TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quinta-feira, 16 de abril de 2009

A República é Nossa - Por: Oscar Araripe

Matéria Publicada no Blog do Crato


Muito devem a Independência e a República ao Ceará. E muito o Ceará ao próprio Ceará, pois só agora se faz a revisão que há de nos colocar melhor na História. Aqui se viveu não só a primeira mas a mais bela República. No entanto, ainda se nega a primazia das idéias republicanas de Quixeramobim e do Crato, e ainda não se reconhece inteiramente, de fato e de direito, o animoso Tristão de Alencar Araripe como o Primeiro Presidente republicano do Brasil. Nem mesmo nas ruas e nos livros o nome de Tristão é assinalado corretamente, faltando-lhe quase sempre o nome de escolha, o Araripe brasílico. Enquanto isto, o de Costa Barros, por exemplo, sangrento facínora, pois mandou fuzilar vários heróis quando já nem era necessário, ostenta completo e correto pelas ruas de nossas cidades, embora poucos se dêem conta. É como se Silvério dos Reis fosse homenageado e Tiradentes tivesse seu nome surrupiado...

Contudo, a História vai contando novas histórias, agora de baixo para cima, e já se reconhece em Bárbara de Alencar a Mãe da Independência e da República do Brasil. Mas, ainda que na Galeria dos Presidentes cearenses, no hall do Plenário da Assembléia do Estado, no texto do retrato do Conselheiro Tristão, filho do herói, possa se ler ter sido Tristão Araripe o Primeiro Presidente da República da Confederação do Equador, ainda não se aceita inteiramente ter sido a Confederação nossa primeira República, o que é um absurdo. Mas por que tanta demora? Tanta resistência em se ver o Ceará como o berço de tais conquistas? Sabe-se do mau hábito de negar-se ao talento e à extração popular, à espontaneidade, a autoria dos fatos históricos. Nossa Independência, assim, teria sido uma benesse do Imperador e nosso primeiro presidente republicano tinha que ser de alta patente, e não um animoso herói do Cariri, de liderança inconteste, que levantava um cavalo com uma das mãos, que recusou o exílio e que tinha a consciência do porvir. Diz-se que a mídia pernambucana, mais eficiente, talvez até soberana à época, seria também responsável pela versão pouco cearense dos episódios de 17 e 24, e iria impregnar e nortear as publicações cearenses e do país, e que as perseguições que se seguiram à débâcle republicana acabariam por imprimir na nossa alma a desimportância da nossa participação, ao nos quebrar a estima. Sabe-se que quase 500 revolucionários participaram do Grande Conselho em que Araripe foi eleito Presidente, mas ainda assim diz-se comumente que a Confederação teve pouca participação popular, quando tal número por si só atesta a magnitude do evento. Facilmente, por aqui, repete-se que Pernambuco teve a liderança dos dois episódios, simplesmente recorrendo-se à cronologia, mas esquecendo-se que, ao se assim apreciar, melhor seria creditar-se às idéias pernambucanas às revoluções Americana e Francesa, que as inspiraram. Se Pernambuco teve valorosos Carvalhos e Amores Divinos, o Ceará teve vários Alencares, Mororós, Sucupiras, Ibiapinas, Carapinimas, Antas, Araripes e outros. Ou seja, aqui ocorreram as maiores batalhas, daqui partiu a vitoriosa expedição a Fidié; por aqui nossos heróis brotaram como flores em mandacarus molhados; aqui se decidiu a batalha final e aqui a esperança da vitória viveu até o fim, e mesmo após. Diz Joaquim do Amor Divino, o Frei Caneca, em seu Diário, às páginas 451, citado por Antônio Dantas Alencar: ...”Ceará, talvez não tenha havido entre as províncias do império do Brasil uma que tanto se chocasse com o aborto da dissolução da Assembléia soberana quanto o Ceará Grande”.Pág. 452: "... derrocaram o monstro da cadeira da presidência ( Costa Barros), formando um governo temporário, debaixo da presidência de Tristão Gonçalves de Alencar Araripe; e se dispõem para resistirem a toda agressão da parte do Ministério do Rio, quer no bem, quer no mal”. Pág.527: "O Ceará tem tomado uma atitude que mostra a sua decisão enérgica contra os planos do Rio de Janeiro, e qualquer agressão externa”. Pág.528:”Quem lhes ministrou, aos cearenses, planos tão bem concertados, providências tanto a tempo e cautelosos? Qual tem sido a província do Brasil que tem desenvolvido tanto liberalismo e despregado tanta energia? Que exemplo mais imitável aos povos do Brasil ? Pernambuco mesmo deve fitar os olhos no Ceará, e confundir-se.Ali alçou o primeiro grito a liberdade, e seu eco fez estremecer o coração do império”. É Frei Caneca, o grande herói pernambucano, quem diz a importância que o Ceará não se diz.E lembrem que em sua fuga, foi para o Ceará, ao encontro de Alencar, Filgueiras e Araripe que se dirigiu, na esperança de aqui ganhar as forças que já não tinha em Pernambuco. Diz ele: "... que, tomando-se todas as medidas necessárias para a defesa da liberdade da pátria, se levantasse o acampamento, e se procurasse outra posição vantajosa, donde pudéssemos ter comunicação com os liberais das províncias do Ceará...e especialmente com o General Filgueiras, a fim de combinarem os planos de ataque sobre o inimigo”. Tivesse tal encontro se dado e talvez a Confederação fosse vitoriosa. Mas, nesta grande revisão em que passa a História, mesmo a derrota às vezes tem sabor de vitória, e dia a dia a Independência e a República, sem dúvidas, vão sendo mais nossas.

Por: Oscar Araripe
Pintor e escritor e ex-jornalista do Correio da Manhã e do Jornal do Brasil.

Um comentário:

José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

Olha Pessoal: eu conheci o Oscar Araripe. Ele é descendente da terrinha. Mora em Tiradentes, em Minas Gerais, para mim a mais charmosa e linda cidade do ciclo do ouro. Tem ateliê fantástico, numa rua especial da cidade, a que vai para a igreja. Ele levou-me a conhecer a casa, dela tem uma visão espetacular da Serra de São José, tão parecida com a nossa Araripe. È um pintor exuberante, tropicalista nas cores, por vezes figurativo, mas com toques essenciais deste espírito fantástico de nossa cultura latinoamericana.