TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

terça-feira, 6 de novembro de 2012

A Luta dos Contrários - José do Vale Pinheiro Feitosa


As culturas das grandes civilizações expressam toda a grandeza, no sentido matemático, do que seja uma civilização, isso para contrastar com as culturais tribais de sociedades coletoras e caçadoras ou apenas agrícolas. Uma grande civilização normalmente abriga muito mais contradições, pois as classes dominantes e dominadas são mais claras, a expansão territorial é uma marca, a face guerreira por consequência e principalmente a grande rede de produção e comércio. Por certo entendemos que nessa complexidade dialética se encontra os povos dominados pelas expansões territoriais.

Se pegarmos qualquer manifestação de uma cultura da grande civilização vamos encontrar não só os elementos em conflito como, também, o evoluir desta relação ao longo do tempo. Peguemos o cinema americano como exemplo. Ele expressa toda fricção das classes sociais americanas, sua expansão, seus ciclos econômicos, as transformações urbanas e rurais ao mesmo tempo em que acentua, ao longo do tempo, o papel de fonte de discurso e propaganda do “sonho americano” que é afinal o domínio das elites com a natureza já imperial.

Por isso Hollywood é visto essencialmente como máquina de propaganda da política imperial, fazendo por vezes um discurso escapista em relação à realidade e, por outra, fazendo uma pregação ideológica da elite imperial (incluindo instituições como a indústria, bancos, bolsas de valores, impérios midiáticos, universidades etc.). Não estranhemos esta enorme capacidade de “articular” vontades traduzidas numa inteligência estratégica nem sempre baseada em pessoas isoladamente, especialmente grandes lideranças.

A evolução empresarial globalizada evoluiu de tal modo que apenas 147 empresas dominam 40% das riquezas controladas pelas maiores empresas em todo o mundo. Isso numa escala globalizada é uma dimensão nunca dantes vista na história: 1% das empresas controla uma rede estratégica inteira. Neste sentido até mesmo instituições como o cinema de Hollywood já não é parte do projeto apenas americano, mas de toda a ideologia e cultura forjada pelo comando estratégico de poucos agentes. Embora os EUA sejam a grande fonte do modelo imperial e concentrador, o espírito privatista domina a cultura globalizada especialmente pelas estruturas bancárias que são os representantes majoritários daquele comando de apenas 1% das maiores empresas do mundo. A “austeridade” em prol dos bancos pode gerar a força política contraditória a esse comando privado do mundo e essa é a perspectiva política da atual crise. Os desdobramentos nos dirão.

Dois filmes de produção americana expressam muito bem o evoluir da cultura americana ao longo do século XX e início do atual século. O primeiro é um filme que retrata o breve casamento de Ernest Hemingway e Martha Gellhorn considerada a maior correspondente de guerra americana. A essência desse filme é de um país em expansão, mas vivendo ainda uma crise interna de pobreza que por isso mesmo tinha enorme simpatia pelos povos do mundo em crise. Hemingway como escritor do “Por quem o Sinos Dobram” e Gellhorn como correspondente da revista Collier´s na Guerra Civil Espanhola ainda tinham o espírito de solidariedade social pelos povos. O jornalismo aceitava que correspondentes como Gellhorn fizesse matérias arrasadoras sobre violações humanas mesmo que isso contrariasse e ideologia imperial ou os acordos estratégicos do grande capitalismo americano. O livro da Martha a Face da Guerra relatada toda esta questão.

O outro filme é “O Informante” que aparentemente mostra o poder avassalador da indústria do cigarro americana quando surgiram as evidências que ela manipulava o tabaco para ampliar o vício e que o consumo de cigarro era uma nova forma de epidemia. A indústria como é da natureza de todo cinismo privado reagiu dizendo que não reconhecia o vício e jogava toda a responsabilidade do fumar aos fumantes como se não houvesse essa manipulação física e a de psicologia social através da propaganda e marketing.

O filme trata não apenas do poder desta indústria, mas essencialmente demonstra o quanto a imprensa no ambiente imperial, globalizado e privatista tornou-se a função ideológica da hegemonia estratégica do núcleo (elite) imperial avassalador. A observação da cultura é uma fonte inesgotável do aprendizado histórico e da fricção dialética.

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