ECO (1984):
"Suspeitar que tudo possa ser possível significa não renunciar a nenhuma pista de indagação, aceitando porém ainda a possibilidade de que, se uma pista parecer boa, as demais possam configurar-se como inúteis. Mas dizer que tudo é possível significa dizer que tudo é verdadeiro, e é verdadeiro tudo junto, a ioga como a física nuclear, a elevação dos poderes psíquicos como a sociedade cibernética, a abolição da propriedade privada e a ascese mística. E esse comportamento não mais se chama curiosidade intelectual, mas sincretismo.
[...] Fique bem claro que, quando Planéte nos recomenda não negligenciar nada daquilo que está acontecendo ao nosso redor, e ficar de olho nos resultados da antropologia, da física, da astronomia, da sociologia ou da teoria da informação, diz coisas santas. Mas ficar de olho não quer dizer juntar e aceitar tudo como válido, como se o trabalho tivesse terminado aí. Quer dizer, ao contrário, começar por esse ponto e ver se, numa nova situação cultural, é de algum modo possível reconstruir de forma crítica uma certa totalidade do saber. A diferença é aquela que existe entre uma soma algébrica e um simples amontoado adicional de elementos heterogêneos: em álgebra (a + b) (a - b) dá (a2 - b2). É uma nova forma construída criticamente e que traduz os dados da primeira. Mas, se eu somar três cavalos, oito conceitos, uma máquina de escrever e uma pílula anticoncepcional, terei sempre três cavalos, oito conceitos, uma máquina de escrever e uma pílula anticoncepcional. De novo não aconteceu nada. Aconteceu apenas que agora acredito ter entendido o mecanismo do real: e ao contrário não o entendi, justamente porque assumi em bloco as coisas como estavam, eu as hipostasiei numa noção fabulosa de "realidade" e não movi um dedo para operar com elas" (p.106-107).
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