TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

A "FOLHA CORRIDA" DE UM ANO SUSPEITO - João Wady Cury (*)

Meia-noite de 31 de dezembro. O “elemento” 2015 presta depoimento na delegacia.
Compareceu a esta Delegacia de Polícia, na presente noite deste 31 de dezembro de 2015, faltando poucos minutos para a meia-noite, também conhecida por “zero-hora” ou “noite da virada”, diante de mim, delegado de polícia, o elemento chamado “2015”, também conhecido pelo vulgo “Ano de 2015”, depoente nesta Boletim de Ocorrência, em companha de testemunhas e de alguns detratores com o objetivo expresso e alguns omissos de relatar o que sabe e o que não sabe sobre os acontecimentos correntes do ano; QUE o elemento 2015 alega não conhecer seus genitores ou qualquer outro familiar; QUE o referido depoente esclarece ter comparecido a esta delegacia por ter uma vida breve de 365 dias, como a de um camundongo, agora prestes a se encerrar em alguns minutos, para que fossem adotadas medidas protetivas e de urgência à sua integridade física e psíquica por alegado risco de vida ou, como querem alguns, de morte; QUE o elementos acha possível ser aniquilado e varrido da história por maus serviços prestados à Humanidade (com maiúscula, escrivão); QUE eu, delegado de polícia, argumentei que muitas vezes na vida o “quanto pior, melhor” pode nos levar a uma situação sem volta necessária para a reformulação dos valores, guinadas históricas, revoluções, etc; QUE, ao ouvir isso o elemento 2015 despejou impropérios à minha pessoa e chorou desenfreadamente, alegando que vem sendo acusado pelos viventes neste planeta, também conhecido como Terra, que se referem a ele como “ano desgraçado”, “ano de merda” e até “ano que nem deveria ter começado”; QUE o elemento 2015 se dia magoado com todas essas qualificações desabonadoras, lembrando que seu vizinho e colega de infortúnio 2014 foi bem pior para os humanos de um certo país da América Latina, por conta de um placar dilatado em um jogo de semifinal de uma determinada Copa do Mundo, que prefere não citar nominalmente o país para não dar azar – no que imediatamente bateu três vezes com os nós dos dedos no chão de taco de madeira desta delegacia. Difícil mesmo foi o elemento 2015 se reerguer do chão, no que simbolicamente ficou caracterizado seu envolvimento inequívoco com os fatos. E dando continuidade ao depoimento, digo QUE o referido elemento 2015, conhecido também por seu vulgo em numeração romana MMXV, alegou ser um “ano comum” deste século XXI de acordo com o calendário gregoriano; QUE o supracitado garante ter iniciado seu momento mais glorioso no primeiro segundo de uma quinta-feira qualquer, quase estúpida, banal mesmo, destas que não têm nada de mais nem de menos, justificando o fato por não ter outras intercorrências a não ser um foguetório histérico perpetrado por elementos alcoolizados em movimentos erráticos e descontrolados; QUE o elemento 2015 não suporta foguetórios e preferia estar assando em um templo budista escondido em um país da Ásia, nas suas palavras “longe mesmo de tudo aquilo”; QUE não tem qualquer relação com o fato chamado “segundo intercalar”, ou “segundo bissexto”, em que recebeu como bonificação das autoridades do tempo do planeta o acréscimo de 01 segundo aos seus 365 dias, exatamente no dia 30 de junho do presente ano, às 23h59 como forma de compensar uma deficiência de nascimento; QUE não acredita ter sido esse o motivo de “todo o peso que carrega”, como se referiu aos fatos que o acusam; QUE o elemento 2015 também quis ressaltar não possuir qualquer relação com o fato do elemento Marcos Valério Fernandes de Souza, condenado pelo evento chamado “mensalão”, ter virado pintor na cadeia em que está confinado, nem que, como ano vigente, seria responsável pelos quadros que o referido Valério tem pintado; QUE o elemento, quando perguntado se tinha qualquer relação ou influência na “passagem” de elementos como Antônio Abujamra, Inezita Barroso, B.B.King, Içami Tiba, Manoel de Oliveira, Leonard Nimoy, Fernando Brant e tantos outros, disse que preferia ser lembrado daqui a alguns anos pelo nascimento de novos gênios e maravilhosas criaturas; QUE, quando perguntado por esta autoridade policial como sabia que neste ano nasceriam humanos da melhor qualidade, o dito 2015 ou “ano corrente” disse que tudo na vida é incerto, começando pelo nascimento; QUE, apesar de garantir que estar em completo equilíbrio e controle de suas faculdades mentais, começou a demonstrar mudanças de comportamento abruptas, espumando e girando seus números como se participasse de um bingo de igreja; QUE, como não foi constatado inteiramente o fim do decurso de tempo deste 31 de dezembro de 2015, faltando poucos minutos pra seu encerramento, eu, autoridade policial, pedi licença aos presentes para ir à toalete, devido ao inchaço da minha bexiga por conta do excesso de armazenamento de urina na mesma; QUE, ao retornar do referido evento, constatei o desaparecimento do elemento 2015 do recinto, possivelmente tendo se evadido do local em auto desconhecido e destino incerto e não sabido. Nada mais foi dito nem lhe foi perguntado, encerro a oitiva desta Lavratura de Ocorrência Policial e para, finalmente, recebermos o próximo a ser ouvido, já aguardando no recinto, o elemento 2016, conhecido pelo vulgo “a esperança é a última que morre”.



