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quarta-feira, 8 de junho de 2011

Uma tsunami moral - José do Vale Pinheiro Feitosa

No fluxo da informação aquilo que veio antes envelhece. As notícias, portanto, envelhecem e se vêm perdidas do interesse geral. De qualquer modo ouso retornar a fatos de janeiro deste ano quando trombas de água simultânea arrasaram várias cidades na região Serrana do Estado do Rio de Janeiro.

Conversa com um grupo de pessoas num almoço no Centro do Rio quando um deles revelou que tem uma casa em Itaipava no município de Petrópolis. A localidade cresceu enormemente nos últimos anos, é um lugar sofisticado, da alta burguesia do Rio e das classes médias tradicionais da zona sul da cidade. Bons restaurantes e festas a atraem famosos.

Ele tem uma casa grande numa parte alta de um vale chamado Cuiabá, uma casa de caseiro mais abaixo, além de um grande terreno com várias benfeitorias. Sua casa é virada para o vale, no fundo passando um riacho que já tivera algumas enchentes, tomava as casas das margens, a maioria de empregos das mansões e casarões da redondeza.

Quando a tromba d´água aconteceu o que restou foi a tradução de uma tsunami. Veio dos barrancos altos, arrastando imensos troncos de árvores, caixas d´água, veículos, paredes que a jusante iam matando, destruindo, passando uma borracha nos acidentes de moradias acima do solo escavado.

Foram quarenta anos de observação e nada igual jamais vira. Os corpos das pessoas da região foram encontrados quilômetros depois. A caseira dele e mais uma moça ficaram num debate onde ficar, uma subiu até a casa fechada do patrão para se refugiar e a outra ficou, num ponto afastado do leito do riacho e morreu arrastada pela potência destruidora do dilúvio.

Cessada a destruição veio uma tsunami moral e ética. Os governos estaduais e municipais aplicaram milhões para recuperar o patrimônio privado dos mais ricos. O atendimento de moradia para os pobres ainda hoje se arrasta sem solução. As casas em locais de risco que não foram arrastadas já abrigam os desabrigados daqueles dias.

Numa conversa com outro morador veio a mensagem final deste texto. Agora do leito do riacho foram arrastadas todas as casas dos empregados. O fundo do vale está desocupado e os ricos das encostas agora têm uma visão completa. Como lhe disse outro: agora tua casa se valoriza. Às custas da penúria social.

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