TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Cultura - ARARIPE-CE promove mostra musical que mistura Música Erudita na Igreja com Forró ao ar livre.


ARARIPE-CE

A cidade de ARARIPE-CE dá exemplo de que a cultura musical ainda sobrevive, extraindo leite de pedra, e que nos remotos rincões desse país ainda é possível produzir-se espetáculos de fazer a Europa sentir inveja!, mas por outro lado, lamentavelmente, em atitude conservadora e tímida, demonstra que Arte ainda é artigo das elites, centrada dentro de uma igreja, e que o povão tem que se contentar com bandas de Forró do lado de fora...

Por Dihelson Mendonça

Em sua segunda edição, a II mostra Brasileira de Música Antiga promovida pelo Instituto Atos e diversas parcerias, foi aberta na última quarta-feira dia 16 de Abril na cidade de Araripe-CE. Serão 5 dias de apresentações musicais com características bastante diversas: Na igreja da Matriz, apresentações de música erudita, como propõe o título da mostra, será centrada na música antiga, medieval, renascentista e início do período barroco, será muito bem representada por alguns dos principais instrumentistas brasileiros, como a soprano Marília Vargas e Silvana Scarinci, que toca um instrumento chamado teorba, o duo Saga Barroca, o quarteto Zabaione Musicale, os mestres da viola da gamba Kristina Augustin e Mário Orlando, o duo Spes, o grupo medieval Cantus Firmus, e até o argentino Pablo Lerner, que reside na Hungria, fará uma apresentação com um instrumento inexistente no Brasil, chamado "viela de roda húngara", dentre outros.

Por outro lado, numa espécie de prêmio de consolação aos que não gostam do gênero, enquanto a mostra promove a música erudita em espetáculos belíssimos dentro da igreja da matriz, do lado de fora, num local chamado "Tapera" ( na verdade, um palco imenso ), acontecerá shows para o povão, com intensas apresentações de BANDAS DE FORRÓ estilo "Fábio Carneirinho", que inclusive está no evento. A pergunta que não quer calar é: "Será que não daria pra realizar uma mostra de música erudita sem ter que apelar para o famigerado forró que através de uma mídia perversa e seu cartel tem tomado TODOS os espaços do Rádio cearense num monopólio sem limites? O que há entre música Erudita e o forró ? E porque então não realizar 2 eventos em épocas separadas ? Segundo o músico, professor da URCA e especialista em música renascentista, medieval e barroca, Lamar Oliveira, o que acontece em Araripe não tem explicação à luz da verdadeira música: "Enquanto se tenta trazer um pouco de cultura musical para o povo, ao mesmo tempo, fornece espaço ( e ao ar livre ), à quase o mesmo tipo de baboseira musical a que estamos acostumados a ouvir nas Rádios FM do Ceará. Lamentável"

Este cronista não poderia concordar mais com o professor Lamar, que com sábias palavras, definiu o evento: "É como tentar unir água e óleo num mesmo recipiente. Dá-se cultura ao povo com uma mão e tira-se com a outra". Mas, por sorte não teremos "Aviões do Forró" e o Felipão com o Forró Moral na II Mostra de Música Antiga de Araripe.
...
...

