Flores fechadas. Grilos se repetindo ao infinito. Uma brisa
que se injeta até aos ossos. Como este bocejo que diz inútil despertar-se numa
potência de sono.
Luzes da cidade. Uma trilha a iluminar o vazio das ruas. Os operários
acordados na madrugada para embarcar na condução até o chão da fábrica. Estas
cidades dormitórios, que abrigam os leitos daqueles que apenas deitam em si no
final dos tempos. Ademais vigilam seus corpos e mentes na mais valia dos sócios
das máquinas.
Os ônibus, qual tamanduás sugando formigueiros, recolhem a
mão-de-obra em seu vente para depois solta-la bem em frente ao relógio de
ponto. E até se imagina que os pardais tornam a copa de alguma árvore uma
zoeira só em denúncia das madrugadas acordadas.
O peso desta quadrilha puxada pelo trabalho e capital, numa
luta de classe que torna a madrugada um escoadouro de lamentos e profundidades.
Profundidades que não conscientizam, ao contrário, apenas é uma armadilha a
quebrar as pernas dos transeuntes da história.
E siga-se além ou aquém destes personagens notívagos nas
franjas dos momentos finais da noite longa, fria e escura. E tome-se a trilha
das dunas, suba e desça como um pássaro lutando para se manter no ar.
Ofegante no mais alto destas montanhas móveis, tome o olhar
que não lhe escape da realidade. Jamais ela lhe desamparará em conteúdo desta
história crônica e mortal. Sempre lembrará destes destinos usados e abusados
até o limite do tempo vivido e perdido no contracheque que lhe compra o tempo
por si inventado.
E então descubra que afinal no limite da sede e da fome,
ainda lhe resta esta consciência: o tempo quem inventa é você. E o tempo é a
matéria prima onde a onipresença do dinheiro se inventa.
E sinta. Por estas terras, lagoas, ventos e mares, o sol
iluminou as cenas de humanos que mediavam a vida diretamente, mesmo quando
deuses se interpunham. Mediavam sem necessidade de tudo ser mediado pelo
dinheiro.
Assim como pelas meninas dos meus olhos as flores se abrem,
os grilos se calam e lá no meio do imenso e belo Oceano Atlântico, o sol surge
em luz. Explodindo raios por todas as brechas das nuvens.
Surge criando um rastro iluminada nas águas que nunca param,
apenas mudam de cor como a revelar que nada permanece a mesma cor. Que “é de manhã vem o sol, mas os pingos da
chuva, que ontem caíram, ainda estão a brilhar. ”
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