J. Flávio Vieira
O retorno de Marilu , algo
inesperado, causou um reboliço danado no Sítio Bréa. Tinha sido uma das
primeiras moças a sair dali, para
trabalhar na cidade grande. Ainda adolescente, meio rebelde, andou brigando com
a família, por conta de uns namoros fora dos padrões breenses e, aumentando o conflito, preferiu , de comum
acordo com os pais, partir para um voo solo em Matozinho. Marilu tinha lá seus
dezoito aninhos e carregava consigo aqueles arroubos típicos da idade. Bonitinha,
atirada, arranjou um emprego de doméstica na casa do Coronel Anfrízio Arnaud.
Trabalharia durante o dia e , à noite, estudaria no Colégio Municipal Pedro
Cangati. Mais de três anos já se tinham
escorrido, quando a notícia da volta da
filha pródiga espalhou-se pela Bréa. As colegas de Marilu se alvoroçaram. Tinham-na
como um ídolo e aquele regresso imprevisto trazia junto uma fatia de desilusão.
Mundo aberto à frente, todas as amigas carregavam consigo a possibilidade de um
dia plainarem igual a Marilu. O aparente
fracasso dela, assim, esparramava uma certa frustração na alma de todas. O que
teria acontecido ? Seria o mundo lá fora tão inóspito ?
Na
primeira oportunidade, procuraram Marilu. Queriam matar a curiosidade e,
também, saber as novidades da cidade grande que só recebiam pelo Rádio. Muitas
sonhavam em varar o mundo, seus sonhos dourados de adolescente não cabiam nas
fronteiras opressivas daqueles cafundós. O aparente fracasso da desbravadora , de
alguma maneira, as angustiava . O que tinha dado errado na travessia de Marilu
? Conversa vai, conversa vem, após
quebrar-se o gelo que a ausência terminou por acumular, a entrevista
transformou-se num papo de comadres, como nos velhos tempos.
A
desbravadora contou detalhadamente a vida em Matozinho. Havia um visível deslumbramento
em cada detalhe que ia explanando. Guardadas as devidas proporções, para quem o
universo se resumia à Bréa, Matozinho
investia-se de ares de metrópole. Marilu contou que trabalhava duro durante o
dia, ia à Escola à noite e voltava ali por volta das dez horas. Nos fins de
semana ia à missa e frequentava a praça da matriz. Algumas vezes foi a alguns
sambas numa palhoça que foi inaugurada perto do açude do Sabugo. Fez amizades
com algumas colegas de classe, já desarnadas e metidas na vida boêmia. Através
delas, tomou conhecimento de uma Buate
de nome Arupemba , recém inaugurada. Lá se tocava uma musicazinha mais antiga,
à media luz. A clientela masculina era basicamente de goiabões que dançavam
animadamente com as meninas e pagavam tudo. Marilu, então, começou a fugir de
casa, depois que os patrões pegavam no sono e voltava de manhãzinha, antes que
Anfrízio metesse dos pés e pedisse o café. Tudo ia bem, até que um belo dia o
patrão teve uma crise de asma à noite, procuraram , de urgência, a funcionária
pra fazer um chá de camomila e cadê? Lugar mais limpo ! Descoberta a mutreta,
Marilu teria sido peremptoriamente demitida.
Transcrevemos
aqui um pequeno fragmento da entrevista daquele dia fatídico que marcou o
retorno de Marilu após a expulsão do Paraíso.
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Marilu, Matozinho é muito grande ?
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Marr menino ! Aquilo é um despautério,
dá uma trinta Bréa encangada uma na outra...
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Por que diabo é que te expulsaram da
Casa do Coronel ?
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Eu tava fugindo de noite pra ir me
divertir na Boite Arupemba!
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Buate ? Que diabo é Buate , Marilu ?
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É assim como um Cabaré, mas metido a
besta. A gente dança com um monte de velho estribado. Eles pagam tudo ! Mas é
lugar de respeito, nada de escandelo por lá !
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E depois ? Nada de putaria ?
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Depois a gente ia com os velho prum tal de Moté.
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Moté ? Que bicho é esse, Marilu ?
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É assim um albiente que tem umas cama redonda, uma luz vermelha...
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E o que vocês iam fazer lá com os velho ?
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Chegando lá, eles tiravam a roupa e nós também. E ficava ali naquele esfrega ,
esfrega... Depois eles até davam um dinheirinho pra gente ...
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Esfrega, esfrega ? Nada de vuco-vuco ?
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Não, os velhos eram muito respeitadores. Eles só pediam pra gente fazer capitão
no pênis deles ...
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Pênis, Marilu ? Pênis ? Que bicho dos seiscentos é esse ?
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Acho que pênis é o apelido do cacete de velho. É igualzinho a uma rola, só que é mole, mole...
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