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terça-feira, 18 de setembro de 2007
O ÓBVIO QUE NINGUÉM VÊ ! - Editada
Ensaio de crônica:
"O ÓBVIO QUE NINGUÉM VÊ"
Dihelson Mendonça
Muito se tem falado sobre a decadência cultural dos nossos dias, mas poucos tem observado que o seu reflexo na nossa sociedade está íntimamente relacionado a uma causa comum.
Afinal de contas, ao ouvinte mais desatento, o que pode haver em comum entre o outdoor da mocinha alegre, entornando uma garrafa de cachaça, o sexo desenfreado e banalizado pelos jovens nas grandes festas de curral, as letras quase pornográficas das bandas de forró, e os carros com som elevado que diariamente nos atormentam, quase a destruir nossos tímpanos, sem qualquer respeito pela pessoa humana e em pleno dia de domingo ? Ao final desse texto, creio que o caro ouvinte terá pelo menos uma vaga idéia do que une tão fortemente coisas aparentemente desconexas.
Sabe-se desde o início da humanidade, que as coisas mais simples são mais digestíveis do que as complexas. Uma notícia dita de forma banal, uma música construída de forma simples, banal, ou uma pintura simples, atinge uma parcela maior de entendimento.
A cultura de um povo é estratificada. Na grande base, a maioria das pessoas, com pouco acesso ao conhecimento cultural, sem acesso a oportunidades, sem acesso a quase nada. Pessoas essas, que geralmente formam a grande massa de manobra dos políticos que os prefere mantê-los na ignorância, sem pensamento próprio, pois ao poder, não interessa pessoas muito conhecedoras. Há pouco investimento para que essa classe culturalmente baixa possa evoluir em qualquer sentido.
Mídia, por outro lado, é indústria!
Mídia é indústria que se mantém às custas da venda de idéias de fácil assimilação, que encontre grande empatia entre a população.
É notório que a massa não tem acesso às artes e à cultura. Desta forma, sem o exercício da criatividade, o povo tem preguiça mental para assimilar qualquer coisa mais elaborada. Aproveitando-se disto, grupos econômicos ligados à produção musical, de norte a sul deste país, tem assumido o papel de domesticador, tutor e se preferirem, EDUCADOR desse povo. Homens poderosos, alguns que conseguem miraculosamente manter até 50 estações de rádio em seu poder, além de canais de satélite, ditam através das suas ondas, os padrões de comportamento, gôsto musical e o próprio comportamento em sociedade. Esses coronéis, muitas vezes associados às bandas de forró, se perpetuam na obscuridade, à sombra do poder, aparentemente sem ser molestados pela classe política, que talvez os vejam como potenciais aliados, ou como testas-de-ferro.
Tem-se criado então, um círculo vicioso em razão do dinheiro, onde o nivelamento por baixo tem deixado a qualidade da nossa música e da cultura em geral, cada vez pior, a cada ano que passa.
Por isso que o caro ouvinte ouve estampados os sucessos, em letras banais como "na boquinha da garrafa", "amor de rapariga", "Eguinha pocotó", "Eu quero é beber e raparigar" e assim por diante...
Aonde foram parar as nossas autoridades?
Aonde foi parar o nosso senso de moral e de decência?
Aonde foi parar a nossa vergonha-na-cara ???
...
Até quando teremos que, calados, assistir à derrocada social ?
Esta coisa, - que não é mais música -, é o que este cronista costuma chamar de "CAFUÇU MUSIC", onde o pior do pior é valorizado, para atender aos gostos mais primitivos e rudes de um povo sem qualquer formação cultural. Afinal, quanto mais cultura e conhecimento se dá a um povo, mais este passa a ser conhecedor da sua história e do seu tempo; Passa a pensar, e a caminhar por meios próprios; Passa a começar a ter idéias mais evoluídas, usando o intelecto.
Infelizmente, essa indústria da mediocridade, explora essa grande falha educacional e cultural do país para ganhar dinheiro e se perpetuar. O "cartel" usa a mídia como instrumento de trabalho diário, e as casas de shows como sua base de sustentação, usando mão-de-obra ( músicos ) pobre, desqualificada, e mal paga. Quase escrava!
Se a coisa se mantivesse apenas num âmbito controlado, como antigamente, nos anos 70, com a música brega, onde ecoava num pequeno percentual da população, de cultura mediana, já não seria grande problema, pois havia ainda uma diversidade cultural, não existia um monopólio do controle ( cultural ) da mídia de forma tão ostensiva. Mas, com o passar dos anos, o cartel quer ganhar TODOS os espaços, abolindo a liberdade de escolhas, a diversidade, a pluralidade de estilos, e estabelecendo um monopólio próprio, praticamente ditando o que as pessoas devem considerar como "O sucesso", "O modelo", e principalmente, BLOQUEANDO qualquer espaço e tentativa de que outros estilos musicais possam ter acesso.