(*) João Wady Cury é jornalista, escritor e autor da biografia não autorizada de Nizan Guanaes.  

Programa Mundo Político entrevista: Paulo Henrique Amorim





Paulo Henrique Amorim, um dos mais influentes jornalistas brasileiros contemporâneos, ao completar 50 anos de carreira profissional nos mais importantes órgãos de imprensa e TV no país reúne em livro meio século de atividade profissional com tudo aquilo que as notícias nunca deram: o lado de dentro do jornalismo e do poder.

terça-feira, 29 de dezembro de 2015

SOBRE FAMÍLIA, AMIGOS E AVIÕES - Jornalismo WANDO (*)

A culpa não é minha. Eu votei no Aécio”.

A frase estampava a camiseta de Ronaldo Fenômeno em um desse carnaprotestos que animaram o terceiro turno instalado no país. A ideia refere-se aos escândalos do governo Dilma e à crença de que tudo seria diferente com a eleição do netinho de Tancredo – o político diferenciado, detentor de honestidade franciscana, o idealista que encarna a ética como poucos, enfim, quase um Mujica mineiro.

A culpa pela corrupção, portanto, é dos que ousaram não votar nesse bibelô de retidão moral. Eleitores do PT seriam corresponsáveis pela corrupção no país, enquanto os iluminados aecistas estariam automaticamente absolvidos. Um conceito maravilhoso de democracia.

No ano eleitoral, a antes inabalável ética do senador passou a ser questionada. Detratores andaram dizendo que ela invariavelmente escorrega quando se trata de amigos, família e tráfego (eu disse tráfego) aéreo. Tremenda injustiça. O aeroporto público de Cláudio (MG), por exemplo, foi construído pelo governador mineiro dentro da fazenda do seu tio, o seu Múcio, que, por sua vez, deixava as chaves com seus sobrinhos. É a meriTIOcracia. É a tradicional família brasileira tomando conta do patrimônio do Estado, demonstrando seu apreço pela coisa pública. Um case de sucesso de Parceria Público-Privada.

Recentemente, novas turbulências surgiram no céu de brigadeiro da ética aecista. E são inúmeros problemas com as vias aéreas. Enquanto governador, Aécio usou aeronaves oficiais 1.430 vezes, muitas para fins particulares. Só no aeroporto do Tio Múcio foram mais de cem pousos e decolagens. Em pelo menos 198 viagens, Aécio nem estava presente. Quietim, com discrição mineira, ofereceu caronas para parentes, empresários e parças de balada. Êta avião bão, sô !!!

Conheça alguns brothers que viajaram nas aeronaves semiprivatizadas: Ricardo Teixeira (CBF), Ray Whelan (FIFA), Roberto Civita (VEJA), Luciano Huch (Globo), Alexandre Accioly (padrinho de casamento de Aécio e parceiro das nights), Boni (ex-Globo). Além dessa gente boa, o povo mineiro também pagou viagens de Sandy e Júnior, Milton Gonçalves, Ze Wilker, FHC, Roberto Irineu Marinho e a ex-mulher de Aécio. Mas eles não têm culpa. Eles só voaram com Aécio.

Num vídeo em que convoca os brasileiros pra uma micareta antipetista, Aécio adaptou uma frase de Castro Alves e bradou emocionado: “A rua é do povo, como o céu é do avião”. Mas a adaptação poderia ter sido mais completa e fidedigna à realidade: “O céu é do avião, o avião é meu, o aeroporto é do meu tio, assim como o dinheiro é do povo”.
Como se vê, a ética do tucano pode ser contada a partir desse recorte que abrilhanta sua biografia de bom moço: família, amigos e aviões. Não falemos de helicópteros.

