TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE
domingo, 25 de maio de 2008
Ode aos odres de vinho
o vinho inquieto na taça
espera ser sorvido de uma vez
pra virar embriaguez e transformar-se
em sonho, puro delírio
sem mistura, off the rock
meu vinho, devaneio puro
onde encontro verdades
e atraco o navio
e desço em terras estranhas
percorrendo caminhos
já percorridos
meu vinho, hoje bebo-te
e por ti sou bebido
e me banho no mare nostrum
grande lago romano
autopista dos antigos
termas dos deuses
de baco a dionísio
e de ninfas nuas
brincando no bosque
ao lusco-fusco
éramos índios e bebíamos cauim
hoje estamos fartos da aridez
bendita a sede dos alcoólatras
que não suja o chão
com os restos que regurgitam
das entranhas
é bom pro coração
tanto quanto pro mercado
de tavernas escuras e mal-cheirosas
que abrigam os andarilhos
perdidos na noite
muito tempo ainda pra aurora
mas bem próximo da meia-noite
na calada dos becos e suas latas de lixo
onde os mendigos aproveitam
as valiosas horas de sono
minha mulher saiu com as crianças
e foram às compras
mas me deixou de presente
uma garrafa do precioso líquido
é muita generosidade
pra quem odeia sangue
sábado é um bom dia
para embebedar-se e lembrar
daquelas heróicas campanhas no saara
batalhas imbatíveis pras legiões urbanas
É sempre bom ter uma caneca e uma faca amolada
estou só em casa
mas não estou mais sóbrio
contabilizo os demônios em volta
conferindo pra saber quem é maioria
se somos eu e os deuses
ou eles
bebo numa taça de cristal
as contas são medonhas
ainda tem a música
a fiel companheira
o par perfeito para a percepção alterada
e ainda tem uma lapiseira
de sangue vermelho na veia
como tinteiro
e que o último gole da rodada
não seja o derradeiro
ou que tenha bebedeira
no lugar incerto
e que a última certeza
seja o único conforto
dos compulsórios e inveterados
deodatos
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3 comentários:
Fantástico !
Alguém beliscou, de leve, mas beliscou a cintura dos poetas. Pronto. Nunca se viu tanta poesia no Cariricult. O poetas abriram seus textos guardados, seus peitos calados, suas almas sonolentas. Venham ler. Estão todos na praça, na Praça Siqueira Campos, na Praça da Sé, na frente da Estação, da Cruz até o Pimenta. Os poetas abriram suas odres de vinho e estão despejando-as no mosaico pisado das nossas vidas.
Isso é bom demais.
Tem nada melhor do que contariar a ordem dos ricos empobrecidos de informação. Nada melhor do que a poesia. É isso aí, cara, pé até embaixo, que é pra ver a paisagem passar depressa e ficar na mente, construindo lembranças diversas.
vlw
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