TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

AS CIDADES VIVIDAS – NOVO EXU

As cidades são corpos com vida. Isso quer dizer que se deslocam, são seres de tempo, possuem sentimentos, guardam relações de afetividade e estranhamentos, além de possuir uma inteligência que compreende as suas coordenadas no universo das relações das coisas em geral

Quando o viajante se aproxima de Novo Exu pelos lados da Chapada do Araripe ou flui contracorrente pelo riacho da Brígida, naquelas jornadas transcendentais pelos afluentes do grande Rio dos Cariris, duas visões ele tem.

Quando no alto da Serra divisa todo o infinito pernambucano até a vista se encabular por tanto espaço, que se dobra na curvatura do planeta, o viajante é tomado pelos espíritos dos Buxixés que dominavam a cordilheira do Araripe. Há uma sensação de vida e morte, uma dualidade de espinho e flor, um que fura e outro que perfuma.

Se pelas trilhas dos rios e riachos, vindos desde as barrancas e ilhas do São Francisco, tem o viajante o espírito desbravador dos desconhecidos, o abrasador sentimento de a tudo sobrepor, em alma e corpo, em catecismos e nas grafotecnias que atormentam a mensagem de futuro. Aquele futuro que pula o tempo, que esgarça a grande narrativa dos povos e cai no buraco do fatiamento da terra em glebas, que produzem para as ondas navegantes dos oceanos.   

Novo Exu tem o sentimento síntese de todas as lutas da divisão da terra, das propriedades das boiadas e do salto qualitativo das relações destas coisas, com a transformação disso tudo em poder político, disputa, morte e vingança. Foi necessário que um cantor das flores dos sertões se aproximasse das miras das armas para dizer: agora é outro tempo, nada mais a mover a morte, nada há para a próxima camisa ensanguentada.

Como todos os seres vivos ela fez escolhas para marcar sua identidade. O Crato é como um burgo medieval, necessita-se dele, mas além de educar os filhos, colocar os excedentes da produção e se abastecer, a mais nada serve como plural. Ainda hoje, o viajante atento, poderá ouvir o ranger de madeira dos velhos “mistos” que saiam da feira do Crato às 13 horas, desembarcava nas ruas de Nova Exu, assim como em Bodocó e se acalmava, nas horas primeiras da noite, em frente a uma pensão em Ouricuri.
Traduza toda a inteligência de Nova Exu no filão da Asa Branca, no rosto de lua de seu Luiz, no banco de conversa no mercado, com o olhar de adivinhação para o talude belíssimo da Chapada do Araripe. Nova Exu surpreende por ser Exu quando é Inxu, por não ser África, nem América, tampouco Europa.

Nova Exu não são seus fonemas. Em verdade é outra névoa a despertar a atenção do viajante. Não é uma esfinge, mas um índio que corre na cordilheira ou que desce com as águas até o grande rio.

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