(*) É um perfil de humor criado na web pelo cientista social e jornalista João Filho (artigo publicado na Revista Carta Capital). 

A PALAVRA DO NOBEL DE ECONOMIA


Na Folha de hoje, em entrevista em que diz que a situação da ECONOMIA GLOBAL patina num ” crescimento baixo, pressões deflacionárias e desempenho decepcionante”, o economista Paul Krugman, Prêmio Nobel de 2008, diz que o Brasil, apesar da “bagunça política”, tem fundamentos econômicos que não estão “nem perto” das condições em que estiveram em outras crises vividas pelo país.


sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

VOLTARÁ ou VOARÁ ??? - José Nilton Mariano Saraiva

Tida no meio “judiciário prisional” como um revolucionário instrumento no combate à criminalidade, porquanto capaz de permitir o monitoramento diuturno daquele marginal liberado da prisão propriamente dita (o cárcere), para cumprir “prisão domiciliar” (em casa), a tal da “tornozeleira eletrônica” já provou que não passa de um colossal embuste (e, por extensão, desmoralizante da prisão domiciliar).

Incrustada no tornozelo daqueles bandidos de maior “prestígio” (grana) e/ou dos que apresentam “bom comportamento” (estratégia enganadora, mas às vezes eficaz), teoricamente a tal “tornozeleira eletrônica” seria capaz de fazer com que o não cumprimento do castigo por parte do bandido (ficar dentro de casa durante todo o dia) de pronto o trouxesse de volta à prisão, porquanto facilmente localizável na transgressão do que fora pactuado.

Como, no entanto, na nossa estrutura prisional a área de “recursos humanos” é por demais pobre e deficitária, faltam agentes para acompanhar o “monitoramento eletrônico” ou mesmo para se fazer presente (por falta de recursos materiais) numa possível detecção de fuga por parte dos “privilegiados usuários” da tal tornozeleira. Como consequência, a imprensa já flagrou (e filmou), bandidos de “prestígio” (grana) que dela fazem uso, “melando o bico” (enchendo a cara) em plena orla da badalada praia de Ipanema, sem serem importunados; também, já tivemos bandidos que foram liberados por “bom comportamento” (usando a respectiva), sendo presos em flagrante na prática de assalto e retornando ao “lar doce lar”. Na Internet, então, já há “didáticas lições” (um autentico e pormenorizado manual) de como se livrar da malfadada (e inútil) tornozeleira.

Tal reflexão é só pra lembrar que, depois de ter feito a tal “delação premiada”, onde incriminou meio mundo e mais a outra banda, o tal Nestor Cerveró (vulgo “farol baixo”, para os íntimos) acaba de ser liberado para passar o Natal e Final de Ano em casa, no aconchego do lar, junto aos familiares. Evidentemente que usando a “tornozeleira eletrônica” (serão cerca de 10 dias de “folga”, antes do possível retorno à prisão).

Mas, aqui pra nós, uma dúvida atroz (e que ninguém nos interprete erroneamente): com vultosos e comprovados depósitos em bancos do exterior (oriundos da propina na Petrobras), com a família e uma legião de amigos dispostos a protegê-lo (por cima de pau e pedra), e já condenado em um dos processos (e com perspectiva de condenação em outros), será que a “tornozeleira eletrônica” se constituirá intransponível obstáculo para, ao invés de “VOLTAR” (à prisão) Nestor Cerveró preferirá “VOAR” (para a liberdade, mesmo que bandida) ??? Afinal, o próprio advogado de Cerveró, atualmente preso pela Operação Lava Jato, já declinou para um dos seus filhos (que gravou a conversa), que “cansou” de ilegalmente transportar bandidos, via terrestre, para o Paraguai, de onde se mandaram rumo à Europa. Ou restará ao “farol baixo” uma nesga de dignidade e honestidade, para pagar pelos malfeitos aqui praticados ???

