TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

sexta-feira, 1 de março de 2013

Papa dando sopa



O Grupo Escolar Capistrano Landuá, em Matozinho, ganhara fama ,na região ,por se tratar de uma escola bastante ortodoxa, destas de dar pesqueiro em Piaget e chulipa em  Paulo Freire. Os matozenses contavam orgulhosos  a grande quantidade de ex-alunos que ganhou importantes cargos em todo o estado, forjada nas rígidas regras do Capistrano. Comerciantes importantes, barnabés e até deputados ! D. Eufrazina, uma das pioneiras da educação na cidade, tinha sido a fundadora do Grupo e devia-se muito a ela a seriedade disciplinar da instituição,  nos muitos anos que a dirigiu. Com a partida da educadora para os campos celestiais, a escola foi, pouco a pouco , livrando-se dos velhos tempos e investiu-se de um certo ar de liberalidade, com os novos diretores que foram se sucedendo. Falamos em liberalidade, mas é importante dizer que era com os freios de disco matozenses, nada para além do que seria permitido num convento ou numa mesquita. Mesmo assim, a tradicional família de Matozinho malhava o pau nas mudanças  e vivia a recordar os bons tempos do quartel de Eufrazina:
                                    --- Aquilo sim é que era escola e não essa putaria: mistura de cabaré com Circo de Cavalinhos !
                                   Reclamava a cidade que o Capistrano já não tinha o mesmo desempenho dos anos gloriosos. Nem lembravam que o acesso à escola havia se ampliado nos últimos anos e não só a classe média estudava, mas adentraram as classes os mais desfavorecidos, com todos seus imensos problemas. Assim, caiu como uma notícia auspiciosa a nomeação do novo diretor do Grupo : Prof.  Bento de Assis. O mestre tinha fama de durão, fora coroinha de igreja, membro da TFP e um dos mais famosos anticomunistas e dedos-duros na época da ditadura  militar. Os bons tempos do Capistrano tinham tudo para retornar. 
                                   Bento fez valer a sua fama de duro como beira de sino. Fez uma reviravolta na Pedagogia. Implantou a velha Gramática de Carneiro Ribeiro, o ensino do latim e do Grego na grade curricular, a matemática tradicional com sua tabuada ( nada de maquininhas) e a velha palmatória como professor adjunto. Geografia e História,   só antigas e com o seu decoreba incluso. Nada de figurinhas, cartazes e muito menos diabo de computador. Mudou ainda a farda,  com a necessidade dos homens usarem calças compridas, sapatos fechados e ceroulas e as mulheres saias longas, com toda a proteção interna :califon, anágua e combinação. Proibiu ainda os homens usarem cabelos longos e as mulheres , curtos. Brinquinho em macho, piercing em moça era motivo imediato de expulsão. Não bastasse isso, Bento modificou totalmente a merenda escolar, trocando o velho mingau de aveia,  por uma sopa de coentro que ele tentava convencer os alunos ser mais saudável, mas confidenciava aos professores que aquilo diminuía o tesão dos meninos, em plena fase perigosa de explosão hormonal.  As solenidades na escola eram uma sucessão de rezas e mais rezas todas, necessariamente, em latim.
                                   Bento tinha ainda uma profunda preocupação com os possíveis desvios dos alunos em fase de formação. Encheu a escola de beatas tentando ensinar os meninos que sexo só depois do casamento; que camisinha era uma passagem pro inferno. Amedrontavam ainda os guris lembrando que o pecado solitário era um assassinato em massa, pior do que no nazismo, pois milhões e milhões de espermatozóides eram sacrificados.
                                   Semana passada, depois de uns oito meses de mandato, estranhamente, Bento renunciou ao cargo. Reuniu os alunos no grande pátio, na hora da merenda,  e explicou que estava velho e cansado e que precisava passar a diretoria para alguém mais novo e disponível.  Os matozenses, depois, comentaram que a desilusão dele teve outros motivos. Mais de dez alunas tinham engravidado no último ano, para seu desespero. Os meninos viviam no Cyber da cidadezinha , criticando-o no Facebook. O estado abriu ainda sindicância por conta de um enorme   desvio na verba da merenda escolar por uma quadrilha montada dentro da escola por pessoas do Núcleo Gestor, da sua mais inteira confiança. Não bastasse isso vários alunos colocaram no You Tube vídeos de transas entre eles ,em festinhas promovidas por eles mesmos,  em fins de semana, sob o nome : “As Taradas do Capistrano”. A gota d´água, no entanto, parece ter sido a divulgação de pretensas cartinhas de amor do nosso sério diretor ,  dirigidas a um servente da escola chamado Valdemarzão.
                                   Enquanto o Diretor avisava, solenemente, os motivos da sua renúncia, os alunos , ouvidos de mercador,  engolindo a contragosto a insulsa sopa de coentro, começaram a gritar em uníssono:
                                   --- Queremos papa! Queremos papa  !

J. Flávio Vieira

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