Ricardo III ,da
Inglaterra, reinou por um período curtíssimo : entre 1483 e 1485. Sua enviesada
ascensão à coroa , historicamente, parece eivada de crimes e assassinatos, o
que sempre foi comum nas monarquias absolutistas. Para chegar ao trono, na sucessão
de Henrique IV que morrera subitamente, Ricardo precisou dizimar inimigos e, também, candidatos naturais ao cargo, além
de utilizar de manobras jurídicas e armações como a anulação do casamento do
seu antecessor por suposta bigamia. Coroado
, Ricardo levou Ricardo V e o Duque de
York , seus sobrinhos, à Torre de Londres de onde nunca mais voltaram. Mexendo
no instável castelo de cartas dos interesses da aristocracia inglesa,
rapidamente, se iniciou uma enorme campanha contra o rei, sob suspeita de
usurpação do trono e que culminou com a Guerra das Rosas , encabeçada pelo Duque de Buckingham e Henrique Tudor , o Conde
de Richmond. Em agosto de 1485, as tropas leais ao rei e as revolucionárias
do Conde se confrontam na Batalha de Bosworth
Field e Ricardo III termina
abatido no confronto; dando-se início à Dinastia de Tudor. Apesar do reinado
meteórico, ele se tornou , por sua dúbia personalidade, um dos monarcas mais
populares do Reino Unido, tendo sido, inclusive, tema de uma das mais
importantes peças de Shakespeare. Além
de tudo, aumentando a aura de mistério, seu corpo jamais tinha sido encontrado.
Ficou célebre o epílogo shakespeareano em que Ricardo III , a pé, sendo perseguido pela sanha do exército
adversário, cita, no desespero, a famosa
frase : “Meu Reino por um Cavalo !”
No último dia quatro de
fevereiro, quinhentos e vinte e oito anos depois da fatídica batalha, escavações
num estacionamento em Leicester, no centro da Inglaterra, encontraram um
esqueleto que, depois, se confirmou pertencer a Ricardo III. Tinha 32 anos na época da morte, uma profunda
escoliose , sinais de trauma craniano por objeto cortante e uma ponta de flecha entre as vértebras.
Exames científicos como Datação pelo Carbono 14 e DNA confirmaram o fim do
mistério que já varava meio milênio.
Ricardo III estava inumado num simples estacionamento e seu esqueleto
não carregava quaisquer diferenças que por acaso o distinguissem de qualquer um
dos mais humildes plebeus do seu reino. A confirmação da sua identidade , pelo exame
de DNA, foi através da comparação com um dos seus últimos descendentes : Michel Ibsen, um marceneiro canadense,
radicado em Londres e que não carrega consigo nenhum traço de nobreza esperado para um remanescente da Casa de York. O pretenso sangue azul que por acaso teria corrido
nas suas veias, também, não tingiu a ossada encontrada, nem a tornou mais
colorida e menos opaca do que os remanescentes de qualquer mendigo da
Inglaterra. Na morte não há castas: é de pó que são construídas todas as
coisas. Vaidade, riqueza, poder , ambição, egoísmo acabam todos no fim da
batalha, quando o golpe de misericórdia já está armado e nós trocaríamos todas
elas por um cavalo que nos levasse para
bem longe do equitativo reino do nada, da
escuridão e do pó.
J. Flávio Vieira
Um comentário:
Muito bem, Flávio Vieira. Eu até me lembrei de Ricardo Terceiro, que recentemente encontraram o seu esqueleto : "Meu reino por um cavalo..."
Postar um comentário