E então, Nestor Cerveró VOLTARÁ ou VOARÁ, essa a pergunta que todos se fazem.


domingo, 20 de dezembro de 2015

OS VENDEDORES DE GARRAFADAS DO GLOBO.
O Jornal O GLOBO, da família Marinho, faz um editorial sobre o petróleo brasileiro e afirma que toda a pose nacionalista dos brasileiros sobre esta fonte de energia não é nada. Que melhor seria ter vendido tudo antes do preço cair. Ter embolsado alguns bilhões e esquecido o problema para as imbecis do petróleo por terem doado a “dinheiramente” toda ao povo brasileiro e ao final tomarem redondo prejuízo.
Além do mais, alega o editorial:  “Há, ainda, o sinal de alerta da COP-21 de que a era dos combustíveis fósseis pode ter entrado na reta final. O Brasil, país cuja população envelhece sem que tenha ficado rica, pode ter chegado ao pré-sal tarde demais, até por preconceitos ideológicos. Perda histórica dupla.”
O editorial é como aquele vendedor de garrafadas na feira nordestina, que traziam cobras dentro do vidro, peixes do Amazonas e outras bizarrices para a abrir o bolso do comprador. Não vendiam o que mostravam, vendiam panaceias para quem tinha todos os problemas do mundo.
A técnica central destes vendedores é a enganação. O malandro gritando para todo mundo ouvir: “Não se chegou à autossuficiência, apesar de toda a propaganda político-eleitoral em torno do tema...” Parei a frase por aqui porque a técnica editorial é emendar uma frase como se tivesse apresentando toda a verdade, quando o início da frase é o que ficará na cabeça do leitor. Em qual proporção não se chegou à autossuficiência?
O déficit ente exportação e importação de Petróleo foi de 4% em 2014. A produção de petróleo cresce 51% a mais do que o consumo, portanto, agora no final de 2015 já devemos nos encontrar superavitário. Argumento de enganador.
Daí em diante o editorial usa o Petróleo apenas para combate ideológico do nacionalismo brasileiro histórico, desde o estabelecimento do monopólio nacional do petróleo e de outras autonomias.  O editorial comemora os baixos preços do petróleo.
Não porque o preço baixo do petróleo seja bom para todo mundo, mas porque a euforia do “bilhete premiado” com o pré-sal não corresponde à realidade e os brasileiros ficaram pobres antes de serem ricos. E seguindo os vendedores de feira perdemos o caminho para o futuro porque não vendemos logo tudo antes dos EUA virarem campeões em extração de Petróleo de xisto e a China diminuir o consumo. Resultado: os preços do Petróleo despencaram.
E aí a garrafada que querem vender não é petróleo é essa aqui: “Confirma-se que foi erro crasso do lulopetismo, movido a ideologia, suspender por cinco anos os leilões, a fim de instituir o modelo de partilha no pré-sal, com alta intervenção do Estado.  Assim, o Brasil perdeu importante janela para atrair bilhões de dólares.”
Enfim o produto amargo para você se curar da sua eterna pobreza. Venda tudo que puder, entregue tudo que tem, junte dólares, porque esta moeda é dos compradores também e depois empreste para eles que sua paz tumular será eterna. Eis o que dizem: não acreditem em você (ideologia), não acredite nos seus líderes (lulopetismo), descarte seu Estado Nacional (estatismo), venda tudo à petroleiras (que pagam os comerciais).
Bom como não é mesmo sobre petróleo, compreenda que os “corretores” da venda do petróleo brasileiro e da Petrobrás por brinde, estão insatisfeitos com a queda dos preços. Assim como um dono de imóvel brasileiro que se achava dono de um imenso patrimônio e hoje não acha nem a metade para vender.

E sobre a produção de petróleo de xisto e suas contradições ambientais e alto custo eles não falam nada. E sobre a COP-21 eles não falam de outras coisas: a matriz do transporte público que implica num setor que fez a glória das grandes economias, os carros individuais. Enfim enganação de vendedor de garrafada. 


APESAR DE VOCÊ, AMANHÃ HÁ DE SER OUTRO DIA.

Poucos tomaram conhecimento. Quando Castelo Branco tornou-se Presidente, foi simpático ao governo Americano que estava junto ao golpe, mas não levou a unanimidade das Forças Armadas, especialmente do Exército.

A rigor ele sofreu uma deposição branca, na falta de um conceito melhor. Costa e Silva, comandante do Exército juntou todo o descontentamento com Castelo, desde militares cassados até Chateaubriand, passando por vários comandantes de regiões militares.


Castelo apenas cumpriu a tabela do fim de mandato. Não mandava mais nada. O Costa e Silva assumiu, governou junto com o levante mundial da juventude. Foi uma explosão de manifestações nas ruas, ao lado de intensa repressão.

Costa e Silva sofreu um acidente vascular cerebral, morreu e uma junta Militar assumiu o governo. Isso com o AI5 e uma série de decretos para controlar as ruas, especialmente estudantes. A repressão teve um crescimento enorme.

