Ontem ao constatar uma manobra da mídia e ao escrever e
publicar, sempre se carrega a possibilidade de atingir a convicção de outras
pessoas e, por consequência, causar irritação. Nesse momento é preciso um pouco
de calma e se compreenda que não há nenhum ataque à dignidade de quem pensa e
tem informações diferentes.
Basta que se use destes conhecimentos para, inclusive,
contribuir com a realidade visível e invisível das coisas. Este texto tem por
referência a entrevista do economista Yanis Varoufakis, que é grego e foi
convidado pelo governo do Syriza a conduzir as negociações da dívida do país
com as instituições econômicas europeias. E uso como força de argumento para
uma um dogma fundamental do liberalismo que é: o indivíduo é que é o móvel do
seu destino e a sua posição na sociedade depende apenas dele e do seu esforço.
Agora puxe esta ponta e a ligue ao que Thomas Pikkety vem
dizendo sobre os efeitos funestos da enorme concentração de renda e do efeito
não meritrocrático da herança de uma geração à outra. E com razão ele diz: ora
se o mundo afunila a maior parte da riqueza nas mãos de pouco, torna-se
compreensível a formação de uma oligarquia que passa a liderar o destino de
todos. E desse modo se tenha por métrica o perigo desta concentração com
líderes forjados apenas no exercício do lucro acumulativo e que a todo custo
tenta passar estes ganhos para o futuro através de sua descendência.
Em outras palavras é um abismo histórico, onde as lideranças
não têm noção alguma do conjunto da humanidade e pensa apenas no cassino do
dinheiro e num estilo de vida extremamente oneroso para a sociedade. Como
sabemos eles vivem entre nós e o metabolismo deles influi sobre o nosso.
O grande problema para a saída da Grécia da enorme
destruição econômica e social é que parte dos europeus, especialmente Alemães e
Escandinavos acha que os gregos dançaram e cantaram como as cigarras e quando
chegou o inverno quiseram se abrigar nos recursos que formigas passaram o ano
todo preparando, num trabalho árduo. A famosa fábula de Esopo.
Agora pegue e junte as duas pontas: uma elite que só pensa
no dinheiro, que se torna incompetente para solucionar os grandes e principais
problemas das gentes e do planeta. Some o diagnóstico de Pikkety com o de
Varoufakis (“estou habituado e um tipo de
diálogo no qual que realmente aprendo com você e você comigo: teremos
desacordos, mas através deles nossos respectivos pontos de vista se
enriquecerão”).
Iremos encontrar uma manobra extremamente perigosa das
elites europeias para preservar suas posições econômicas, sociais e políticas.
Olhem o que diz o economista grego usando a fábula de Esopo como referência (os
alemães dizem que os gregos são preguiçosos e merecem o que estão passando):
“ (...) desgraçadamente,
na Europa predomina a estranhíssima ideia de que todas as cigarras vivem no Sul
e todas as formigas, no Norte. Quando, na realidade, o que existem são formigas
e cigarras em todo lugar. O que aconteceu antes da crise – é minha revisão da
fábula de Esopo – é que as cigarras do Norte e as cigarras do Sul, banqueiros
do Norte e banqueiros do Sul, digamos que por acaso se aliaram para criar uma
bolha, uma bolha financeira que os enriqueceu enormemente, permitindo-lhes
cantar e vaganbundear ao sol, enquanto que as formigas do Norte e do Sul
trabalham em condições cada vez mais difíceis, inclusive nos bons tempos:
conseguir que as contas batessem em 2003, em 2004, não tornou as coisas nada
fáceis paras formigas do Norte e do Sul; e logo quando a bolha que as cigarras
do Norte e as cigarras do Sul haviam criado estourou, as cigarras do Norte e do
Sul se puseram de acordo e decidiram que a culpa era das formigas do Norte e
das Formigas do Sul. A melhor forma de fazer isso era confrontar as formigas do
Norte com as formigas do Sul, contando-lhes que no sul só viviam cigarras.
Assim, a União Europeia começou a se fragmentar, e o alemão médio odeia o grego
médio, o grego médio odeia o alemão médio. Não tardará para que o alemão médio
odeie o alemão médio, o grego médio odeie o grego médio. Isso já começou não?”
Enfim: o mérito está na sociedade solidária, democrática,
onde ninguém passa fome, frio e morre cedo por causas evitáveis.