Mas há também pontos positivos no evento! Embora o espetáculo pelo lado da música erudita tenha se tornado elitizado, desde que centrado dentro de uma igreja, o público presente lá tem sido fiel e considerável, aliás, público muito educado, como seria de esperar pelo gênero musical a que se propõe parte da mostra. Lá estavam reunidos grande parte dos rostos conhecidos de apreciadores da cultura musical da região. Os espetáculos são muito bem organizados, tendo hora bastante definida para começo e término. No seu primeiro dia, A Segunda Mostra Brasileira de Música Antiga apresentou os mestres da viola da gamba Kristina Augustin e Mário Orlando, a soprano Marília Vargas e Silvana Scarinci, e uma bela apresentação da Orquestra Filarmônica de Araripe, composta por crianças, promovida e mantida pelo Instituto Atos, num gesto louvável que certamente vingará em músicos de excelente qualidade no futuro, tendo à frente o emérito Músico e competente Professor DI FREITAS. A noite da estréia culminou ainda com um exótico show do gênio maior da música Brasileira ( e que nada tem a ver também com música antiga ), Hermeto Pascoal, que formando um dueto inusitado e magnífico com sua companheira e musicista Aline Morena, fez um espetáculo de fazer "tirar os pés do chão" literalmente. O show de Hermeto Pascoal e Aline Morena com sua música para além de "erudita" no sentido da complexidade, e ao mesmo tempo moderna, faz parte das novas formações ( atualmente em número de 5 ) que o Hermeto tem realizado mundo afora. No espetáculo, o duo toca diversos instrumentos convencionais como a viola, o piano, o trompete, mas como a sua genialidade permite, Hermeto cria composições aproveitando-se de objetos aparentemente comuns como uma chaleira, bonecos, brinquedos, latas, e até uma piscina infantil dentre outras coisas. Ao final do espetáculo, Hermeto Pascoal decidiu só sair da igreja depois de cumprimentar e atender a todos que quisessem falar com ele. Uma fila imensa foi formada e todos puderam conversar, tomar autógrafos, receber DVDs e brindes. Houve até o caso de uma garota que pediu "qualquer coisa" que a cantora Aline Morena pudesse lhe entregar. Procurando pela sala e não vendo mais o que entregar, Aline lhe doou os seus brincos. Um outro pediu a Hermeto qualquer lembrança que fosse. Os CDs haviam se esgotado e nem havia nada mais. Hermeto não hesitou: Arrancou 3 fios de cabelos da sua barba e entregou ao garoto, que saiu todo contente com o troféu !

O Blog do Crato, ( cujo volume de acessos já ultrapassa mais de 24.000 acessos ao Mês ( e agora multiplica-se este número com a chegada de mais de 22 Sites membros da Rede Blogs do Cariri ), esteve voluntariamente presente ( sem qualquer convite oficial ) na abertura da II Mostra Brasileira de Música Antiga de Araripe, e de lá trazemos inúmeras fotos e entrevistas em vídeo representativas do evento. Que me perdoem os adoradores do Forró, nós passamos ao largo da famosa "tapera", pois afinal de contas, Arte deve ser Arte, e outra coisa é outra coisa, apesar de alguns grupos que se apresentam na "tapera" são muito bem-intencionados e ao meu ver, só estão no evento errado! Na minha opinião, organização de eventos que devem promover a arte devem ser tratados com muito mais seriedade, quando o assunto é formação de platéia para um determinado estilo musical.

Eis algumas fotos do evento:
O.B.S - Foram produzidas na data, aproximadamente 400 fotos. As pessoas fotografadas que desejarem as fotos devem procurar lá no Blog do Crato, www.blogdocrato.com escrevendo comentários, que na medida do possível eu colocarei à disposição para download.

Abaixo: foto da cantora lírica Marília Vargas:

E Silvana Scarinci, na teorba:


Mário Orlando e sua Viola da Gamba:

Abaixo: foto de Kristina Augustin:


Instrumentos exóticos desfilam diante de todos com sons incríveis:

O clima é de elevação, de cultura e Arte. As estátuas parecem escutar o som produzido pelos alaúdes:

Enfim, a orquestra Filarmônica de Araripe se apresenta:


As crianças da filarmônica ensaiam para sua apresentação:


O Maestro Di Freitas rege a filarmônica de Araripe:


"Do facão à colherinha, tudo é coisa musical" - como já diz a música do Guinga, os instrumentos de Hermeto Pascoal:


O grande Gênio dá um show no seu primeiro instrumento: "O fole de 8 baixos":


A incrível Aline Morena desfila talento e prova porque merece estar ao lado do mestre Hermeto:E a noite segue, com muita alegria e musicalidade:


Os espectadores entram numa espécie de transe, levados pela música de Hermeto:


As mãos mágicas de um dos grandes gênios da Música desde Beethoven e Mozart:


E aqui, uma pequena recordação, durante à tarde, dois velhos amigos que se reencontram e conversam sobre música:


Salve, grande Hermeto Pascoal !

