TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quarta-feira, 5 de março de 2008

"Por quem os sinos dobram"

Emerson Monteiro

Este é o título do primeiro livro que li daqueles considerados livros para adulto, na classificação estabelecida por minha mãe. Pertencera a tio Alberto, irmão do meu pai, que deixava alguns romances depositados lá em casa no intervalo das viagens que empreendia mundo afora, e que não foram poucas. Vivera em Fortaleza, Recife, Rio de Janeiro, Brasília e Acre, neste, nas matas, em um seringal pertencente a cearenses.

Li escondido e, talvez também por isso, cumpri o tal itinerário dos livros juvenis a esses, os chamados para adulto, sob a batuta de quem a crítica americana considera o mais bem sucedido diálogo da língua inglesa nos Estados Unidos, Ernest Hemingway, monstro sagrado da aventura e do jornalismo de guerra dos escritores ianques.

O livro retrata a história de um voluntário americano nas brigadas republicanas da Guerra Civil Espanhola, ensaio europeu da Segunda Grande Guerra, nos anos 30. Robert Jordan, perito em explosivos, coloca sua empresa a serviço do movimento antifascista em luta.

No seu trabalho, ele se junta, nas montanhas, a um grupo de guerrilheiros chefiados por Pablo, um homem covarde e violento, e por sua namorada Pilar, uma mulher com extraordinária força de vontade e decisão.

Caberia a Jordan, em hora determinada, mandar para os ares uma ponte importante no tráfico de realimentação das tropas. No grupo em que se engaja, vive bela jovem, Maria, traumatizada por haver sido estuprada por soldados fascistas e cujos pais foram mortos pelos inimigos.

Ao longo de uma espera de apenas quatro dias, todo o tempo do livro, com o aproximar do perigo, cresce a ligação de Maria e Jordan e os dois terminam apaixonados. Na véspera do dia maior da ação, quando existe a possibilidade de nenhum deles sobreviver, encorajada por Pilar, Maria dorme com Jordan pela primeira vez, sob a luz das estrelas. Bela história, digna de profundas reflexões quanto ao viver, um marco na melhor literatura.

Depois desse livro, quis conhecer outros, de autoria de Hemingway, o que não tirei por menos, e devorei, à medida em que me vieram às mãos, O velho e o mar, Contos, Paris é uma festa, Adeus às armas, Do outro lado do rio entre as árvores, As neves do Kilimanjaro, As ilhas da corrente e mais alguns. Esquecia do tempo e dos estudos regulares lendo essas obras, fascinado que me achava pelos mistérios da literatura universal.

Percorri, depois, centenas e centenas de páginas, a buscar o prazer que uma vez descobrira no texto de Por quem os sinos dobram, o que, no entanto, confesso, raras vezes repeti do mesmo tanto.

2 comentários:

Armando Rafael disse...

Emerson:
Este livro também marcou a minha adolescência.
Quem quer que o tenha lido guardá-lo-á para sempre, na memória...
O livro não se restringe a descrever a crueldade da Guerra Civil Espanhola, com a cena da matança dos "fascistas", pelos “humanitários e igualitários” comunistas... Depois foi a vez dos “fascistas” vingar-se dos horrores que no começo os comunistas espanhóis perpetraram contra homens cujo crime único era serem proprietários e pessoas de boa situação social.
Não é o mesmo discurso hoje?
Não são as mesmas divisões hoje entre os homens e as instituições?
Toda divisão entre duas pessoas ou entre duas facções é uma divisão da humanidade.

Hermingway escreveu “Por quem chora aquele sino? Aquele sino chora por ti... por todos nós”. Com isso ele mostrou a unidade da humanidade.
Somos um todo, e tudo quanto afeta qualquer das partes afeta de um modo ou de outro todas as demais.

Até Raul Seixas – o maluco beleza – compôs uma música com o título “Por quem os sinos dobram”, onde tem uma estrofe:

“É sempre mais fácil achar que a culpa é do outro
Evita o aperto de mão de um possível aliado, é...
Convence as paredes do quarto, e dorme tranqüilo
Sabendo no fundo do peito que não era nada daquilo”

Ganham destaque as palavras do Cristo Jesus, no Sermão da Montanha:
“Bem-aventurados os que são brandos, porque possuirão a Terra". (Mateus, cap. V, v. 4.) "Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus”. (Id., v. 9.)

Marcos Vinícius Leonel disse...

Grande texto!

Já estou ansioso por outras considerações suas sobre outros livros, como também já retirei o livro da estante para um novo olhar.

Aguarde artigo meu sobre sua última publicação, que tenho apreciado bastante.

Abraços