Os grupos secretos das Forças Armadas e até mesmo oficiais de alta patente ficaram soltos para explorar seus ódios e desafetos. Não havia governo. Cada arma prendia e arrebentava como queria. Destacou-se com uma sanha enlouquecida o brigadeiro Bournier, que planejava fazer o que se fez na Argentina em larga escala: jogar de aviões no alto mar o que ele classificava como inimigo.

Fato curioso. Um grande amigo, militar, político, conservador, mas um nacionalista, cassado e sem direitos políticos. Era da Aeronáutica. Bournier mandou buscá-lo. Por sorte ele não estava em casa, os soldados seguiram o filho mais velho e assim ele soube da perseguição. Foi para o Comando Militar do Exército e se entregou. Lá sua vida foi salva, pois o Bournier fazia aquilo por conta própria, na desagregação do Governo durante a Junta Militar.

Garastazu Médici foi nomeado Presidente com a divisão do poder entre o grupo ligado ao Castelo e o grupo do Costa. A rigor ele não mandava em nada, apenas distribuía os assuntos segundo o acordo entre os dois grupos.

Nesta época a repressão, a tortura e morte, a censura e a perseguição a qualquer cidadão, sob suspeita, de qualquer membro do grande esquema de repressão. Se fosse um desafeto a questão pessoal logo evoluía para uma questão de Segurança Nacional.

E assim Chico Buarque fez uma música chamada "Apesar de Você" que passou pela censura como se fosse uma questão entre duas pessoas. Uma mulher como era comum nos sambas. A música foi gravada e divulgada.

Foi na exibição pública que a censura percebeu o real sentido da música e ele chamava-se Emílio Garastazu Médici. A cantora Leila Silva gravou a canção em 1971 e seus discos, também, foram recolhidos.


sexta-feira, 18 de dezembro de 2015


MARINGÁ

E por estes dias. Andei lendo sobre a dinastia política da família Barros de Maringá. Sucessão há três gerações dos poderes públicos que emanam do povo e em nome dele deveria ser exercido.

E lembrei-me de Maria do Ingá, aquela retirante das perdidas vidas dos sertões nordestinos. Aquela retirante que mais dava o que falar e em levas pelos caminhos distantes, na solidão de todas as perdas, o esmagamento do peso do destino dos desamparados, sem solidariedade, desprezados como um bago de laranja chupado na beira da estrada.

Como aqueles ombros caídos, a cabeça baixa, o rosto carregado do amargo adeus entrando em ônibus empoeirados, com o assento impregnado de antigos suores. E pelos solavancos da estrada seguiam dias sem fim, pouco para comer, horas na piçarra da estrada deserta enquanto a mecânica da condução se consertava.

Longas estiradas pelos lugares postados na paisagem imensa e deserta. Assim como a navegação sem fim doutras vagas de gente em busca da sobrevivência, no contra fluxo do Amazonas, tomando afluentes do Juruá e debulhados nas margens desertas e vizinhas das seringueiras.

Maria do Ingá, como todos aqueles que subiram nos ônibus da Varzealegrense em destino das terras roxas do Paraná. Derrubar as florestas. Plantar café. Tornarem-se adereços nos criadouros de dinastias.

Esta sequência de pai para filho, sem consciência alguma dos braços suados, respirando o ar como se a vida fosse uma dádiva divina. Como se tudo já estivesse escrito e tudo que lhes sucede é mero merecimento da ordem maior.

Do retrato severo do patriarca até a caçula da dinastia, há uma arrogância sobre o destino dos demais. Uma arrogância que nunca ensinou ninguém a pescar. Ao contrário sonegou-lhes o peixe da fé e da existência, deu-lhe uma única vara de açoite, plantar e colher café.

E Maringá, esta terra de dinastias, sabe que tudo veio de uma canção de Joubert de Carvalho e Olegário Mariano. Maria do Ingá se encontra em teu nome enquanto postas vitupérios contra os que lá ficaram. Os que continuam no Nordeste.


Continuam sabendo daqueles apartamentos luxuosos da Aldeota que batem panelas contra o prato de comida dos pobres. Que, de tão culpados, possuem um exército de pistoleiros a proteger os filhos dos assaltantes que infestam toda a cidade.  

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

VINÍCIUS: O ANARQUISTA.

Anarquista medular. Não precisa nem raciocinar. Ele é. E muito superior a este pessoal do curvar-se ao poder do Mercado. O Deus Mercado, provedor de sonhos, vitórias e escárnio aos perdedores.

