Depois de um longo tempo de sumiço
eis que reencontro minha pequena lagartixa
aos pulinhos tentando alcançar a lixeira da cozinha.
Um corpo esbelto,
escamas brilhantes -
Quem lhe passou verniz?
Declaro-me novamente
apaixonado por seu estresse
e sua indiferença.
Minha lagartixa mesmo se alimentando
da sobra daquele peixe frito do almoço
e bebendo daquela água gelada
não me oferece a cauda
para que lhe enfie um anel de brilhante.
Sempre desconfiada.
Altiva.
Distante.
Como ela cresceu.
Outra menina.
9 comentários:
Domingos, meu domingo ficou um "sábado massa" após ter lido, obrigada.
(...no rabo?!esses bichinhos não gostam do rabinho preso.)
Marta, quando li o seu comentário, o pensamento (e memória) que me veio à mente foi que a única lagartixa que teria visto até hoje com o rabinho livre teria sido uma que vi - na minha infância - após ter o rabinho decepado pelas crianças com quem eu brincava... Felizmente a lagartixa escapou... Espero que lhe tenha crescido outro rabinho e que esse tenha ficado preso até ao fim.
Então Tiaguinho, quando o poeta disse "para que lhe enfie um anel", me ocorreu a imagem de possuidor da lagartixa encoleirada, por isso disse que o bichinho não gosta de rabo preso. Talvez o enfiar do poeta tenha dado esse tom. Ou ele faz um anel pra caber no dedo dela, sei lá, já que não aceita "enfiado" no rabo.
Você me trouxe outra faceta desse conto poético, gostei, cada cabeça uma sentença.
Aliás, deve ser mais fácil decepar-lhe a cauda do que tentar colocar um anel nela, analogicamente ao poema de Domingos, exige trabalho pra gerar elucubrações em quem lê.
Outra coisa, o desejo dele de dar-lhe um anel de brilhante, pôxa, motivo para sentir-se lisongeada.
Ah, essas lagartixas fêmeas envernizadas...
Meus abraços barrosos.
Quando era criança, minha mãe contava-me história de ninar. Uma delas era sobre uma criança que foi raptada por uma bruxa. A bruxa, que era mípoe, por sinal, a alimentava com o intuito de quando ela estivesse com o peso ideal, pudesse cozinhá-la no caldeirão para fazer uma porção mágica. Como a bruxa não enxergava muito bem, ela enfiava um anel no dedo da menininha para ver se ela já estava no ponto. A criança, muito sagaz, pegou um rabinho de lagartixa e a oferecia em vez do dedinho. Assim ela prorrogou o tempo até ser resgatada.
Acho que o poeta se inspirou nesta fábula.
Marta, quem sabe a lagartixa se tenha sentido lisongeada e agradecida mas, lembrando a história de ninar que o Carlos apontou, se tenha sentido receosa de carregar um anel tão brilhante e pesado.
Afinal, tem muitos predadores por aí: uns que não hesitariam em decepar o seu rabinho para roubar seu tesouro e outros que, mesmo desinteressados neste, mais facilmente apanhariam a lagartixa para roubar dela algo mais brilhante e precioso que qualquer anel...
Então Domingos, não leve a desconfiança da lagartixa a peito...
Carlos, a sua história de ninar lembrou-me no clássico 'Hansel e Gretel', escrito pelos irmãos Grimm e que, descobri hoje, foi inspirada num conto de fadas de tradição oral. A única diferença é que no conto dos irmãos Grimm não existe anel. A bruxa miope pede a Hansel para por o dedo fora da jaula e este usa um osso de uma refeição anterior.
Saudações a todos.
Tiago,
Não conheço o conto dos irmãos Grimm, mas acho que eles se inspiraram de fato nos contos de fada difundidos pela tradição oral, notadamente no medievo. Valeu pelas suas informações.
Saudações poéticas!
Tem preço?
Essa nossa viagem poética tem preço?
Magia? sim, e das boas.
Marta F., Tiago, Rafael -
eu ouvia vossas almas quando escrevi esse poema.
Um abraço carinhoso a todos -
manda eu e também a lagartixa.
Quanto ao anel, bem, o anel...
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