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segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Maria Zélia - José do Vale Pinheiro Feitosa

Minha prima em primeiro grau, mas a chamávamos de tia. Maria Zélia e nem sei qual sobrenome adotou, se Pinheiro, Teles ou Gonçalves e certamente o Pimentel de seu marido Almir. Para um estranho era difícil entender a descendência de Joaquim Pinheiro Bezerra de Meneses.

Não era incomum que a sobrinha fosse mais velha que a tia e assim a tratasse com cuidados e conselhos. Que tios se cassassem com sobrinhas. Que irmãos tivessem a idade de ser pai ou mãe dos irmãos mais novos. A verdade é que Joaquim casou-se três vezes, de todas as mulheres teve numerosa descendência e nenhuma filha do primeiro e do segundo casamento casou-se.

Não estou me desviando do assunto, ao falar de Maria Zélia, que ultrapassando a casa dos noventas anos de idade, ontem faleceu em Crato, onde nasceu e sempre viveu. O sobrinho, José Flávio era seu médico e até bem pouco tempo numa consulta médica a sua acompanhante queria passar as informações ao doutor e Maria Zélia a interrompeu: espere aí, a doente aqui sou eu, sou quem informa.

Qual é o gancho para falar desta consulta médica. Tia Zélia, como a chamamos, sobreviveu a três dos quatro filhos que teve e ao marido. Ao sobreviver, não deixou de viver, não caiu na escuridão de um poço de lamentações e nem no silêncio que parece adormecer o espírito.

E tinha Maria Zélia uma característica que era a antítese de Almir Pimentel. Ela não era dada a exuberâncias de emoções. Respondia às emoções com risos baixos e quando havia o choro por necessidade qualquer, era quase imperceptível, apenas com lágrimas discretas por testemunho.

Como parte desta família intrincada, Maria Zélia deve ter tido, entre verdadeiros e falsos, mais de uma centena de sobrinhos. Mas talvez, nenhum tenha ficado com tanta frequência em sua casa, até mesmo para dormir, como o meu caso. Com idade próxima ao filho mais velho dela, na casa, na mesa e até nos experimentos urbanos como o chuveiro e uma banheira onde esparramei água para o trabalho da tia.

A distância do trem que me levou a Fortaleza e o ônibus até aqui ao Rio não me esqueceram Maria Zélia, mas o contato pessoal se rareou como tudo que nos preencheu a vida em alguma fase dela. Tia Zélia sempre foi uma obrigação de visita, nunca deixei de chegar, mesmo que rapidamente, até o local da casa em que ela estivesse, mesmo quando de mim ela já não se lembrasse mais.

Esta mulher tem a dimensão do longo tempo. O seu irmão mais próximo em idade, Joaquim Pinheiro, que mora no sítio bucanha, na encosta da Chapada, é uma das pessoas que todos nós deveríamos conhecer. Riso amigável, discreto, calado, mas capaz de uma conversação animada e atualizada, porque ele lê regularmente vários jornais e revistas semanais. Assim que retornar ao Crato irei visitá-lo, é outra obrigação que não me furtarei.

Pois bem, a avó de Maria Zélia e Joaquim, teve uma descendência de mulheres que se casaram tão jovem que ela pôde dizer: minha neta dê-me cá a sua neta.

Um comentário:

jflavio disse...

De todas as irmãs de mamãe , Tia Zélia sempre pareceu a mais determinada e de ânimo inquebrantável. Acredito que herdou da sua avó materna : Madrinha Dona que era uma espécie de Federalina cratense. Passou por inúmeras vicissitudes : sobreviveu ao marido e à maior parte dos filhos e nunca se soube de depressão, de ansiedade, de cabeça baixa da Tia Zélia. Despachada nunca precisou de ninguém para tomar as decisões nas horaas certas. Tirante isso era doce e afável, desde que não pisassem nos calinhos dela...Vai deixar saudades!