Fotos: Dihelson Mendonça
.

8 comentários:

LUIZ CARLOS SALATIEL disse...

É bom deixar claro que todo o enfrentamento da Mostra de Música Antiga se dá pela vontade e entusiasmo do Elissandro, do Instituto Atos, e do maestro Di Freitas. Percebe-se que a pior parte deve ter recebido o patrocínio do poder público municipal: as bandas de forró, cachaça e bundinhas na garrafa.
Parabés ao Instituto Atos, Elissandro, Di Freitas e a criançada do Araripe que faz a Orquestra Filarmônica!

Dihelson Mendonça disse...

Apesar da quantidade de gente que tem alguma mágoa do Elissandro e de seu comportamento duvidoso ( No ano passado, por exemplo, comigo, ele me fez entrar em contato com uma dúzia dos principais músicos do Brasil para um evento, todo mundo se preparou, cancelou contratos para poder assumir para Araripe, e perto da data o Elissandro saiu adiando e cancelando tudo de modo que eu fiquei com a cara de tacho perante os contactados ), além de outras mazelas que muita gente conhece e sabe, como a falta de pagamentos ainda do festival passado, cancelamento de shows de gente que já estava em Araripe ( Como o importante grupo MARIMBANDA que teve o seu show cancelado no DIA do evento ( putz ), o principal grupo instrumental do Ceará não quer nem ouvir a palavra Araripe mencionada ), temos que reconhecer que Elissandro é o enfrentante do Festival, quer paguem os artistas ou não. Esses problemas do Elissandro devem guiar todos aqueles que se aventurem a promover Festivais e coisas do gênero, de que só se deve contratar pessoas com o dinheiro já em conta, pra não cair em descrédito perante a opinião pública. Pois os contratados e os contactados não querem saber no fim das contas se o dinheiro faltou porque patrocinador A ou B não chegou junto na hora H. É preciso ao organizador de RESPONSABILIDADE não contar com o ovo no C.... da galinha antes do evento. Pé-no-chão é a palavra de ordem.

No Crato antigamente existia umas coisas absurdas do tipo festivais em que se pagam PRIMEIRO as atrações de fora com antecedência e 1 mês depois, os artistas locais irem receber a miséria do pagamento lá na portinhola da prefeitura depois dos famosos "empenhos"...

O Crato bem que poderia promover um Festival desse tipo, não necessariamente de Música Antiga, mas do mesmo nível. Prefeituras de cidades pequenas só raciocinam em termos de Bundinhas na garrafa, porque é isso que o povo está acostumado a comer das mãos da mídia. E a mídia já come das mãos do Cartel de Fortaleza.

Enquanto não houver muitas iniciativas como essas, e talvez de forma independente do poder público, o povo se alimentará do Monopólio das Bundinhas de Garrafa. É preciso um enfrentamento por parte das cabeças pensantes em querer fazer.

Quem sabe um dia nós teremos no Crato um prefeito ARTISTA ?

Abraços,

Dihelson Mendonça

Carlos Rafael Dias disse...

Dihelson,

A música do mestre Hermeto Pascoal não é antiga nem moderna, - é eterna!

Bela reportagem. Deu pra compensar um pouco não ter podido ir.

Dihelson Mendonça disse...

