Mulheres,
na opinião do escrito Fábio Hernandez, não apreciam gentileza masculina
Este texto o tomei de uma postagem no site
Diário do Centro do Mundo. É uma lição de texto bem escrito e humorado. Têm o
dom de irritar algumas mulheres, mas é revelador do espírito humano sempre a se
justificar achando que foi injustiçado por suas atitudes. Notem no final que
autor com uma sutileza de fazer inveja desvela suas gafes ao não pretender dar
lições enquanto bebe champanhe francês.
Algumas mulheres já me disseram que sou um
homem gentil. Curiosamente, todas disserem isso antes de me deixar. Penso que é
o mesmo raciocínio usado por alguns homens que dizem “Você é a mulher mais
inteligente que conheci” antes de dar no pé.
De modo que comecei a acreditar que ser
gentil era um defeito.
Nadja, minha namorada, recentemente andou
jogando esta conversa de novo para o meu lado e pensei: mais uma que se vai.
Foi em um restaurante. O restaurante era
condecorado, ela estava linda, com um vestido novo. Havia um clima festivo no
ar e eu me sentia bem.
No entanto, percebi que no decorrer do
jantar o clima começou a pensar. Ela, de repente, ficou implicante, disse que
queria ir embora e me apunhalou: “Você é gentil, mas não presta atenção”.
Gelei. Lá vinha a história macabra da
gentileza. “O que você quer dizer com isso, gentil? Não sou gentil, não”,
defendi-me prontamente.
“Você é, sim, não me venha com essa”,
afirmou, como se me acusasse de ter devorado todo o chocolate da despensa. “Só
que é gentil como os porteiros são, como manobristas são. É uma gentileza
impessoal, asséptica.”
Já tinha visto aquele filme. Era um filme
sem legendas, falado em turco. Que diabos aquela mulher estava tentando me
dizer? Nadja não brinca em serviço, seu recado era sério e eu não conseguia
entender patavina.
Ela detonou a bomba: “Hoje é nosso
aniversário de namoro. Hoje, exatamente hoje. Te disse isso na semana passada”.
Ela disse? Ela
disse. Me senti miserável. Sempre era a mesma coisa. Ela me avisava um pouco
antes e eu me esquecia logo depois.
Por que eu vivia cometendo esse ato falho?
“É seu pavor com compromissos”, explicou-me Nadja didaticamente. “Você esqueceu
a data e acha que não namora comigo há anos.”
Ah! Meu Deus, lá vinha ela trazendo Freud
para sentar conosco. Freud. Aqui. NÃO! Nadja.
Este ano, tenho de admitir, ela vinha
fazendo um trabalho de marketing já há alguns dias para evitar frustrações.
Mostrou-me o vestido novo, falou-me deste restaurante…
Meus Deus, como fui estúpido! Como pude
esquecer e deixar-me flagrar nesse erro anual?
“Nadja, por que você faz isso comigo?”,
perguntei. “Por que você faz com que eu me sinta miserável?”
Ela encarou-me com os olhos marejados,
levantou as sobrancelhas em um último arroubo de orgulho e devolveu: “Porque
você faz eu me sentir uma romântica ridícula e frustrada?”
Tenho medo pânico de mulher frustrada. Ela
é capaz de destruir tudo num raio de 100 quilômetros só com a amargura que
carrega no coração.
Não quero amar uma mulher frustrada, não
quero me sentir incompetente o tempo todo.
Por que é tão importante que eu me lembre
de uma data? Por que, afinal, ao abrir os olhos naquela manhã tão ilustre, ela
apenas não me estalou um beijo e disse “benzinho, é nosso aniversário”, em vez
de me armar uma emboscada – na qual caio todos os anos?
Lembrei-me de Felix, um velho amigo, que
diz que as mulheres sentem um prazer perverso em se fazer de mártires nos
martirizando.
E por que, finalmente, tenho de executar a
fantasia romântica dela como ela quer? Para mim, aquele dia, fosse ele 12, 14
ou 31 de setembro, tinha todos os ingredientes para ficar gravado em nossa
memória como uma noite inesquecível. Falhei em algum ponto do roteiro que ela
tinha escrito, mas que eu queria continuar no filme, não ia largar o papel.
“Quer saber, Nadja?”, falei como que
tomado por um novo espírito. “Você não vai acabar com a minha noite, de maneira
alguma.”
O espírito era de Humphrey Bogart. Freud
tinha saído sem pagar a parte dele. Levantei o braço, fiz um gesto magnânimo:
“Garçom, uma Veuve Clicquot”. Durão. Decidido.
Nadja me olhou com um brilho novo nos
olhos. Sorriu. Pegou na minha mão. “O que vamos comemorar?”, perguntou.
“Nadja”, respondi triunfante.
Rimos do trocadilho infame. Foi uma noite
e tanto. Acho que Nadja aprendeu uma lição aqui com o Humphrey Bogart, e eu…
bem, eu aprendi a nunca dar lições a ninguém bebendo champanhe francês. Mas é o
preço que se paga quando se quer ser gentil.
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