Os setores corporativos da medicina reagiram negativamente
ao programa Mais Médico. Pela primeira vez o Governo havia dado um passo além
do limite do discurso que unia a todos: mais recursos financeiros para a saúde.
Nesse assunto de mais recursos as corporações médicas se alinhavavam na medida progressista.
Porém quando o assunto chegou à sala dos profissionais de
saúde as suas corporações (Conselhos, Sindicatos e Ícones Técnicos como Dráuzio
Varela) foram para o canto direito da luta. Quando os médico cearense vaiaram e
xingaram os recém chegados, especialmente os cubanos, a situação se tornou
puramente ideológica.
Se tornou na luta entre o SUS, de acesso universal e
gratuito e o setor corporativo privado baseado na exploração intensiva de
tecnologia cara. Naquela altura os sindicatos médicos que tiveram importante
papel no período da redemocratização do país, na constituinte apoiando o SUS e
depois lutando por mais recursos, pularam a barreira para o lado mercantil.
Muitos sem ter consciência disso, mas foi isso que
aconteceu. Nesse momento, também, se rompe uma aparente aliança, muito por
causa do silêncio, entre médicos que atuam nos Chamados Cuidados Básicos de
Saúde e aqueles que operam na tecnologia de ponta. Na verdade há uma dicotomia
de origem na formação de médicos de Atenção Básica e nos Tecnológicos.
A rigor os primeiros são mais médicos na acepção clássica da
palavra. Eles operam com um senso coletivo de resultados de suas ações.
Enquanto o outro se tornou uma espécie de técnico de nível superior
especializado em operar equipamentos que dão lucros em Bolsa de Valores.
E por incrível que pareça os “Médicos Tecnológicos” sempre
se acharam “superiores” ao colegas de Atenção Básica. Eles terminavam pelo
caminho do acesso do fetiche da tecnologia adotando preconceitos de classe.
Aliás essa é uma das características da pós-modernidade: a ideologia de classe
decorrente do acesso à tecnologia de ponta.
Mas o que temos? Pela primeira vez uma política de Estado
deu conta do problema integralmente. A primeira questão. A população de
profissionais de saúde saltou de 5,39% em 2000 para 7,01% de participação na
população economicamente ativa. Isso significa gerou muito mais vagas do que as
faculdades formavam.
Nos últimos dez anos se abriram 146 mil vagas de médicos no
país, mas as faculdades apenas formaram 93 mil. E o Brasil continua um dos
países mais baixos em termos de médicos por mil habitantes. No país temos 1,8
médico por mil habitantes, enquanto na Argentina é 3,2, Uruguai 3,7, Alemanha
3,7 e Espanha 4.
E mais importante, eles estão concentrados em São Paulo
(2,49), Rio de Janeiro (3,44), Espírito Santos (1,97) e Rio Grande do Sul (2,33).
Os demais 22 Estados têm menos de 1,8. No Pará fica em 0,77, no Maranhão em
0,58 e no estados nordestinos o maior é Pernambuco com 1,39 médicos por mil
habitantes.
Mesmo os estados mais ricos e que concentram maior número de
médicos estão inferiores à correlação de médicos por exemplo da Argentina, do
Uruguai, Alemanha e Espanha. Além do mais durante as décadas de 80 e 90 houve
uma redução das vagas de médicos nas universidades, ou seja o Brasil formou
menos gente e isso não só agravou a falta desses profissionais como aumentou a
média de idade do médicos brasileiros. Hoje os médicos com idade entre 50 e 60
anos é maior do que entre 40 e 50.
Por isso o Programa prevê aumentar o número de vagas de
graduação e de pós-graduação em residência médica. Ao contrário do que as
corporações sempre viram com olhar de preocupação, a abertura de novas
faculdades e de vagas nos cursos já existentes, passa a ser uma realidade. Por
exemplo pelo que fui informado o Cariri terá um segundo curso de Medicina
Federal que funcionará em Crato. Além do mais pretende-se chegar a uma vaga de
residência para cada graduando em medicina.
O programa está em curso, já contratou 6.658 médicos para as
periferias, atendendo a 2.177 municípios e pretende chegar 13 mil médicos até
março e abril do ano que vem. Isso tem um enorme impacto na Atenção Básica de
Saúde. Aí é onde cuidados essenciais como prevenção de cânceres, pré-natal,
tratamento da tuberculose e hanseníase, vacinação, controle de hipertensos e
diabéticos, pneumonias, asmas, bronquites entre outros vão modificar a
longevidade e reduzir danos à saúde.
A verdade é que, no final, todos tomarão consciência que é
preciso uma Política de Estado, independente da luta corporativa e do embate
eleitoral do ano que vem. É preciso compreender que a medicina tecnológica, de
alta complexidade e custo é uma decorrência da Atenção Básica de Saúde. E não
ao contrário como alguns, olhando para seu umbigo de ouro, pensa.