TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

domingo, 14 de março de 2010

Tartarugas Marinhas - por José do Vale Pinheiro Feitosa

A praia vazia naquele começo da manhã. Apenas os três andando na planície infinda do litoral do Ceará. Pela terra e mar a visão só termina na curvatura do planeta. Foi quando ela disse:

- Parecem grandes tartarugas.

As pedras dos recifes semi-descobertas pela maré baixa. Grandes animais marinhos, pré-históricos sob nossos passos no presente. Imediatamente surgiu um arco-íris de tempo, com as cores de todos os momentos vividos por cada um. Em seguida um deles pergunta ao terceiro:

- Achas que temos alma? Uma vida eterna?

Pergunta mais antiga. Resposta mais experimentada. Mas assim mesmo a deu:

- Não digo que sim e nem digo que não. Tudo pode.

- Quando assim respondes é que existe em ti a idéia de que sobrevirás ao tempo. Se não considerasses a possibilidade de uma vida eterna não colocarias esta dúvida. Apenas dirias que não. Mas ao assim responder consideras esta possibilidade e, efetivamente, crês na alma e na eternidade.

- Não sei. Acho que somos diferentes. Dos porcos e dos jumentos.

- É verdade e os porcos e jumentos também nos achariam diferentes. Nos termos deles. Assim a nossa diferença não nos diz de qualquer supremacia e nem de qualquer eternidade.

- Mas não posso afirmar que não exista alma. Mesmo que ninguém tenha vindo e me dito que vive a eternidade. Alguém que já tenha morrido.

- Mas se somos diferentes de porcos e jumentos, um elemento central se encontra na inteligência e no enorme impacto desta sobre a natureza do planeta. E a inteligência se exercita pela razão, na qual a existência se pontua pela evidência de sua própria existência.

- Mas posso imaginar que exista vida noutro planeta. Assim como posso considerar a existência da alma, mesmo sem que tenha qualquer evidência.

- Imaginar é bem humano. Mas não diz nada da eternidade. Há a possibilidade de vida em outros planetas desde que resguardadas as preliminares para que exista vida como a conhecemos. Mas até agora nenhuma evidência há de que exista vida noutro planeta.

- Então, mesmo não existindo evidência se admite a possibilidade, é o mesmo caso da alma.

- Só que não existem preliminares para se definir a eternidade de um ser vivo.

- Mas a alma não é vida. É algo permanente.

- Então que seja este algo permanente, que não existe no universo. Mas existe no teu desejo por acréscimo. Por merecimento de ser diferente. Como paga de tua boa conduta.

O mar, a planície, o vento e as nuvens que prometem as chuvas que não caem. Andávamos na praia vazia de gente, apenas nós e por isso nem se podia qualificar como vazia de gente.

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