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quarta-feira, 8 de abril de 2009

Barbara, que barbaridades...

Por - Hugo Esmeraldo Sobreira - Cratense

Por que lutavam os rebeldes de 1817 e 1824? Seriam realmente guerreiros da liberdade? Que liberdade era aquela? Que liberalismo era aquele? Tentemos.

A luta renhida entre o localismo e o centralismo atravessou o primeiro século do Brasil apartado. Senhores locais vindos das mais profundas raízes formadoras de nossa sociedade ansiavam por ter enfim, definitiva e legitimamente, as rédeas de seus terreiros. Eis os que se diziam liberais naqueles tempos. Mas o imperador lhes barrou o plano. Fez-lhes engolir o Quarto Poder: Moderador. Na prática, a absolutização da Pátria recém-nascida. Gritos liberais então tentaram não engasgar. Mas liberais o quanto? Suficientemente ao ponto de um Rousseau? Não! Jamais! Nunca a loucura de um sufrágio universal! Nem pensar em libertação de escravos! Nem imaginar a divisão da terra! A questão era bem mais simples: fatias de poder mais bem repartidas. E só. Piegas, simplória, lugar-comum a luta desses “heróis”: aferrar seu poder incontestável sobre pobres quinhões regionais nordestinos.

Mas a História também se faz de mitos. D. Bárbara de Alencar, legítima representante da aristocracia latifundiária escravista. Não! Perdoem-me! Legítima heroína da liberdade nacional! Uma cidade se faz com gente... gente que se reconhece num mesmo processo formador. É preciso ter História para se ter identidade. Ela, um dos fundamentos da identidade da elite intelectual cratense.

D. Bárbara foi muito mais uma mãe ciosa de suas crias do que mesmo uma lutadora consciente de sua prática política. Foi assim, uma matrona, “coronela”, sra. de escravos e de largas terras. Saiu à luta não como uma musa republicana de bandeira em punho, mas muito mais para proteger os interesses “liberais” da época, meramente localistas e particularistas. Na aventura em que se viu levada acabou caindo em desgraça, ela e sua família. Perderam terras, posição social, a própria vida até. Parentes foram perseguidos ainda por décadas. José de Alencar, pai do escritor, filho da mãe “heroína”, vergonhosamente se salva ao pedir perdão ao imperador. Verá os picos do poder no Império brasileiro: governador do Ceará, senador vitalício... Bem se vê tamanha a convicção política dos “heróis” liberais.

É com tristeza que ainda vejo se repetir, pleno século XXI, práticas culturais e intelectuais dignas dos salões aristocráticos. Tecem-se elogios, erguem-se memoriais, textos, imagens, sons... Tudo a fim de perpetuar uma grande mentira, a mentira dos heróis. Há muito sabemos que os heróis não existem, nada significam, em se tratando da verdade humana, a vida humana real. Se olhássemos o passado com os olhos de então, veríamos. Aqueles homens e mulheres não foram heróis, não poderiam sê-lo. Não foram além! Não foram verdeiramente revolucionários. Como seriam? Se eram latifundiários? Se eram escravocratas? Se eram da parcela proprietária detentora do poder? Não os acuso de nada. Não os julgo. Apenas tento aqui ser um pouco (ou um tanto?) iconoclasta, porque é preciso ser iconoclasta. Os ícones encobrem, mascaram, enganam. Personagens irreais criados e recriados em épocas e épocas. Chega de heróis. Precisamos de gente. Gente lúcida, livre, consciente.

11 comentários:

Armando Rafael disse...

Caro Hugo Esmeraldo Sobreira:

Primeiro, faço questão de reconhecer que o seu escrito é sério, de alto nível, isento e contribui para a discussão sobre o episódio libertário que passou à história como "a Revolução Pernambucana de 1817, na cidade de Crato";

Segundo, gostaria de ponderar que na História, ao julgarmos um fato, temos de recuar à mentalidade e ambiente na qual ele ocorreu. Nunca julgar pelos padrões de hoje com sói acontecer com os historiadores marxistas. No século XIX era comum (e aceito por todos como normal) a escravidão negra, embora pelos padrões de hoje a escravidão seja um absurdo indefensável;

Terceiro, poder-se-ia, ainda, argumentar que a participação de Dona Bárbara, nesse episódio, se restringiu ao amor maternal da respeitável matrona, em apoiar os filhos na aventura revolucionária. Entretanto - como afirmei acima - não podemos julgar o comportamento de Dona Bárbara, que viveu entre os séculos XVIII e XIX, pelos padrões atuais. Naquele tempo as pessoas do sexo feminino tinham ações circunscritas ao ambiente do lar, diferente de hoje quando as mulheres conquistaram espaço para influir no destino da sociedade.

ora, a simples prisão da matriarca dos Alencares, por motivos políticos, já configura uma quebra de paradigma, para os padrões da época.

