Lendo Contardo Caligaris na FSP entendi perfeitamente o que significa deixar sua cidade: "Tudo bem, viajei muito. Várias vezes, ao longo da vida, mudei de língua e país, mas o que importa aqui não são os acidentes de minha história. A modernidade se define pela viagem, pela decisão de não aceitar que o lugar onde nascemos seja nosso destino -por exemplo, pela vontade de deixar o campo e ir para a cidade". Muita gente faz o "movimento" contrário, permanece parado em seu torrãozinho de açúcar. Como tudo na vida deve existir vantagens e desvantagens nas duas posições. O que me irrita são os extremismos burros. Algumas pessoas acham que devemos manter, entre outras coisas, o sotaque do lugar de onde viemos como se isso fosse uma profissão de fé e não uma escolha como muitas outras. Por que não posso achar irritante certa forma de falar do lugar de onde vim? Por que não posso abominar certo padrão de comportamento muito comum, dadas as circunstâncias, do pedacinho de terra onde brotei? Desse apego irracional às raízes estou fora. Também sou contra o mimetismo impensado que alguns se submetem, por baixa auto-estima, quando vão morar num lugar maior, mais rico.
Seria muito fácil, bancar o nostálgico e o ardoroso defensor da terrinha. Os bairristas, numa terra que viveu grande parte de sua vida em disputa com o seu vizinho Juázeiro, aindam deve ser maioria entre os filhos do lugar. Lembro que como disse Samuel Johson "o patriotismo é o último refúgio dos canalhas". Bairrismo = Patriotismo. Mas uma coisa me intriga. Sempre vi relatos apaixonados de ex-moradores do Crato. E fico me perguntando será que não sou tão apaixonado assim pelo "cratim de açúcar tijolo de buriti" porque sou diabético? Pode ser. Antes que os bairristas fanáticos me chamem de traidor gostaria de dizer que acho Crato uma cidade simpática e com algum charme. Mas como o José de Drummond não posso me angustiar e querer ir para o Crato. Crato não há mais! O meu, é claro!
7 comentários:
Maurício,
Acredito que vc tem ampla razão em muitos pontos que levantou.A possibilidade que temos de ampliar nossa visão de mundo e justamente viajando e conhecendo outras pessoas, outros costumes, outras verdades. Ficar preso à visão doméstica, colocar essa viseira geográfica, a meu ver, nos torna estreitos e limitados ( isso independentemente de onde se vive: , vale para Sampa, vale para Salitre!)Claro que o lugar onde estaremos sediados a maior parte da nossa vida é uma escolha pessoal, coisa de simpatia-antipatia. Elisabeth Bishop dizia que cidades pequenas geram homens pequenos, não concordo com ela. Há pequenezes e grandezas nas metrópolis e nos cuviocos: Patativa morava em Assaré e Hitler em Berlim. Independentemente de onde se mora a visão de mundi me parece fundamental. E temos que dá nossa contribuição de melhorar o mundo onde estivermos. Alguns, sei, fixam-se no seu minúsculo mundo particular e, mesmo longe, não conseguem muito se afastar: "lá eu era feliz e nem sabia..." Talvez porque tenham vivido a fase dourada da vida neste local e lá existam os últimos testemunhas deste tempo glorioso. Só que esse tempo glorioso já passou, não volta e a vida se vive para frente ,não tem marcha ré. Quebrar as fronteiras nossas históricas e geográficas faz parte do crescimento pessoal de cada um de nós.
