RELEMBRANDO
UM “PEQUENO GRANDE GESTO" (da série, recordar é viver) - José Nilton
Mariano Saraiva
E de repente, de uma área não muita afeita a
manifestações da espécie, porquanto povoada por “machões sarados”,
aparentemente embrutecidos, e ainda por cima praticantes de um esporte onde o
contato físico forte e ríspido é uma constante, uma atitude inusitada, um laivo
de ternura e afeto, um “PEQUENO GRANDE GESTO”, que parece ter passado
despercebido pela maioria dos que o vivenciaram, ao vivo ou via telinha (pelo
menos não se ouviu ou se leu nada, a respeito).
Deu-se na
frienta noite londrina do dia 28.05.2011, no novo e monumental estádio de
Wembley, por ocasião da partida final da Copa dos Campeões da Europa 2010/11,
quando se enfrentaram as tradicionais e caras esquadras do Barcelona (Espanha)
e Manchester United (Inglaterra), dois dos maiores expoentes do mundo
futebolístico da atualidade. Final: Barcelona 3 x 1 Manchester United.
Aos fatos.
Quase ao final do aguardado confronto, que mobilizou adeptos do futebol em todo
o mundo (aos 43 minutos do segundo tempo) com o jogo já definido e o título
assegurado em favor do excepcional Barcelona (3 x 1), o técnico Guardiola
(ex-jogador do próprio clube), numa atitude de grandeza e desprendimento,
resolve prestar uma justa homenagem ao seu correto “capitão”, o aguerrido
zagueiro PUYOL, que, lesionado, não tivera condição de adentrar ao gramado, de
início; então, faltando dois minutos para o término da pugna, convoca-o a
substituir um companheiro, com o claro intuito de, naquele momento maior, no
ápice daquela gloriosa jornada, braçadeira de capitão no braço, fazê-lo erguer
o troféu de campeão e, consequentemente, aparecer para a posteridade nas TVs de
todo o mundo, ao vivo e a cores, e na primeira página dos principais jornais do
mundo, dia seguinte.
Providenciada a substituição, daí a pouco o juiz determina o término da
partida. E foi então, no momento da premiação, ante um batalhão de fotógrafos e
centenas de canais de televisão de todo o mundo, que deu-se o inusitado, aquilo
que denominamos um “PEQUENO GRANDE GESTO”,
pelo espontaneidade e nobreza do ato: o guerreiro PUYOL, evidentemente
que fugindo do script armado pelo técnico Guardiola, mostra toda a sua
humildade e excelência de caráter ao abdicar de tamanha honraria ao delegar ao
discreto companheiro ABIDAL (lateral esquerdo), o privilégio de erguer o
troféu, como se fora o verdadeiro “capitão” da equipe catalã.
Explica-se: meses atrás, ABIDAL fora desenganado pelos médicos, em razão da descoberta
de uma grave e normalmente letal enfermidade (“câncer” no fígado) e fora
afastado sumariamente das atividades esportivas; agora, após um tratamento pra
lá de penoso, ali, ante um estádio ocupado por 80 mil pessoas e com a partida
sendo transmitida pra bilhões de telespectadores em todo o mundo, além da
confiança do técnico Guardiola em escalá-lo e mantê-lo durante toda a partida, PUYOL,
o “capitão” de todos eles, que entrara ao final do jogo unicamente pra
“exercitar o que lhe conferia a patente”, humilde e simbolicamente transferia
pra ele, ABIDAL, o privilégio de erguer o troféu de campeão.
Uma cena de cortar corações e levar qualquer um às lágrimas (embora alguns
teimem em afirmar que “homem que é homem não chora”). Pois, acreditem, não
resistimos à cena e “abrimos o berreiro” (e prestamos esse depoimento, sem
nenhum constrangimento).
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