TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

domingo, 28 de fevereiro de 2016

O "CATECISMO" DO JUIZ MORO - José Nílton Mariano Saraiva

Na Itália, no alvorecer de 1992, foi deflagrada a Operação Mãos Limpas (Mani Pulite), visando o combate à corrupção, que provocou prisões, suicídios, quebradeira generalizada, mortes e a própria desestabilização socioeconômica do país. Para alguns, vitoriosa, fato é que ao seu final emergiu como “salvador da pátria” ninguém menos que o comprovadamente mafioso e corrupto empresário midiático Sílvio Berlusconi, num redesenho político por ninguém esperado. Como que a contestar o sucesso da Operação Mani Pulite, hoje, no país comandado pelo poderoso primeiro ministro-bandido Sílvio Belusconi, a corrupção não arrefeceu e continua a reinar, apesar do colapsar de tradicionais partidos políticos.

Tudo a ver com o atual quadro reinante no Brasil, onde a Operação Lava Jato, comandada pelo “deslumbrado” juiz de primeira instância, Sérgio Moro, interfere de modo cruel na economia e na política, literalmente paralisa o país, e atenta contra a própria democracia, já que a Constituição Federal é dia a dia desrespeitada; dentre outros direitos, por exemplo, acabou a presunção de inocência, assim como a obrigatoriedade de provas para se prender alguém é ignorada. A “perseguição implacável e sistemática” a um ex-presidente é diuturna e escancarada, objetivando não permitir que algum dia volte nos braços do povo. E quando se pensava que o Supremo Tribunal Federal poria um fim nos comprovados excessos do juiz Sérgio Moro, a única manifestação conhecida daquela corte foi de apoio, quando a ministra Rosa Weber, durante um dos julgamentos de presos políticos, asseverou: “Não tenho prova cabal contra José Dirceu, mas vou condená-lo porque a literatura jurídica me permite”. E assim foi feito. E ficou por isso mesmo. Quantos mais serão presos por simples presunção de que trafegaram na contramão da legalidade, já que provas não mais são necessárias ???

Para que compreendamos O “Catecismo” do Juiz Moro, que teve como “musa inspiradora” a Operação Mãos Limpas (Mani Pulite), e em que se ancora para estuprar a Constituição Federal à vontade (sem que ninguém se lhe anteponha), abaixo trechos do seu extenso arrazoado “Considerações sobre a Operação Mani Pulite”. Qualquer semelhança com a desonesta ofensiva contra o PT e Lula da Silva, não é mera coincidência. É um propósito claro e definido: acabar com a agremiação e desmoralizar seu ícone maior (um dos maiores Presidentes da República que o Brasil já teve). O perigo é que, tal qual lá (na Itália) cá (no Brasil) surja um corrupto Sílvio Berlusconi (genérico), gestado no raivoso ventre oposicionista. E o resultado, certamente, será catastrófico. Confiram o que pensa (e operacionaliza) o deslumbrado Juiz Moro:

A operação “mani pulite” (mãos limpas) redesenhou o quadro político na Itália. Partidos que haviam dominado a vida política italiana no pós-guerra, como o Socialista (PSI) e o da Democracia Cristã (DC), foram levados ao colapso, obtendo, na eleição de 1994, somente 2,2% e 11,1% dos votos, respectivamente. Talvez não se encontre paralelo de ação judiciária com efeitos tão incisivos na vida institucional de um país”.

A deslegitimação da classe política propiciou um ímpeto às investigações de corrupção e os resultados desta fortaleceram o processo. Consequentemente, as investigações judiciais dos crimes contra a Administração Pública espalharam-se como fogo selvagem, desnudando inclusive a compra e venda de votos e as relações orgânicas entre certos políticos e o crime organizado. As investigações “mani pulite” minaram a autoridade dos chefes políticos – como Arnaldo Forlani e Bettino Craxi, líderes do DC e do PCI – e os mais influentes centros de poder, cortando sua capacidade de punir aqueles que quebravam o pacto do silêncio. O PROCESSO DE DESLEGITIMAÇÃO POLÍTICA FOI ESSENCIAL PARA A PRÓPRIA CONTINUIDADE DA OPERAÇÃO MANI PULITE”.

Os responsáveis pela operação “mani pulite” (mãos limpas) AINDA FIZERAM LARGO USO DA IMPRENSA. Com efeito: para o desgosto dos líderes do PSI, que, por certo, nunca pararam de manipular a imprensa, a investigação da Mani Pulite VAZAVA COMO UMA PENEIRA. Tão logo alguém era preso, detalhes de sua confissão eram veiculados no L'Expresso, no “La República” e outros jornais e revistas simpatizantes. Apesar de não existir nenhuma sugestão de que algum dos procuradores mais envolvidos com a investigação teria deliberadamente alimentado a imprensa com informações, OS VAZAMENTOS SERVIRAM A UM PROPÓSITO ÚTIL. O CONSTANTE FLUXO DE REVELAÇÕES MANTEVE O INTERESSE DO PÚBLICO ELEVADO E OS LÍDERES PARTIDÁRIOS NA DEFENSIVA. Bettino Craxi, especialmente, não estava acostumado a ficar na posição humilhante de ter constantemente de responder a acusações e de ter a sua agenda política definida por outros. A publicidade conferida às investigações teve o efeito salutar de alertar os investigados em potencial sobre o aumento da massa de informações nas mãos dos magistrados, favorecendo novas confissões e colaborações. Mais importante: GARANTIU O APOIO DA OPINIÃO PÚBLICA ÀS AÇÕES JUDICIAIS, impedindo que as figuras públicas investigadas obstruíssem o trabalho dos magistrados, o que, como visto, foi tentado. HÁ SEMPRE O RISCO DE LESÃO INDEVIDA À HONRA DO INVESTIGADO OU ACUSADO”.