E assim, sem conhecer outros universos, igual ao homem de "O mito da caverna" de Platão, as novas gerações vão surgindo a cada ano, sem nunca conhecer o seu passado, a sua história. Sem conhecer os Ícones da música, como Luiz Gonzaga, Tom Jobim, Noel Rosa, ou porque não mencionar, um Villa-Lobos, assimilando apenas o "Pão e Circo" que lhes é dado diariamente, e vão contribuindo para aumentar o efeito bola-de-neve. Geração desinformada gera geração mais desinformada. Geração movida à bobagem, só pede mais bobagem. E a causa se transforma em efeito e o efeito em causa.
É como um cachorro mordendo o próprio rabo.
E gradativamente, os ícones do passado estão sendo esquecidos, quem sabe, daqui a duas gerações, eles possam eventualmente desaparecer completamente.
Haverá UM ESTILO apenas, o estilo ditado pelo monopólio, como já se configura hoje em dia nas estações de rádio, em que muitas vezes, uma mesma música toca simultaneamente em 3 estações diferentes.
É uma verdadeira prostituição musical ou cultural, a que estamos submetidos, e é por isso que muitos estão a fazer campanha para denunciar esse abuso, para mostrar simplesmente o "ÓBVIO QUE NINGUÉM VÊ".
Se não tomarmos alguma providência no sentido de MOSTRAR que existem outros tipos de música e de arte à população, de dar a conhecer a diversidade, a nossa história e os trabalhos feitos com esmêro e qualidade, a cultura como a conhecemos, desaparecerá em uma década, e só vai existir apenas o monopólio frio de uma indústria perversa, calculada, que exalta a banalidade, reforça as piores qualidades humanas, que combatemos por milênios. Uma indústria vil, que prega a degradação do homem, incentiva o alcoolismo, sorri para a desagregação familiar, banaliza a mulher, enaltece a rebeldia, confunde-se com a ignorância e promove sobretudo, a mediocridade !!
Dihelson Mendonça
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11 comentários:
Muito bem obervado! Veja a programação de nossas radios locais. Salvam-se pouquíssimos programas. E, mesmo a gente estando tão próximo dos programadores, somos "invisíveis". Ultimamente, tenho cobrado, como sempre fiz em outras gestões da URCA (Prof. Teodoro, Edmilson, Violeta Arraes, Herzog), a ativação da radio Universitária FM. Como o Emerson Monteiro ( amigo de longas datas) está na assessoria de comunicação, pode ser que o processo ande. Então, poderemos modelar uma programação que sirva de paradigma para outros comnicadores. Torceremos juntos!
Ótimo o texto!E o mais preocupante é que este sistema se auto-alimenta. É imprescindível ter o povo sem qualquer nível educacional e cultural para que esta indústria possa se manter azeitada, para que os mesmos corruptos sejam eleitos/reeleitos continuamente ad eternum e continuem a praticar as mesmas falcatruas. Aculturados, vendemos todos nossos votos ( qualquer classe o faz: o que varia é o preço). E a indústria que enche as burras dos políticos nas campanhas, recebe de volta o investido, vendendo excremento. Por isto mesmo, Viva a Pirataria !
Obrigado, amigos!
Responderei aos dois:
Amigo Zé Flávio, muito obrigado pelo seu comentário. Na verdade, eu vivo reescrevendo sobre esse mesmo tema, como sabes. Considero o tema principal das minhas escritas, e uma das funções como artista, de denunciar esse cartel a todo custo, mostrar às pessoas que elas estão sendo manipuladas. Que essa coisa que alguns chamam de "gosto popular" na verdade, não existe, é uma grande armação, criteriosamente montada para extrair dinheiro fácil.
No ensaio de crônica, eu não quis citar nomes, para não sair do formato, aliás, está cheia de erros e repetições ainda, porque a escrevi em alguns minutos, e pouco fiz de revisão ( depois farei ), pode ver que a temática é repetitiva, exatamente para insistir no ouvinte, de diversas maneiras, para que uma delas o atinja!
Eu não mencionei nomes, mas leia-se o nome de um dos culpados pelo sistema: EMANUEL GURGEL, homem que domina 50 estações de rádio, e um canal de satélite, e compra espaço nas estações locais. Com esse poder maléfico, ele estabelece um monopólio das suas bandas de forró.