Aliás, por sua participação política, Dona Bárbara foi vítima até de acusações contra sua honra (e ao que tudo indica, infundadas) que continuaram a ser difundidas pelos anos afora. Sabe-se que dona Bárbara de Alencar era uma mulher, por vezes, sangüínea e nervosa, mas dotada de religiosidade além de correta nas suas atitudes. Um descendente dela, José Carvalho, acerca dessas acusações, escreveu: “Dona Bárbara foi sempre uma mulher de costumes rigorosamente austeros; foi essa a notícia conservada no seio da família, D. Luísa, que sempre conviveu com D. Bárbara, foi durante toda a vida, no seio da família, uma calorosa defensora das virtudes de sua sogra. Tão escrupulosa era ela em motivos de honra e de moralidade que não admitia um só escravo amasiado...”

Por último, esclareço ao caro historiador que faço esses comentários apenas por amor á verdade (Politicamente, sou monarquista, o que até justificaria minha omissão este debate)Mas sou defensor do postulado de Enzo Faletto: "A responsabilidade do intelectual é com a verdade".

Parabéns por seu trabalho.

Anônimo disse...

Coerente com a historiografia, a acadêmica, que(à exceção dos poucos positivistas existentes) há muito tenta escapar desse "vício" que é formar ou levantar heróis de determinadas sociedades. Foi assim na Europa do século XIX, foi assim aqui, será sempre em qualquer lugar. De fato, a citada personagem não pode ser descontextualizada de seu tempo, ao mesmo tempo que seria piegas, também, julgá-la. Porém o autor não faz isso, tentou apenas inscrevê-la dentro do que conhecemos como uma criticidade histórica que, longe de aceitar os fatos como algo dado, tem em mente que figuras históricas são construídas de forma nada inocente.

Isso vale pra quelquer um: padre Cícero, Zumbi, Getúlio Vargas, futuramente Obama, Lula e por aí vai. A lista é, claro, sem fim, assim como o é também a História e seus debates. esse aqui tem que dar uma boa discussão.

João Ludgero Sobreira Neto Ludgero disse...

Colegas,como tenho postado em alguns textos anteriores, temos erguido estátuas e monumentos a pessoas comuns que se tornaram mitos por força de uma ELITE, que resiste em se perpetuar através de uma História escrita e divulgada por ela mesma, e o pior que existe um monte ou uma ruma que no "passado" eram os meninos do terrero, e que hoje defendem os que lhe chibatearam!

Armando, e Aristides, aproveito para parabenizar as intervenções coerentes e alimentadas pela de razão.

Armando, este que escreveu este pequeno texto é neto de João Sobreira também, filho de Antonieta colega de sala de seu irmão Carlos Rafael no curso de história, que ela e nós admirimos muito. Acho que esta na veia de nossas famílias debater, dialogar, conversar, discodar, mas sempre na buca da verdade.

Saudações Geográficas!
João Ludgero

Dihelson Mendonça disse...

Esse Artigo é a mais deslavada MENTIRA e uma grande Injustiça que alguém poderia escrever.

Prezado Armando Rafael,

Como sempre, sua atitute corretíssima, sua escrita impecável, vem para jogar um balde água fria nesse infeliz artigo escrito pelo Professor Hugo Sobreira.

Como bem diz Armando Rafael, a quem eu reputo como o maior pesquisador e historiador do Cariri, pelo seu minucioso empenho dos DETALHES. Ah! Detalhes, isso transforma homens em gênios! e faz toda a diferença. Nada também, como a experiência de uma vida.

Como bem diz Armando Rafael através das inúmeras postagens que sempre acompanhei sobre a Monarquia e o período monárquico, uma coisa eu aprendi, e irei perpetuar aonde eu chegar: É que muitas vezes a história é contada para a conveniência. Assim, os méritos dos pré-republicanos foram esquecidos, fala-se sempre mal da coroa e dos "inimigos" da república.

Da mesma forma, muitos escritos foram feitos de forma inverídica, por aqueles que não eram partidários das idéias de Dona Bárbara de Alencar e seus dois filhos. Até o próprio Armando Rafael, que é contrário à república e suas mazelas, reconhece o papel dentro do contexto histórico que teve a Insurreição de 1817, e os fatos por ele minuciosamente pesquisados.

Negar o mérito e a altivez de Dona Bárbara de Alencar e seus filhos é um grande equívoco que se comete e soma-se ainda mais ao DESCASO, à Omissão e à covardia que sempre norteou os inimigos de Dona Bárbara de Alencar e que pelo jeito, se perpetuam ainda hoje.