Oi, Zé Flávio
É claro que pessoas excepcionais nascem também, e vivem, em cidades pequenas e um monte de anta nasce e vie em grandes metrópoles. Esse é um assunto que me pertuba. Nascer em Crato foi bacana mas sair de Crato foi fundamental para que eu visse um mundo mais plural e menos mesquinho. A pewssoa excepciional consegue transcender o espaço tempo que habita. Mas sabemos que o mundo é majoritariamente habitado por pessoas medíocres (médias). E a função principal dessas pessoas é impedir que os outros se sobressaim e acentuem sua mediocridade. Tenho saudades do Crato da minha infância que , como já disse, deve ter se transformado bastante. Principalmente porque a saudade está relacionada às pessoas daquela época. Na verdade habitamos um mundo só nosso e algumas vezes somos vítimas da paisagem. O texto que escrevi foi motivado pelo artigo de Caligaris e pelo fato de já ter morado em nove cidades diferentes e me sentir um pouco de cada lugar e de lugar nenhum. Um abraço e quando for ao Crato gostaria muito de conversar com voc~e uma pessoa com quem tenho muita afinidade.Neste exato momento me lembrei de uma música de marina; "As coisas não precisam de você..." Mas talvez precisemos delas.
Grande Maurício,
Quando vier por aqui , entre em contato, amigo. Precisamos conversar. Sou de uma geração um pouco anterior á sua e quando vc cresceu, eu estava no Recife e , quando voltei, vc já tinha zarpado. Lembro bem do Itim, do Geraldim e do Alfredo. o comentário do Caligaris é muito interessante mesmo. Quando vier na terra dê notícias!
abraço,
Aprecio a visão de Zé Flávio sobre as coisas. Ele sempre tem-se colocado ativo e crítico quanto a nossa cultura da pequenez.
Só corroborando com sua escrita, e entendo o que o nosso Murício disse,lembro que,as raízes da pequenez de Crato são históricas.
De terra aberta dos Cariris para o parcelamento dos ávidos colonizadores; do mandonismo minifundiário e de seu atrelamento e disputa de poder, função da manutenção de seus feudos, resultando, ao longo da história, não numa fricção de classes, nem estamento, mas em grupos de status procurando manter sua força através de troncos familiares assumindo novas posições através da formação de quadros técnicos: médicos, advogados, padres, "doutores", etc. E haja Seminário, Faculdade de Filosofia, Cursos Superiores...
Não dá para se discutir a gênese de nossa miudez num espaço como este. Mas é bom, sempre, buscar as nossas origens históricas, não como saudosismo, mas para, nalgum momento, retrazermos o que poderia ter sido e que não foi na nossa trajetória enquanto povo.
Não é o lugar que faz um povo pequeno ou grande, é a sua história, e a história é uma construção coletiva, e isto resulta numa identidade cultural, que, não quer dizer, que não se possa mudar. E para mudar, é preciso que primeiro não tenhamos medo de sabermos quem somos, de onde viemos. De posse disso, poderemos dizer o que não queremos, e lutarmos para não aceitar...
Zé Nilton
Foi legal você ter colocado dados históricos no seu comentário. Quando falei de terra estava falando de gente (embora ache que num caso extremo uma terra muito miserável poderia influir na formação da personalidade de seus habitantes). Mas você tocou no ponto principal. A mentalidade tacanha da "elite cratense". Durante anos nos sentimos superiores aos juazeirenses e enquanto isso eles cuidavam de crescer e assumir nossas principais instituições etc.
abraço.
Não é o lugar que faz homens grandes ou pequenos! É preciso sempre transcender a si próprio para ser alguma coisa em qualquer lugar.
Goethe, Schiller e Nietzsche nunca precisaram sair de Weimar para serem pilares do pensamento ocidental.
DM
Dihelson
Só agora li seu comentário. Concordo que é possível ser grande num lugar pequeno, Grande e pequeno aqui são qualificações objetivas e subjetivas ao mesmo tempo. Mas admiro os que trabalham contra a corrente e sei que em lugares menores as coisas são mais difíceis. Quando combato o provincianismo nãos estou combatendo os "provincianos" no sentido estrito da palavra. Apenas me revoltando com a mentalidade tacanha que a moral de rebanho perpetua. Esse é um tema que me obceca de uma certa forma. Por que vejo como um ideal romântico apequena, e bonita, cidade com os benefícios da civilização que são conquistados com muita luta. Como já elogiei antes vejo em você , com seus erros e acertos, o mérito do guerreiro que não se deixa abater fácil. Mas nem todos são assim.
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