Aliando discrição, simplicidade e traços de nobreza, ao nascer ela
já conseguira o que parecia impensável: a unanimidade sobre sua beleza e suas
formas perfeitas, suas graciosas curvas e sua postura real, responsáveis por
sua caracterização como uma “gracinha”, autêntica “jóia”, detentora de um
charme indescritível, um verdadeiro presente dos deuses.
Embevecidos e orgulhosos, os cratenses sentíamos imensa satisfação
em mostrá-la aos que aqui aportavam, em visitá-la periodicamente ou, simplesmente,
em transitar à sua frente ou arredores, admirando-a e inflando o nosso ego com
o que as pessoas dela comentavam; e, se distantes nos encontrávamos do torrão
natal por algum motivo, não cansávamos de citá-la em conversas informais, ou mesmo
recomendá-la aos que pretendiam visitar a cidade do Crato.
E assim sua fama cresceu, atravessou fronteira, espraiou-se rincões
afora. O astral era tamanho e a curiosidade tanta, que todos nutriam o desejo
interior de algum dia conhecê-la, mesmo que por um fugidio e único momento, para
simplesmente comprovar tudo o que dela diziam. E, vindo, e vendo-a, saiam
satisfeitos, radiantes, solidários, a difundi-la por outras plagas. Era,
realmente, de uma beleza ímpar, diferente... avançada para os padrões da época.
Com o passar do tempo, entretanto, dada à inexorabilidade do ciclo
normal da natureza, naturalmente a jovem cresceu, adolesceu, virou adulta,
transmutou-se e viu processar-se o arrefecimento de ânimo, o rareamento das manifestações
de simpatia; a chegada da rotina, enfim, acabou com o seu encanto e tornou-a
“normal”; além do que, por falta de carinho, cuidados e incentivos, seu aspecto
físico compreensivelmente decaiu a olhos vistos, enquanto outras beldades, turbinadas
por energéticos e vitaminas que a ela passaram a ser negadas, apareceram ao
longo do caminho, tomando-lhe o lugar e adeptos, deixando-a no ostracismo e na
saudade.
Os que deveriam zelar e dela cuidar, simplesmente a abandonaram
criminosamente, deixando-a por muito tempo ao relento, exposta ao sol, chuvas e
trovoadas, enquanto seu habitat natural foi indiscriminadamente invadido e ocupado
por companhias nada recomendáveis, sufocando-a sem dó nem piedade.
Hoje, sua imagem é de dá pena e dó e dela até temos vergonha: isolada, acanhada, decadente, sitiada,
decrépita, evitada pelos antigos admiradores e também pelas novas gerações,
abandonada pelo poder público, ela é o retrato mais que preciso, emblemático e
pujante daquilo em que transformaram o Crato ao longo desses 40 anos: uma cidade
semi-fantasma, sem perspectivas, sem futuro, sem nada, e a reboque de migalhas
governamentais.
Quem te viu e quem te vê, Rodoviária do Crato !!!
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