Mulher injustiçada, fadada a ser esquecida pela história, por uma cidade que teve o demérito de destruir até a casa onde ela morou, que não soube lhe dar o valor merecido. Quem sabe quantos dos vivos ainda estão por trás dessas ações de negação dos louvores e conquistas dela apenas pela vaidade de se contrapor ao movimento justo de resgate dos heróis de 1817 ? Que motivos tão mesquinhos jazem nas profundidades desse texto escrito pelo Sr. Hugo Sobreira, que ousa dirigir o cuspo à imagem sempre altiva de Dona Bárbara de Alencar ?

O certo é que, além de descontextualizar o personagem dentro da sua época, o que revela um profundo amadorismo dentro da análise histórica, e causa estarrecimento até para os leigos no assunto, é pertinente também que os grandes que ousaram pegar nas armas para defender os seus ideais possuem seus méritos, e a Insurreição de 1817 foi um marco par a história dessa região e para o que viria a ser o futuro do Brasil. Portanto, dentro daquilo que li e pesquisei, através de inúmeras fontes muito mais fidedignas que essas que o Sr. Hugo Sobreira nos traz, prefiro aceitar os primeiros. Não por se tratar da criação de heróis, pois minha índole é mais iconoclasta, mas pelo bem daquilo que considero a verdade dos fatos.

Ao ver toda a luta de Dona Bárbara de Alencar e seus dois filhos achincalhados dessa forma, só nos causa tristeza e revolta, por ver que aqueles com quem ela tanto lutou, ainda se perpetuam e propagam através das idéias doentias das mentes mais mesquinhas, o seu direito à verdade e ao reconhecimento por alguém que lutou com bravura no Nordeste, numa realidade que era totalmente alheia a seu tempo e à sua condição.

O que propõe o Sr. Hugo Sobreira é matar 2 vezes os libertários Bárbara de Alencar e seus dois filhos. Cometer mais essa atrocidade dentre muitas que já foram cometidas aos que procuraram fazer alguma coisa por esse Brasil.

Portanto, diante dos fatos, eu refuto esse artigo escrito pelo Sr Hugo Sobreira como a mais deslavada MENTIRA que alguém embasado igualmente em dados mentirosos e covardes poderia vir a escrever.

Aos partidários da verdade, Dona Bárbara de Alencar e seus dois filhos sempre reinarão de forma soberana e altiva nos corações libertários daqueles que lutaram e deram seu sangue pela insurreição de 1817 e que movidos dentro de um contexto de insurreições advindos desde a Revolução Francesa e Americana cujas idéias de liberdade e igualdade ainda se propagavam pelo mundo.

"Os verdadeiros heróis não são aqueles que salvam o mundo, mas sim aqueles que fazem com que valha a pena salvá-lo."

Dihelson Mendonça

Hugo Sobreira disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Hugo Sobreira disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Dihelson Mendonça disse...

Professor Hugo Sobreira,

Meu Prezado professor, da minha parte, não há qualquer desrespeito à sua pessoa! Há apenas uma discordância de idéias, o que é muito natural. Já não posso falar pelos outros mencionados na sua postagem.

Nós temos nos deparado com um problema CRÔNICO nos Blogs do Cariri com esse tipo de coisa. Algumas pessoas não suportam ver suas idéias confrontadas e acham que isso foi uma agressão de nível pessoal. É um absurdo! A convivência na Internet depende muito de saber debater e saber até que ponto a outra pessoa está atacando as idéias.

Meu nobre professor, eu posso lhe assegurar que eu não tenho a mínima intenção de atacá-lo, e muito menos de desrespeitá-lo, pois nem o conheço direito. Qual motivo eu teria para tamanha estupidez ? Pense aí um pouco! Eu creio que o Sr. esteja se sentindo aviltado simplesmente pelo fato de que sua idéia contrária ao pensamento geral acerca de Bárbara de Alencar não foi aceita pela quantidade de pessoas que esperava, mas saiba que isso é normal no convívio virtual.

Quantas vezes eu sou atacado diretamente, meu caro Hugo, quantas vezes as pessoas deixam de agredir as idéias e passam a agredir as pessoas ? Para o Sr. ter uma idéia, outro dia em discussão, um sujeito ficou com tanta raiva de mim, que me ameaçou cortar meus dedos! Isso é obviamente, um absurdo, porque eu acho que se deve atacar as idéias, e não as pessoas.

Se o Sr. foi ultrajado, certamente que não foi por mim! Eu sei muito bem distinguir o ultraje da idéia do ultraje do ser que posta a idéia através da minha convivência.

