Sofia é igual. Tem quatro membros, cabeça e o tronco. Cada movimento que realiza se compara ao realizado ou em realização por outra pessoa. Sua respiração, a apreensão de objetos pelas mãos, a boca como o centro do reconhecimento, os olhos atentos ao que suas mãos tateiam e a enorme variedade como que algo novo passa a ser um foco de atenção. Por isso os adultos dizem: as crianças cegam, quando menos se espera elas estão mexendo em coisas perigosas.
Sofia aos nove meses é muito diferente de tudo o que já conheci. Como o filhote de pingüim no coletivo da geleira é reconhecido pela mãe. Como alguém na multidão. Feito um indivíduo ao longo de milhares de gerações. Olhando para Sofia imaginaria que a singularidade poderia ser o átimo de tempo que é só dela. Que o espaço em que se realiza seja o diferencial por trás de sua individualidade. Sofia apenas como ser do tempo e do espaço, no entanto, não explica toda esta diferença que percebo nela.
Antes de ir adiante, não encontro razão no seu patrimônio genético. Eis outro mito da modernidade sobre a individualidade de Sofia. Ela não é um pré-projeto, já inscrito na mistura de seus pais. Nem lembro as mutações que continuamente ocorrem, isso não é o grande diferencial. Apenas que o código genético é insuficiente (ou a escala boçal do hiposuficiente) para explicar Sofia. Assim como a adição de tempo e espaço (fenotípica), história e cultura.
Sofia é diferente pois parte do movimento, mas não apenas por isso. Por exagerado que possa parecer, tão logo que Sofia pegou num penduricalho da bolsa da avó e toda a sua concentração se voltou para pendular os tais, revelou-se a parte do movimento que não explica Sofia. Pois Sofia é quem explica o movimento. Estava claro que Sofia é um dos seres que, por iniciativas próprias, promovem o movimento do mundo. Tal qual como é hoje e como poderá ser amanhã. E certamente será diferente como Sofia é.
Sim, não caia no mito que o mundo é feito por vencedores e vencidos. Isso é categoria de investimento financeiro. De aplicação de capitais. Do mesmo modo o mundo não é uma corrida para um ponto de chegada. Isso é categoria de projeto. Nem tampouco uma disputa entre partes. Isso é categoria de jogo. O mundo se move ora por diferenças com tendências a se concentrar numa trajetória ou a se dispersar por iniciativas que acentuam as diferenças. Assim Sofia é uma diferença notável na iniciativa e na natureza do movimento.
Sofia como parte do conhecimento tem outra natureza pois poderá se traduzir ou não em outras pessoas. Isso é uma categoria de sucesso social e histórico, mas tampouco é uma necessidade em si do mundo. Poderia até ser uma necessidade das pessoas, mas desde que reconhecida por tal. Se ninguém a reconhecer, se não se reproduzir em outras pessoas, inclusive em Sofia, o fenômeno traduzido em conhecimento mesmo assim existe, se encontra no mundo, apenas não experimentado em conhecimento.
Um comentário:
Caro José do Vale a sua crônica é simplesmente sublime. Leitura mais do que deliciosa.
abraços
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