TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

domingo, 30 de agosto de 2009

Pacto

Aceito minha carne.
Minha fome.
As enrugadas falanges
dos meus dedos beatos.
Minhas faces equivocadas
diante do espelho embaçado.
Aceito meu refúgio.
Meu fabuloso abismo.
A santa esquizofrenia
das palavras sussurradas.
Aceito minha mentira.
Minha maldição.
Ofereço-me o corpo
às chicotadas de bambu.
Aceito esse coração trepidante.
A falta de sangue no olho.
Os ancestrais que se contorcem
envergonhados da minha fraqueza.
Aceito minha fraqueza.
A haste do capim queimada
pela sombra de uma formiga.
Aceito meu aneurisma.
As axilas friorentas.
O hálito denso.
O dorso da língua áspero.
As unhas anêmicas.
Os cílios ínfimos.
Aceito minha alma -
a obscura mendicância.
As coisas invisíveis,
a porta aberta,
os calafrios.
Aceito meu fim.
O remorso.
O cinismo.
O medo.
O último cafezinho,
a cafeteira suspirando.

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