Vinícius nasceu numa ilha, mas desenvolveu-se no continente. Especialmente entre a Cidade e Ipanema. Os bares nunca tiveram tempo de senti-lo ausente. Sem saudades. Numa esquina, na metade do quarteirão e um grande desejo de fundir-se ao Rio enquanto a eternidade durasse.

Jovem. Ousado. Andou nas areias das praias, na aspereza das pedras, embora úmidas do mar, nos tapetes macios e ajoelhou-se em êxtase com os olhos fervendo de desejo ao corpo delas. Amou. Principalmente tinha a maldição do amor eterno.

E fez-se em roda de música. Com o fluir das palavras em sonoridade, das revelações profundas do ser, da explosão emotiva das contemplações, da denúncia ferina das traições e dos éditos ditatoriais. Tornou-se o símbolo de uma época. Uma trilha para se transitar.

Mas Vinícius sumiu de cena. Ninguém mais o viu. No centro, em Ipanema, nalgum restaurante de Copacabana, em qualquer bar do Leblon. Nas tocas edificadas da civilização a ausência permanente. Tornou-se lenda dos desaparecidos. Quem sabe na “Curva do Calombo” na Lagoa.

E por acaso tive acesso ao sumidouro do Vinícius. Depois da Fonte da Saudade, na subida da Sacopã. Apartamento de fundos. Virado para a mata. Úmido e penumbroso. Pela janela a sabiá canta na mata e os macacos pulam de galho em galho e chegam às janelas por um pedaço de vida qualquer.

- Caramba! Que sumiço!

- Não existe eclipse algum. É a vida. Vivo a felicidade de ter envelhecido. A liberdade do meu corpo seguir os estímulos constantes do mundo. Sem regras. Controles. Clareamentos. Defesas.

Atento ao discurso de Vinícius.

- A velhice é uma adolescência radical. Infinitamente mais radical. Todos os órgãos começam a funcionar na própria regra. Ninguém obedece mais à ditadura da totalidade. Partes abandonam o corpo por vontade própria, dentes, cabelos, a tesão, o fluxo da urina, o ritmo digestivo. As regulações perdem os roteiros, ritmos, regularidades, compensações e toda esta lei de mercado e vivem uma anárquica e bela arritmia, elevam-se os níveis tensionais, afrontam-se os órgãos reguladores. E a beleza de todas as belezas, as células deixam a escravidão fisiológica e se multiplicam em outras formas, em funções fora da regra, invadem o lugar daquelas ainda escravizadas. Há uma linda e incomensurável afrontamento deste corpo burguês. O refúgio dos covardes.  


Os olhos acesos à beleza da anarquia em estado puro. 

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

UMA CANTINA NO TOPO DA LEMBRANÇA.

E no centro da cidade. Rua Santos Dumont em Crato, um município que não pertence a nenhum Estado, é o umbigo de toda uma macrorregião. Qualquer ponto no litoral nordestino fica distante em torno de 700 quilômetros. O seu corpo físico é um abraço ao Piaui, Pernambuco e Paraíba. O Maranhão é num amanhecer, o Rio Grande do Norte num Entardecer e Alagoas na metade da noite.

A Bahia é num território mítico da cultura e Sergipe a ancestralidade. Como diploma de sucesso na civilização pós-valor da terra, os lustre as luzes se encontrava em Recife. No Recife como dizem. A Bahia uma lembrança de ser médico. O Rio o destino da política e da arte. Fortaleza o lugar para o qual os políticos eleitos se diplomavam.

Melhor não podia descrever o Crato. Agora falta a Cantina. E não espere algo italiano no sentido da refeição pronta. Mas no sentido do mercadinho, da mercearia, da bodega e, portanto, já se destacava pelo nome. Mas fique no terreno da Mercearia como adereço, a que falo é sobre refeição, inclusive.

E qual refeição? No campo o prazer de acordar com leite recém chegado do curral, café moído e feito na hora, um pedaço de queijo coalho assado na brasa e cuscuz. Com leite, encharcado de leite. Colheradas num e gole no outro.

Então vou ao Crato, aluno das pernas arranhadas por garrancho na beira da caminhada e ao encontro do mundo de gente que descobre novos mundo. Entre eles, dois irmãos, Wilson e Veím, a falar sobre os desassombros da vida urbana. Das horas que se esticam no entremeado de vidas e domicílios. Nos cinemas, nas praças, nas calçadas, no rádio e até numa radiadora.

Então na hora do recreio. Uma novidade. Na Cantina Oliveira tem uma "merenda" especial. E não era perto do colégio. Mas íamos. Um grupo até o burburinho da grande freguesia. O enche e seca pratos. O ocupa e desocupa banco em enormes mesas.