Pois é, Rafa,
O Hermeto possui uma energia sei lá o que é, quando ele sobe no palco, vc nao tem a menor idéia do que vai acontecer. Só que do primeiro som ao último, uma aura de magia encanta o ambiente, e você sente que existe algo que transcende o mundo visível. E que as coisas comuns como bonecos, pedaços de madeira, chaleiras ganham vida própria ao toque dele, e que depois dele, voltam a ser apenas bonecos e chaleiras. Isso é muito estranho. É como se ele soubesse coisas invisíveis. Quando ele toca o piano, eu conheço todos os acordes, e o que ele faz é o que minha mente mais absoluta gostaria de fazer, no entanto meu corpo não segue o desejo desse espírito, só algumas vezes de muita inspiração, embora o meu espírito possa compreender. Eu toquei ontem um pouco pra ele de novo e ele gostou e disse para Aline: "Olha, bem ( Aline ), como ele ( dihelson ) toca bem. Você ouviu os acordes dele? " - Poxa, Eu fiquei encantado com esse comentário, porque eu nem estava tocando pra valer, so estava testando o instrumento. Ele falou que vai fazer uma participação no meu CD e elogiou a temática "A Busca da Perfeição" também, disse que o título é lindo, basta eu enviar pra lá que ele faz.

Abraços,

Dihelson Mendonça

Carlos Rafael Dias disse...

Pois é, Dihelson,

através de sua matéria, relembrei a apresentação que Hermeto & Banda fizeram no segundo dia do CHAMA (Festival Musical Chapada do Aaripe), no antigo aeroporto do Crato, na Serra do Araripe, em maio de 1994.
Naquela noite de sábado, muito fria, por sinal, interpretei a música Serpentes na Noite, minha e de Geraldo Urano, classificada que foi praquela segunda eliminatória do festival.
Abrimos a noite e Hermeto a fechou. Você ainda fez uma participação na nossa música, lembra...
Naquela ínesquecível noite, dividimos a área reservada em frente ao camarote de Hermeto com os músicos de sua banda, principalmente com Itiberê Zwarg, baixista; Márcio Bahia, bateria, e o saxofonista, também flautista, que, infelizmente, não lembro do nome agora.
Sobre Hermeto, lembro dele descendo o palco. Aproximei-me dele e Rosângela pediu pra tocar em sua barba.
Ele consentiu, dizendo "toque, minha filha, toque..."

Salve, Hermeto!

Dihelson Mendonça disse...

Rafa,

Foi bom vocêw trazer essas recordações de 1994, pois eu nao me lembrava mais. Lmbro-me apenas que o Festival CHAMA foi realizado em plena chapada do Araripe. Mas tem muitas, muitas coisas mesmo que eu me esqueci. Lembro-me que a fila de carros era imensa, e que eu tocava na banda oficial do festival que acompanhava os concorrentes. Teve gente que deu um trabalho... não sei se foi lá que Aparecida Silvino ganhou o primeiro lugar e a música de Pachelly interpretada por Lia Chaves ganhou segundo, ou se foi na quadra bicentenário... Bons tempos... O Demontier como sempre deu um trabalho...ah isso eu me lembro...

Abraços!

Carlos Rafael Dias disse...

A música vencedora do Chama em cima da Serra foi a Aparecida Silvino, sim. Não lembro da música do Pachelly. Cacheado, que Deus o tenha, foi o nosso baterista. Lembro dele conversando com o Márcio Bahia. Sobre aquela noite, escrevi um artigo que postei neste blog. Vou resgatá-lo e publicar dessa vez no blog de Geraldo Urano, pois o tema central é a música que defendemos no Chama, uma parceria minha e dele.

apá silvino disse...

Oh coisa boa ler esse blog.
mas olha gente. O chama em que a música do Silvino meu irmão ganhou o primeiro lugar foi na quadra no Crato mesmo. Lá em cima na Chapada, no ano seguinte, acho que 2006, a música da gente tirou o 3º lugar e eu decididamente não peguei o melhor intérprete. mas lembro com todo carinho o respeito e a dedicação da banda do festival. Bom demais aquele tempo. Obrigada Dielson! Boas lembranças meeeeesmo!
beijos em todos e parabéns ao Salatiel pelo prêmio de melhor interprete no festival desse ano. meu irmão me contou hoje!
apá