TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

ROMARIA NO JUAZEIRO - Rio de Janeiro - 1980


Dona Santana, ombro com manta,
Arrasta o pé, na carroceria do Chevrolet,

Sá Santana, Velha mulher,
Canta ladainhas, a tardinha,
Vai até meu Padim.

" Minha vida é um calvário,
A Sapiranga derreteu meus olhos como o sudário,
Foi uma longa estrada, abismos e barreiras,
Uma via crucis, triste e sem brincadeiras
."

O caminhão passa debaixo do arco da santa,
Uma cantoria, passa embalada no carro,
Uma procissão, passa na rua São Pedro,
A multidão, se espalha no Juazeiro.

" Maria, não largue de mim,
Se me perderes, sofrerei mais pedras pelo caminho,
Quero ir na missa, rezar no túmulo dele,
Fazer vigília, subir a estrada do horto
"

Sá Santana, enxergando apenas vultos,
Desfia rosários, semeia orações nos campos sagrados,
Se cansa, passa sede e fome,
Comunga com seu povo.

" Quero do santo da minha devoção,
Força, saúde e a luz dos meus olhos,
Um instante de felicidade,
E o ardor da paixão
."

" Minha humildade, de ombros curvados,
Cabeça coberta, resignação dos fiéis;
Meu sacrifício, a paga da promessa,
Meu santo não se esqueça,
Da pobreza
."

Amanhecia, todos de cara passada,
Bebendo café, comendo tapioca e bolo de milho,
Lavando os olhos, procurando missas,
Casas dos milagres e o caminho do horto.

" Venho nesta subida acompanhar Jesus,
Sofrer sua expiação, o peso de sua cruz,
Nestes momentos, represento cada estação,
Daquilo que sempre fui."

" Minhas chagas aparecem em cada pé,
Meus trapos e sofrimentos em toda fé,
Maria segure meu braço, me guie nas pedras,
Apoie meu cansaço, ajude minhas pernas."


" Aqui cheguei meu Santo,
Tocando tua estátua,
De cima do Juazeiro,
Após o caminho de Cristo."

" Não vejo toda a tua imagem,
Me imagino, quando enxergava,
O Tracoma ainda não me cegara,
E te via no santuário ao lado de Jesus."


" Ele o filho de Deus,
Os olhos azuis, nariz afilado,
Boca arrumada, cabelos e barba,
Longos, brilhantes, castanhos e sedosos."

" Tu meu Santo, tilho do todo poderoso,
Os olhos miudos, baixo e entroncado,
Cabeça chata, sem pescoço, cabelos grisalhos,
Assim como nós, amém
."

O Caminhão parou na frente da casa de Damião,
Sá Santana, ombro com manta,
No canto da cozinha, preencheu sua ausência,
Voltou ao calvário diário.

Dona Santana, se a gente não se lembrasse,
Da tua insignificância, nada de mais aconteceria,
Muito mais importante que o poema,
São as vidas tuas e das Anas, Dianas e Marias.

2 comentários:

socorro moreira disse...

Zé do Vale,

Outro dia estive lendo, sobre a genealogia dos Maias, no Cariri.
Um fato interessante:
"O Cel Maínha(José Francisco Pereira Maia), varão bíblico ,filho do portugues José Pereira Maia e da cratense Maria Isabel da Penha.Varão bíblico,
deixou (74) filhos.Basta salientar que, em uma casa de família onde haviam seis moças , somente escapou, Joaquina Vicência Romana, mãe do sacerdote Cícero Romão Batista.Não seria portanto, lícito, negar-lhe o título de grande incrementador do povoamento da ex-colônia do Sacramento".
(Extraído do livro "Crato do Meu Tempo" de Elpídio de Meneses.
Essa pesquisa foi realizada por mim, em função da curiosidade sobre o meu possível parentesco com o Pe.Cícero.
Sou tataraneta do cara, que teve 9 esposas( em concubinato), (5) das quais eram irmãs da mãe do "Meu Padim".
Minha avó, Ana Amélia Maia de Meneses ,o chamava de tio, e tomava-lhe a bênção.

LUIZ CARLOS SALATIEL disse...

Que poema! Passei minha infância no Juazeiro (com 16 anos é que minha família mudou-se para o Crato). Tenho afinidades e afeto pelos dois núcleos urbanos. São complementares. Quinta-feira passada - durante os festejos que homenageiam a padroeira - fui ao Horto e fiz algumas fotos e gravei cantos de louvor ao Padre Cícero e N.Sra. das Dores. Brevemente disponibilizarei no You Tube e CaririCult.