Agora veja só o que o Sr. Acabou de dizer aí no seu texto inflamado com o nosso colega George Macário:

Nas suas palavras:

"INSTITUTO CULTURAL seja presidido por um inapto completo. Esse George Macário, filho de uma personagem das mais nefastas à história dessa urbe. Cidadão, recolha-se!"

Quer dizer, isso aí professor, fez você perder completamente a sua razão, pois ninguém aqui por exemplo atacou seus queridos pais. O Sr. apelou quando viu que seus argumentos não convenceram, para a baixaria, e eu sei que não é do seu feitio, e que o Sr. não está no seu estado normal, pois sua índole não me parece ser essa de atacar até os pais das pessoas quando vê seus argumentos confrontados.

Imagine o Sr. se estivesse combatendo com advogados criminais o que se poderia esperar?

Nesses casos, quando os ânimos estão assim acirrados, eu só peço que os lados ESFRIEM A CABEÇA. Não escrevam sob o ímpeto, porque depois se arrependerão. Agora só falta o George Macário vir de lá e xingar a sua digníssima mãe, o que seria uma retribuição, o que seria o óbvio, e estaríamos então com uma grande confusão que bem poderia ter sido evitada. Certo ? Pense bem!

Por isso, eu só peço uma coisa:
CALMA! - Calma que as idéias podem brigar, mas as pessoas não precisam. Não se preocupem se suas idéias são atacadas. Não há unanimidade nesses assuntos.

Abraços,

Dihelson Mendonça

Antonio Alves de Morais disse...

Hugo Esmeraldo Sobreira.

A demagogia politica é capaz de tudo. Já estive em eventos como convenção de partidos politicos, convenção para lançamento de candidaturas, comicios e outros movimentos da cidade do Crato. Nada acontece sem o interesse de tirar proveito ou para agradar a alguem. Em epocas recentes, houve candidatos e candidatas, do Crato, que antes mesmo de se apresentarem para o grande publico já estufavam o peito, encaravam a plateia e diziam ao microfone: Eu sou descendente da Barbara de Alencar. Como o Crato, hoje em dia, não tem um filho da terra, na Assembleia Estadual, Camara Federal ou senado, (o deputado Ely Aguiar teve uma boa votação,mas não seria eleito só com a votação do Crato e tambem não é descendente de Barbara), estou convencido que o Seminario, a Batateira, O Barro Vermelho, o Muriti,a Grota, emfim o Crato não está tomando suas decisões politicas com base no que foi ou deixou de ser Dona Barbara de Alencar. Não sei se por conviniencias os debatedores se aborrecem um pouco quando suas ideis não são consenso, quando não há unanimidade em torno delas e partem para a agressão pessoal. Não observam que a melhor maneira que temos de fazer a defesa de nossas ideias é justamente respeitando as ideias dos outros. De tanto ver imposições de ideias e agressões eu deixei de levar a minha sengela opinião, até porque sei que ela não vale nada.

Um Abraço Rajalegrense.

A. Morais

Unknown disse...

Só um comentário. Não é verdade que todos achavam "normal" a escravidão.
Isso sim é fraude histórica.

João Ludgero, dê meus parabéns ao Hugo, que saiu da mesmice de glorificação dos vultos da História.

À Dona Bárbara de Alencar, só posso dizer que foi lutadora sim, defendeu seus ideais. Parabéns a ela por isso.

Aos escravos que inclusive fizeram quilombos na região, minhas maiores deferências!

Dihelson Mendonça disse...

Nota:

O professor Hugo Sobreira pediu-me para apagar os últimos comentários no Blog do Crato pois reconheceu que colocando os nomes do pai do outro debatedor, Humberto Macário em jogo não era boa política. Realmente, estávamos passando dos limites das idéias e indo para um campo totalmente pessoal e infrutífro. Quando o assunto é internet, a gente precisa relevar muita coisa, pois muitas são escritas no calor da discussão.

Da mesma forma, deletei o comentário de resposta vinda do Presidente da Fundação J. de Figueiredo Filho, que procura enaltecer o papel de Dona Bárbara de Alencar, por achar que também foi escrito no calor da discussão, permanecendo aonde estávamos antes de envolver as questões das famílias dos colegas.

Assim sendo, espero que possamos voltar à discussão de tão polêmico tema, em que as idéias certamente serão conflitantes, mas como somos uma família, assim os considero, JAMAIS devemos partir para assuntos meramente pessoais.

Abraços,

Dihelson Mendonça

Unknown disse...

É isso aí. A História se escreve com argumentação e contra-argumentação.

Parabéns.