Um cara com 50 estações de rádio, e outras trocentas associadas consegue impor qualquer estilo musical que queira.
Isso deveria ser crime, monopólio, e não sei o que se pode fazer a respeito. O POVO ESTÁ CONTAMINADO. É como vc falou, o sistema se auto-alimenta.Com o sistema no ar, as novas gerações não terão acesso a outro tipo de informação. Em uma década, se nós enquanto artistas não fizermos alguma coisa, nem que seja esses protestos, seremos fatalmente sucumbidos na lava desse vulcão de ignorância. Se quisermos que a arte sobreviva, teremos que lutar com unhas e dentes pelos espaços, pela diversidade, sair dos Blogs para as ruas, para os eventos, para as manifestações, arrumar espaço na mídia, nem que seja pra ouvir Fábio Júnior e Roberto Carlos. Essa desinformação e ignorância, como todos nós sabemos, começa pela música, mas atinge todas as artes, e bloqueia o pensamento racional. Assim, a decadência vai atingindo todos os níveis, tornando tudo mais superficial.
O caso é que o cartel não quer que nenhuma outra banda ocupe espaço no rádio, o completo bloqueio do que vem do sul do país, e da cultura local.
Até a "Ave-Maria" já foi gravada por gente das bandas de forró, para ter uma programação 100% do povo deles 24 horas no rádio. Bandas de forró tem gravado baladas com letras românticas, para que ninguém note a falta delas nos horários noturnos.
Amigo Salatiel, vc não faz idéia de como essa notícia da Rádio Universitária FM me deixa feliz! Eu não sabia desse projeto. Vc tem alguma informação extra se esta estação já foi aprovada, se existe algo palpável mesmo sobre o assunto ? diga-me aí por onde eu possa pesquisar e fazer uma matéria sobre o assunto ?
Creio que devemos insistir nessa rádio universitária como uma tábua de salvação, quem sabe, fazer matéria no DN, fazer entrevistas.
Olha, se vc está mesmo morando no Crato, vamos programar umas entrevistas, umas matérias para por nos Blogs, na TVCrato. Eu tenho a câmera e vc pode ser um entrevistador.
Abraços,
Dihelson Mendonça
Existe ainda um problema que precisa ser lembrado, nisto tudo. Os próprios artistas do Cariri têm um enorme preconceito entre si. Ninguém vai ao Show dos colegas e, pior, poucos tocam nos seus shows músicas de artistas caririenses. A lógica é sempre aquela : Ele não vai ao meu show, eu também não vou ao dele; ele não toca minha música , eu também não toco a dele. Semana passada tivemos um puta show: o do "Zero Grau" no BNB, praticamente não havia artistas presentes: Mané, Salatiel e quase mais ninguém. No de Leninha & Hugo, semestre passado: ninguém ! No dos ,Zabumbeiros, três gatos pingados.O de Salatiel, final do ano, foi exemplar porque ele convidou todos a subir no palco: o Show já não foi só dele ! Nós mesmos não valorizamos a nossa música, aí fica difícil, cobrar da platéia esta valorização.
JFlávio, realmente parece que há mesmo uma espécie de preconceito de alguns artistas do cariri, por exemplo, neste ano eu devo ter feito uns 5 ou 6 shows no BNB, e mal vi gente conhecida da classe musical, mas devo frisar que isso não vale como regra, pois tinha também gente do meio artístico que eu conheço pouco, mas graças à Deus, meus shows sempre tem muita gente. Eu sempre que posso tenho ido ver alguns shows. Não todos, porque é impossível. Gostaria muito de ter ido ao do zero grau, porque além de tudo, são todos meus amigos, da minha "laia" da música instrumental, e nem isso eu pude ir no dia, infelizmente. Estamos sempre atarefados.
Espero que haja maturidade suficiente entre os artistas para prestigiarem os inúmeros shows que acontecem no BNB. Pelo menos de quando em vêz. Eu tenho até filmado alguns para DVD. Tenho vários.
Mas voltando ao nosso artigo, o problema da decadência cultural alienante não acontece apenas a nível de cariri. O cariri é um pedacinho do todo. O problema é de âmbito nacional mesmo, e os empresários que controlam a mídia fatiaram o bolo entre as regiões. Aqui no Nordeste, é do Emanuel Gurgel e seu forró ruim. No Rio de janeiro, os chefes da máfia empurram o funk de rua, o rap e outras bobagens. Nos estados do centro-oeste e alguns do sudeste, impera o SERTANOJO.
