Desde
tempos outros, o Bairro Pimenta, no Crato, ostentava com orgulho o
título de “bairro nobre”, bairro dos poderosos, bairro da elite
municipal.
Lá,
residiam os “doutores” em geral (médicos, dentistas,
engenheiros e demais graduados da terra), bem como os de bem com a
vida (comerciantes, industriais, fazendeiros, profissionais liberais
e por aí vai).
E
também lá se localizavam os imóveis mais valorizados da urbi
(residenciais e comerciais), assim como o ambiente mais seleto e
charmoso não só do Crato, mas de toda a Região Cariri: o então
revolucionário Crato Tênis Clube, com suas concorridas “tertúlias”
ou “vesperais” às manhãs ou tardes de domingos, seus
fulgurantes e concorridos carnavais, mas de frequência absolutamente
restrita (adentrar o Tênis Clube, naquela época, só pra poucos, já
que verdadeira epopeia para “estranhos”).
No
entanto, apesar de toda essa “seletividade” latente, a joia do
Pimenta eram as suas “meninas”: belas, educadas, charmosas,
elegantes no vestir e no se portar (mas miseravelmente sumidas
durante toda a semana), aos domingos, em algazarra esfuziante,
desciam em “bandos” para a Siqueira Campos, onde (sabiam, sim),
detinham o poder de dilacerar, atormentar e arrebentar os corações
daqueles pre-homens/adolescentes carentes, ávidos e com o coração
a mil (dentre os quais também os residentes na “periferia”,
porquanto já então a praça era um espaço democrático) à espera
de, pelo menos, um piedoso olhar, mesmo que de compaixão (o
signatário, residente no Bairro Pinto Madeira, do outro lado da
cidade, era um deles).
Particularmente
(e numa outra perspectiva), devemos às “meninas do Pimenta” o
despertar prematuro para uma questão essencial: a necessidade
premente de tentar ser alguém na vida, a fim de, pelo menos, sonhar
com a possibilidade de transformar aquele “amor platônico”
domingueiro em realidade, via ascensão social (um bom emprego, um
título de doutor, e por aí vai).
Fato
é que o “statu quo” já se fazia, sim, presente àquela época,
de sorte que a blindagem, o hermetismo e a absoluta inacessibilidade
dos “periféricos” às “meninas do Pimenta”, já então era
uma realidade triste e palpável (quantas noites indormidas, quantos
belos sonhos alimentamos tendo por protagonistas algumas das beldades
da Siqueira Campos).
Alias,
sobre elas reportamo-nos anos atrás em uma das nossas postagens nos
blogs da vida, a saber: “enquanto as moçoilas em flor, devidamente
produzidas giravam, giravam e giravam em seu calçadão,
momentaneamente transfigurado em uma ativa, grande e concorrida
passarela, exalando beleza e frescor, nós, os marmanjos, de pé,
braços cruzados, às bordas do quadrilátero, atuávamos como
expectadores privilegiados de um seleto concurso de beleza, na
expectativa de um olhar receptivo”.
Doces
lembranças que, mais tarde (já na fase adulta), fizemos questão de
lembrar e reviver com inusitado e compreensível carinho, conforme
afirmamos em uma outra postagem: “e no entanto, aqui estamos nós,
desconhecidos, que nunca se encontraram, nunca se falaram, não têm
a menor ideia de como é o outro fisicamente, mas que, certamente, em
algum domingo da vida se cruzaram na praça Siqueira Campos,
vivenciando uma época fabulosa; e agora, através de reminiscências
comuns, constroem uma perspectiva real de amizade fraterna”.
“MENINAS
DO PIMENTA’… quantas saudades.
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