TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

terça-feira, 21 de julho de 2009

Entre a Serra do Mar e a Mantiqueira - Parte 2 - A economia no império


Paineiras junto à estrada dos tropeiros, entre Arapeí e Bananal

Entre o final do século XVII e XVIII o Vale do Rio Paraíba surge no panorama da Colônia. Foi parte do ciclo do ouro como trânsito dos tropeiros. O vale já havia sido em parte ocupado pelos agricultores que sobreviviam muito precariamente na bacia de Taubaté no lado paulista e daí em forma de entradas e bandeiras subiram as serras, inclusive fundando a vila de Piratininga a futura São Paulo. A casa de fundição do ouro em Taubaté foi importante meio de fixação de recursos na região. Somente em um ano, 1696/97 a fundição arrecadou para os cofres reais mais de 13 arroubas de ouro fundido. Deste capital é que surgiram os engenhos de açúcar de Guaratinguetá, Lorena e Jacareí, com mais de 170 estabelecimentos.

Apenas por volta dos anos 30 do século XIX é que o Vale se torna o grande motor do império com ciclo do café. Dele surgem os recursos para modernizar a cidade do Rio de Janeiro e São Paulo. Ali o Brasil forjou o estilo de sociedade que ainda repercute nos dias de hoje. Uma sociedade escravista de exploração do trabalho até o limite das forças físicas, mas voltado para a corte na Europa. Um estilo que transferiu enormes quantidades de trabalho sobre a forma de grãos, manufaturados e minerais. Ao invés deste trabalho se aplicar ao território brasileiro, ele se transferiu sobre a forma de capitais e mercadorias.

Fato raro: um túmulo para escravos dentro do cemitério da cidade em São José do Barreiro - SP.

O resultado é um país com pouca fixação de capitais, estrutura pública sempre inferior às necessidades, poucas obras públicas, educação e saúde precárias, baixa qualidade das moradias e da vias urbanas, ao lado de palacetes exuberantes. Formaram-se duas estruturas em permanente conflito: uma elite bem remunerada cuja capacidade política era restrita praticamente à manutenção das enormes plantações e um povo escravizado ou semi-escravizado consumido por horas de trabalho.

Um grande plantador de café ficava na belíssima casa da fazenda, com toda a família, dedicada praticamente á reprodução do modelo. Regularmente algum membro entrava nas hostes da igreja ou no bacharelato.


Casa grande da fazenda de café entre Barra Mansa e Bananal

A família ficava seis meses na casa grande do cafezal e uma vez terminado o ciclo da colheita, recolhia-se a palacetes suntuosos nas cidades que emergiam no vale. Em Bananal, no Estado de São Paulo, fronteira com o Rio, uma Barão do Café tinha um palacete para os seis meses das entre safras onde realizava festas de negócio até para os grandes comerciantes europeus. Nestes palacetes nas grandes festas vinha até gelo da cidade do Rio, transportado por barcos até Angra dos Reis ou Parati e depois no lombo de muares atravessando a Serra do Mar ou Serra da Bocaina.

Palacete urbano de um barão do café na cidade de Bananal

Os escravos se multiplicavam nas senzalas, dedicados ao campo agrícola e pecuário ou às demandas imensas dos palacetes dos Barões. Os pequenos colonos eram marginais, aquela era uma região de latifúndios. O modelo não tinha necessidade de se multiplicar e se diversificar em renda e no nascimento de um capitalismo. Apenas servia para atender ao comércio internacional e os lucros dos barões utilizados na ociosidade das grandes cidades. Parte das rendas do império e do seu governo foi criada com os excedentes dos barões. Os quais jamais poderiam ser dinâmicos e seguir o exemplo de um Barão de Mauá. O modelo seria para eternizar até a crise de superação do local com o cafezal do oeste paulista.

O impacto político deste modelo deve influir até jogo na nossa auto-imagem de nação com o famoso “complexo de vira lata”. Parte da pedagogia do opressor sobre o oprimido (categorias fundamentais do regime escravagista) migrou para a cultura nacional, especialmente em setores da classe média, uma vez “arranjados economicamente”, com um estranhamento subjetivo ao progresso dos mais pobres.

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