E ali algo tão normal nos tempos de comida a quilo, de buffets, destas misturebas de tudo com tudo. Um tempo em que as associações alimentares eram verdadeiramente canônicas. Um tempo em que o que estivesse em certas panelas não se somada ao conteúdo de outras.

E na Cantina Oliveira uma mistura com a força da cultura local, mas nunca antes experimentada, pelo menos para o jovem comensal. Ambas fumegantes dos recipientes que a cozinharam diretamente ao nosso prato: uma base de cuscuz daquele milho da cor intensamente alaranjada e com uma carne moída cuja receita ficou lá no topo da lembrança.

Na Cantina Oliveira.

sábado, 12 de dezembro de 2015

É POUCO, MUITO POUCO - José Nilton Mariano Saraiva


Até que enfim o Procurador Geral da República Rodrigo Janot se manifestou.




Falta, porém, o mais importante: colocar Eduardo Cunha atrás das grades.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

"PALHAÇOS-ENGRAVATADOS" - José Nilton Mariano Saraiva

Porque comprovadamente foram cooptados por uma “merreca”, subtraída do vultoso e ilegal valor que o meliante Eduardo Cunha recebeu de “propina” dos bandidos que assaltaram a Petrobras, os “palhaços-engravatados” que o apoiam (dizem ser quase duas centenas), não têm o mínimo de pudor e escrúpulo em protagonizar a chanchada deprimente que atualmente levam a cabo no plenário da casa, bem como no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, da Câmara dos Deputados.

Assim, obedecendo cega e bovinamente ordens do “chefe” (Eduardo Cunha), transformaram os respectivos ambientes em um picadeiro de circo mambembe de periferia, onde reina a palhaçada de quinta categoria e, por consequência, o desrespeito aos mínimos princípios da moralidade, da ética e da seriedade, que ali deveriam se fazer presentes. Daí, a procrastinação ad eternum do andamento do processo de cassação do mandato de Eduardo Cunha, por falta de decoro parlamentar (roubou, mentiu e sonegou), já por seis vezes levado a plenário.

O escárnio é tamanho, que o país literalmente encontra-se parado simplesmente porque o bandido Eduardo Cunha resolveu “peitar” a corte maior do país (Supremo Tribunal Federal) por ter esta cometido a suprema “ousadia” de barrar o rito processual que ele houvera imposto de forma aleatória, imperial e absoluta, na tentativa de (junto com sua quadrilha) viabilizar o impeachment da Presidente Dilma Rousseff; assim, o legislativo federal somente reunir-se-á para decidir sobre qualquer coisa (e a pauta é extensa) após o STF determinar como deverá se processar a querela, daqui a uma semana. Até lá, os “palhaços-engravatados” estarão livres para transgredir e conspirar.

O mais estranho nisso tudo, contudo, é que, apesar das muitas e contundentes provas em seu poder (documentais, telefônicas e verbais) de repente a “agilidade” do Procurador Geral da República Rodrigo Janot, esvaiu-se; a “coragem” do juiz Sérgio Moro, escafedeu-se: a “determinação” do ministro Teori Zavaschi desapareceu, porquanto assistem passivamente ao festival de arbitrariedades perpetradas por um reconhecido e audacioso bandido de alta periculosidade (teria havido até ameaça de morte).

Estariam tais sumidades receosas de que contra elas Eduardo Cunha acionasse alguma resquício-comprometedor da sua “pauta-bomba” ??? Teriam rabo-preso ??? Ou simplesmente torcem para que ele toque fogo no país de vez, acabando com a normalidade democrática tão duramente conquistada faz tão pouco tempo ???

Por qual razão o Poder Judiciário não se manifesta, determinando a César o que é de César ???

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

O "EXTERMINADOR"