A estratégia de investigação adotada desde o início do inquérito SUBMETIA OS SUSPEITOS À PRESSÃO DE TOMAR DECISÃO QUANTO A CONFESSAR, espalhando a suspeita de que outros já teriam confessado e levantando a perspectiva de permanência na prisão pelo menos pelo período da custódia preventiva no caso da manutenção do silêncio ou, vice-versa, de soltura imediata no caso de uma confissão (uma situação análoga do arquétipo do famoso dilema do prisioneiro)”.

Além do mais, havia a DISSEMINAÇÃO DE INFORMAÇÕES sobre uma corrente de confissões ocorrendo atrás das portas fechadas dos gabinetes dos magistrados. Para um prisioneiro, a confissão pode aparentar ser a decisão mais conveniente quando outros acusados em potencial já confessaram ou quando ele desconhece o que os outros fizeram e for do seu interesse precedê-los. Assim, o ISOLAMENTO NA PRISÃO ERA NECESSÁRIO PARA PREVENIR QUE SUSPEITOS SOUBESSEM DA CONFISSÃO DE OUTROS: dessa forma, acordos da espécie “eu não vou falar se você também não” não eram mais uma possibilidade. Há quem possa ver com maus olhos tal estratégia de ação e a própria “delação premiada””.

Usualmente é ainda levantado outro óbice à delação premiada, qual seja, a sua REDUZIDA CONFIABILIDADE. Um investigado ou acusado submetido a uma situação de pressão poderia, para livrar-se dela, mentir a respeito do envolvimento de terceiros em crime. Entretanto, cabível aqui não é a condenação do uso da delação premiada, mas sim tomar-se o devido cuidado para se obter a confirmação dos fatos por ela revelados por meio de fontes independentes de prova”.

A prisão pré-julgamento é uma forma de se destacar a seriedade do crime e evidenciar a eficácia da ação judicial, especialmente em sistemas judiciais morosos. Desde que presentes os seus pressupostos, não há óbice moral em submeter o investigado a ela. As prisões, confissões e a publicidade conferida às informações obtidas geraram um círculo vicioso, consistindo na única explicação possível para a magnitude dos resultados obtidos pelo operação Mani Pulite”.

O que é necessário dizer e que, de todo modo, todo mundo sabe, é que a maior parte do financiamento da política é irregular ou ilegal. Os partidos e aqueles que dependem da máquina partidária (grande, média ou pequena), de jornais, de propaganda, atividades associativas ou promocionais têm recorrido a recursos adicionais irregulares. Se a maior parte disso deve ser considerada pura e simplesmente criminosa, então a maior parte do sistema político é um sistema criminoso”.

Talvez a lição mais importante de todo o episódio seja a de que a ação judicial contra a corrupção só se mostra eficaz enquanto ela contar com o apoio da opinião pública, com condições de avançar e apresentar bons resultados. Se isso não ocorrer, dificilmente encontrará êxito. Por certo, a opinião pública favorável também demanda que a ação judicial alcance bons resultados. Somente investigações e ações exitosas podem angariá-la. Daí também o risco de divulgação prematura de informações acerca de investigações criminais. Caso as suspeitas não se confirmem, a credibilidade do órgão judicial pode ser abalada”.


A presunção de inocência, no mais das vezes invocada como óbice a prisões pré-julgamento, não é absoluta, constituindo apenas instrumento pragmático destinado a prevenir a prisão de inocentes. Vencida a carga probatória necessária para a demonstração da culpa, aqui, sim, cabendo rigor na avaliação, não deveria existir maior óbice moral para a decretação da prisão, especialmente em casos de grande magnitude e nos quais não tenha havido a devolução do dinheiro público, máxime em país de recursos escassos. Mais grave ainda, no Brasil, a prisão pós-julgamento foi também tornada exceção, para ela exigindo-se, por construção jurisprudencial, os mesmos pressupostos da prisão pré-julgamento”.

De fato, escândalos políticos não colocam em questão apenas a legitimidade da classe política; eles também têm um impacto na legitimidade daqueles encarregados de investigá-los: a magistratura. Em alguns casos, de fato, a descoberta de ilegalidade disseminada provoca críticas ao sistema judicial no sentido de que este estaria sendo inadequado para combater a corrupção. Daí, por evidente, o valor, com seus erros e acertos, do exemplo representado pela operação “mani pulite”.

Não deixa ainda de ser um símbolo das limitações da operação “mani pulite” o cenário atual da política italiana, com o cargo de primeiro-ministro sendo ocupado por Silvio Berlusconi. Este, grande empresário da mídia local, INGRESSOU NA POLÍTICA EM DECORRÊNCIA DO VÁCUO DE LIDERANÇAS PROVOCADO PELA AÇÃO JUDICIAL e mediante a constituição de um novo partido político, a Forza Itália. Não obstante, o próprio Berlusconi figura desde 1994 entre os investigados pelos procuradores milaneses por suspeita de corrupção de agentes fiscais. Além disso, era amigo próximo de Craxi (este foi padrinho do segundo casamento de Berlusconi). Tendo ou não Berlusconi alguma responsabilidade criminal, não deixa de ser um paradoxo que ele tenha atingido tal posição na Itália mesmo após a operação mani pulite”.

No Brasil, encontram-se presentes várias das condições institucionais necessárias para a realização de ação judicial semelhante. Assim como na Itália, a classe política não goza de grande prestígio junto à população, sendo grande a frustração pelas promessas não-cumpridas após a restauração democrática”.



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