Aliás, o Lulu Santos tem razão quando diz que espingarda de 2 canos serve para matar dupla caipira...
É preciso um grande trabalho a nível de povo para reeducá-lo à verdadeira Arte e Cultura, e mais uma vez faço valer o tema daquela minha outra crônica, que não sei se vc leu, que fala sobre a ineficiência do modelo BNB/SESC, frente à mídia:
Enquanto o BNB arrasta 40 pessoas para um show caro, um empresário aluga uma casa de show e leva 10.000 pessoas. O chefão da Expocrato faz um show e mostra a 40.000 pessoas.
um locutor de rádio FM numa tarde, atinge 10.000 pessoas numa região ( ou mais ).
É uma luta desigual, e só vai resolver quando pudermos ganhar espaço na mídia. Não existe outra solução. É preciso ir até o povo com shows em praça pública, grandes estruturas, palcos imensos ( nada dquelas besteirinhas que a URCA faz com palquinhos de meio metro de altura... ).
Tem que ter estrutura pesada mesmo, Valendo!!! Não adianta combater fogo de metralhadora com tiro de bacamarte.
Abraços.
Amigos-companheiros Salatiel, Zé Flávio e Dihelson, Considero essa questão crucial e cruciante. É a mídia que manda, i.é, o tempo de exposição que um produto fica disponível. Temos que ter blogs, emissoras de rádio e TV aliados. Achos que estamos no caminho certo, abrindo veredas a golpes de falcão: uma missão salvacionista (acho que vocês estão entendendo..)
É, Rafael, e pelo nosso espírito revolucionário de descendentes de Dna. Bárbara de Alencar, eu gostaria até que esses "facões" não fossem virtuais, fossem reais mesmo, para cortar a cabeça de muita gente que nada pensa, a não ser encher a barriga de cana, sair com o carro a mil por hora ouvindo forró na Av. Duque de Caxias atropelando pessoas inocentes!
O problema é que nós que temos educação, e portanto, bom-gosto, jamais faríamos uma coisa dessas.
Vc não anda vendo por aí gente que escuta os noturnos de Chopin com volume do carro no TALO, nem mesmo hico Buarque e muito menos, músicas de Abidoral ou de Salatiel.
Somos muito mansinhos, e nossa mansidão, aliados à inércia, favorece o surgimento dessas pragas.
Os maiores propagandistas do forró nem são as bandas, são os usuários, os traficantes. Forró é uma droga que traz consigo as piores qualidades do ser humano, embota o cérebro, é feito para manter as pessoas no reino da babaquice!
Temos que lutar por espaços na mídia, nos Blogs, nos sites e nos unir.
No Orkut, eu tenho comunidades inteiras de gente que é nosso aliado e são solidárias a minha Campanha contra o Forró.
Um grande abraço!
Dia desses, me surpreendi. Um topiqueiro que faz viagens de Crato-Juazeiro me abordou e disse que gostava muito de minha música e que já havia "pirateado" cinco vezes o disco que comprara no Hamilton! " O Contemporâneo". Ele sempre está com o disco na Topic e toca muitas vezes em suas viagens diárias. Dái já recebeu essas "encomendas". Eu falei que tudo bem mas eu ainda tenho alguns originais e que quando preciso me pedisse. Então...se tocar o povo canta!
Sobre a Radio Universitária FM, Dihelson, brevemente sairá um jornal da URCA com entrevista do reitor Plácido e que trata tambpém do assunto. Sei que a uURCA tem um concessão (canal) que precisa ser ativado com urgência, senão caduca.
Aí quando se fala em Rádio Universitária, surgem aqueles problemas de sempre. Neguim fica com medo de abrir a Rádio com medo do uso desenfreado por aqueles que lhe fazem oposição dentro da Universidade. Pode parecer loucura mas é exatamente isto ! Existe uma política dentro da Universidade que não é diferente em nada da política partidária, apenas uma extensão daquele conhecido saco de gatos. Quem vai se empenhar em abrir a Rádio dando espaço e microfone para as mais diversas e díspares alas políticas ? Vamos torcer para sair, mas podem estar certos a dificuldade maior reside justamente neste pontinho que parece absurdo e mesquinho.
Eu sei que realmente existe esse negócio de que se não botar a rádio pra funcionar, caduca!
O Tasso Jereissati tem um canal de FM aqui para o Crato e tá quase caducando...
E sobre a política dentro da universidade... bem, tomara que a rádio funcione primeiro para se brigar depois...
Abraços
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