Relator que contrariou Cunha diz que foi ameaçado e teve medo de morrer

ameaca
Do Valor, agora há pouco, sobre o país do faroeste legislativo:
“Eu cheguei a pensar que eu poderia morrer, sim”.
Assim o deputado Fausto Pinato (PRB­SP), em seu primeiro mandato, resume as pressões que passou a sofrer desde que foi escolhido como relator do processo de cassação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB­RJ), no Conselho de Ética da Casa.
Nesta quarta­feira, quando o parecer de Pinato pela abertura do processo iria ser votado no conselho, Cunha fez uma manobra junto à mesa diretora para destituir o deputado do cargo. Pinato afirmou que sofreu ameaças de morte e registrou um boletim de ocorrência confidencial junto à Secretaria de Segurança de São Paulo.
Diz que também fez uma representação ao Ministério da Justiça. Segundo ele, sua família estava usando um carro blindado e um policial militar passou a dormir em sua casa para fazer sua proteção.
“Fui abordado em aeroporto, o meu motorista foi abordado, recebi alguns recados em aeroporto de pessoas desconhecidas. Sofri todo tipo de pressão que você pode imaginar”, disse em entrevista à imprensa. E detalhou: “Falaram para pensar na minha família, que eu tinha filho pequeno, filha pequena, irmão pequeno”. Segundo ele, foi por causa das ameaças que o deputado resolveu apresentar antes do prazo seu parecer a favor da admissibilidade do processo contra Cunha. “Eu protocolei, sim, antes, porque eu fiquei com medo de morrer”, afirmou.
Ele declarou, contudo, que não tem como dizer de onde partiram as ameaças. Pinato disse ainda que os aliados de Cunha na Câmara, sem citar nomes, também lhe pressionaram, sugerindo “aconselhamentos” em favor do arquivamento. “Recebo recados dia e noite de que estaria brigando com um exército de 200 e tantos deputados”, contou.
A conclusão de Pinatto: “o único relator que consegue sobreviver hoje no Conselho de Ética é um relator que arquive o processo”
Viva a “normalidade institucional”, não é , Dr. Temer? Não é, Dr. Janot?

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

A GRANDE VAIA - Demóstenes Gonçalves Lima Ribeiro (*)


Algum tempo depois do golpe militar, Castelo Branco visitou aquela cidade. Na época não havia hotel adequado e ele se hospedou na casa do promotor, a melhor do lugar. O ambiente era festivo, aos vencedores dava-se tudo e tudo se solucionava.

Assim, não mais faltaria água e, entre as homenagens ao marechal, um moderno serviço de abastecimento seria inaugurado. O prefeito não sabia mais o que fazer para agradar à nova ordem. Uma solenidade cívica e grande concentração popular marcariam o apreço do povo pelos salvadores da pátria. Os estudantes perfilados agitavam bandeirinhas, os sinos badalavam, o tiro-de-guerra desfilava, a banda de música tocava e no palanque se comprimiam as autoridades civis, militares e eclesiásticas.

Sim, vivíamos outro Brasil e com os novos tempos, repetiam os oradores, nunca mais faltaria água. E no discurso final, quando o prefeito dissesse que “graças à revolução, esse líquido precioso e cristalino não mais faltará nas pias, nos banheiros e em todos os lares,” Artuliano abriria uma grande torneira no palanque e a água jorraria aos borbotões, coroando a festa. Ele, sarará cabeçudo e grandalhão, segurança e faz-tudo do prefeito, estava ensaiado e confiante.

Mas, quando os alto-falantes ecoaram “esse líquido precioso...”, os fogos espocaram e a banda tocou mais forte, a água não apareceu. O prefeito disse, sussurrando, Artuliano, abre a torneira, e, nada! Mais uma vez, a voz trêmula, e não veio a água. Então, pálido e suando em bicas, sob o olhar feroz do ditador, ele gritou desesperado, Artuliano, filho da puta, abre a torneira, satanás! Aí explodiu a vaia imensa e desmoronou a farsa.

Ninguém contava com aquilo e da torneira, completamente aberta, não saiu uma só gota. A vaia foi num crescendo e mil pedras foram atiradas. Algumas feriram o bispo e por pouco não atingiram o marechal. As freiras choravam e os seminaristas não sabiam o que fazer. O juiz sumiu. Ouviu-se abaixo a ditadura, começou a pancadaria e o corre-corre, a polícia e os agentes secretos dispersaram a multidão.

Bateram em pessoas humildes e prenderam os comunistas de sempre, mas não identificaram os culpados. No dia seguinte acharam pedras e cimento fechando a tubulação. Ao encerrar o inquérito, concluíram que, apesar do vexame, tudo não passou de um mal-entendido da política local, fruto de antiga rixa entre coronéis do interior fiéis aos militares.

Na verdade, um grupo de estudantes fez a ação na tarde anterior e à noite tomou o ônibus. Só depois de chegar ao Recife, eles souberam do desfecho e comemoraram a operação, às gargalhadas.

Lindas férias de julho – cerveja, festa, namoro e a ditadura humilhada por uma grande vaia. Eram todos adolescentes sonhadores e ingenuamente não imaginavam a longa noite de terror que aos poucos se anunciava.



(*) Médico-Cardiologista, natural de Missão Velha e atualmente morando e exercendo o ofício em Fortaleza.