborto – um documento chamado Didaché – que sintetiza: "Não matarás o embrião por aborto e não farás perecer o recém-nascido".
No caso específico do aborto realizado por uma equipe médica em Recife acredito que o fato vem sendo fulanizado – propositadamente – visando aproveitar o fato (que mexe com o emocional das pessoas) com o intuito de popularizar a proposta de aprovação do aborto irrestrito no Brasil. As forças pró-aborto têm em mãos diversas pesquisas que mostram a quase totalidade do povo brasileiro contrário ao aborto. A proposta já foi derrotada duas vezes no Congresso Nacional e custou a eleição de Jandira Feghali ao Senado em 2006. (Ele foi a relatora da proposta).
Melhor momento não poderia ter ocorrido – para o assunto voltar à baila – do que aquele de Recife. Uma criança de 9 anos é abusada pelo amante da relapsa mãe (a imprensa chama “padrasto”) que resulta numa gravidez de gêmeos. A equipe médica faz, à socapa, o aborto após artimanhas de organizações abortistas de Pernambuco.
O arcebispo não excomungou ninguém. Mesmo porque quem pratica ou contribui para um aborto é excomungado automaticamente cfe. Código de Direito Canônico.
Está armado o circo. O grande vilão passa a ser o arcebispo que nem conhecia a menina, sequer sabia o nome dela. Não se fala mais no homem que abusou da menina (a imprensa chama de “estupro” para “legalizar” o aborto cfe. Código Civil), nem na mãe relapso que deixou o amante abusar de duas filhas (a outra é louca), nem na equipe médica que fez o aborto, nem nas organizações abortistas que fizeram o auê.
O culpado de tudo isso? O arcebispo de Recife, dom José Cardoso Sobrinho.
Só isso. O resto é proselitismo.
Esta a minha opinião.
Com elevado apreço e admiração de sempre,
Armando

jflavio disse...

Claro, Armando, que não se fala mais no estruprador. Dedé ( o outro) claramente o inocentou. Excomungou a equipe, a mãe da menina ( e como bom Cristão não é bom julgá-la como vc fez, impondo culpa e não desconhecimento no seu ato) , mas ao estruprador ele mesmo disse que era um crime menor e não passível de excomunhão. Os verdadeiros criminosos eram os médico que cumporiram uma decisão judicial e a mãe. Por que Dedé não teve a coragem de excomungar o juiz que autorizou o aborto ? Se ele não o tivesse feito, não teria se realizado e nosso piedoso bispo poderia celebrar a missa de corpo presente da mãe e dos dois filhos que certamente, claro, iriam diretamente para o céu. Cada vez mais, Armando, ficam do mesmo lado apenas Dedé ( o outro) e você. Dê uma olhadinha nos blogs da vida e vejam quantos católicos , estatisticamente, claro, têm a mesama visão de vcs dois! O Vaticano e a CNBB, é bom lembrar, já correram da reta.

Armando Rafael disse...

José Flávio,
Segui seu conselho. Olhei os blogs.
Nenhuma novidade. Aliás, no ACI-digital está o artigo de Dom Fisichella que foi, inicialmente, mostrado como contrário ao Arcebispo de Recife. Na verdade foi uma interpretação apressada.

A ver:
Dom Rino Fisichella pede que menina submetida a aborto não seja instrumento de propaganda anti-vida

Certa imprensa recolheu o artigo de Dom Fisichella, e o difundiu como uma suposta condenação à excomunhão dos envolvidos no duplo aborto da menina –no que a pequena não teve nenhuma responsabilidade– quando no texto, o Prelado vaticano lembra o mesmo que assinalou o Arcebispo de Recife: "o aborto provocado sempre foi condenado pela lei moral como um ato intrinsecamente mau e este ensinamento permanece imutável em nossos dias dos começos da Igreja".

ROMA, 16 Mar. 09 / 02:27 pm (ACI).- O Presidente da Pontifícia Academia para a Vida, Dom Rino Fisichella, precisou que a menina de 9 anos de idade submetida a um aborto no Brasil, necessitava proteção e cuidado, em lugar de ser convertida em um instrumento da propaganda anti-vida.
No artigo publicado em L'Osservatore Romano, o Arcebispo explica que "Carmen", nome fictício da pequena, "foi violentada repetidamente pelo jovem padrasto, ficou grávida de gêmeos e não terá mais uma vida fácil. A ferida é profunda porque a violência totalmente gratuita a destruiu por dentro e dificilmente lhe permitirá no futuro olhar aos outros com amor".
"No caso de Carmen –prossegue– se encontraram a vida e a morte. Por causa da novíssima idade e das condições de saúde precárias sua vida estava em sério perigo pela gravidez. Como atuar nestes casos? Decisão árdua para o médico e para a mesma lei moral. Decisões como esta, inclusive com uma casuística diferente, repetem-se cotidianamente nas salas de reanimação e a consciência do médico se encontra sozinha consigo mesma no ato de dever decidir que é o melhor por fazer".
Diante destes desafios, diz logo o Arcebispo, "Carmen colocou novamente um caso moral entre os mais delicados" que deve tratar-se com atenção. "Como cada caso singular e concreto, merece ser analisado em sua peculiaridade, sem generalizações" considerando que "a moral católica tem princípios dos que não pode prescindir, inclusive se assim o quiser".
"A defesa da vida humana desde sua concepção pertence a uns destes e se justifica pela sacralidade da existência. De fato, todo ser humano, do primeiro instante leva impressa em si a imagem do Criador, e por isso estamos convencidos que devemos reconhecer a dignidade e os direitos de toda pessoa, considerando antes que todo seu intangibilidade e inviolabilidade", precisa Dom Fisichella.
Certa imprensa recolheu o artigo de Dom Fisichella, e o difundiu como uma suposta condenação à excomunhão dos envolvidos no duplo aborto da menina –no que a pequena não teve nenhuma responsabilidade– quando no texto, o Prelado vaticano lembra o mesmo que assinalou o Arcebispo de Recife: "o aborto provocado sempre foi condenado pela lei moral como um ato intrinsecamente mau e este ensinamento permanece imutável em nossos dias dos começos da Igreja".
O Presidente da Pontifícia Academia para a Vida precisa em seu artigo que "o Concílio Vaticano II na Gaudium et spes –documento de grande abertura sobre o mundo contemporânea– uma de maneira inesperada palavras inequívocas e muito duros contra o aborto direto. A mesma colaboração formal constitui uma culpa grave que, quando é realizada, conduz de modo automático a ficar fora da comunidade cristã. Tecnicamente, o Código de Direito Canônico usa a expressão latae sententiae para indicar que a excomunhão opera imediatamente no momento em que o fato (o aborto) ocorre.