TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Fim de Férias

Não passo de uma farsa.
Meu limite é a canalhice.
A seringa chorava um pouquinho de cianureto.
E eu não quis deixar nódoa no antebraço.
Paspalho. Sempre coberto de atenções e cuidados.
Soberbo, isto que sou.
Minha coragem anda foragida.
Ainda tento cuspir em quem bem mais altivo me ouve.
Presto nem pra cortar a mangueirinha do gás
e dar um último teco. Ridículo.
Ego poético é uma praga.
Não sou outra coisa senão peão.
Matador de larvas de mosquito.
Escada no ombro,
bolsa no outro.
Bom dia, senhor.
Boa tarde, senhora.
Secretaria Municipal de Saúde.
Ainda suponho ser o maioral quando escrevo.
Maioral de fossa e de lixo.
Não passo de um falastrão.
Meu limite é a tolice.
Bom dia, senhor.
Boa tarde, senhora.
O sol me espera
e as caixas d'água gorjeiam.

4 comentários:

José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

Pois é grande poeta e o pior é que este mosquito não é uma farsa. Que a coragem de dizer não é uma farsa. Que um dia inteiro para sobreviver não é uma farsa. Como não é uma farsa vencer as barras do tempo pelo amor, nos projetando no futuro através das crias. E ainda exalta-se de prazer.

Mas tem farsa rodando nossas vidas. A farsa da qualidade é uma das maiores que existe, pois é comércio. A farsa narcísica que esfuma a nossa linda carcaça. A farsa dos sentimentos, que brotam na linha com frases de efeitos.

Por fim senhor poeta, termine suas férias, mas jamais se deixe apanhar pela farsa do sucesso. Pois nele é que se encontra o verdadeiro apartar-se de si mesmo, o suicídio de si, o morto vivo em holofotes de mapear mosquito, moscas e baratas.

Carlos Rafael Dias disse...

O poeta também sente fome
E exala cheiro de fossa
E aroma de flores
Tem estômago
Pra comer ou regurgitar
Passa fome ou saboreia uva
A milanesa com mel
E quando vomita
É puro fel

Marta F. disse...

Parabéns Domingos, um texto tecnicamente autobiográfico, de uma honestidade contundente. Tuas tentativas sucessivas em poesia redundam no aprimoramento, para deleite de quem lê. Parabéns, poeta.
Um abraço.

Marcos Vinícius Leonel disse...

Beleza, poeta, como sempre atuante, volto a dizer, ler você para mim é obrigatório, visceralmente sincero são seus versos.
abraços